Elevação dos juros é uma exigência da malta endinheirada Por Ranulfo Vidigal
Numa das primeiras cenas do filme Livre Pensar, do cineasta José Mariani, que homenageia a economista Maria da Conceição Tavares, ela categoricamente afirma: “Os economistas ditos progressistas, quando sentam na cadeira do Ministério da Fazenda, ou do Banco Central, passam a praticar um grau de submissão aos mercados globais instáveis e à política do dólar e do juro americano de forma inacreditável, aceitando a tirania das agências de risco com certa ingenuidade”; exatamente como notamos hoje.
Juros elevados agradam os especuladores internacionais e os rentistas locais, afinal o carry-trade permite uma arbitragem lastreada no diferencial de juros, em relação aos EUA, de 6 pontos percentuais, diferencial que por sinal vai crescer até dezembro.
Nesse contexto, a Dívida Pública Federal torna-se um dos principais instrumentos de aumento da acumulação privada, uma forma de compensar a queda da taxa de lucro, em escala planetária. O Estado, através do fundo público, cumpre a missão de acelerar o tempo de rotação do capital e garantir a acumulação de forma ininterrupta. Além disso, tem 6% do PIB na forma de renúncias fiscais para o agronegócio e outros setores.
Portanto, a propalada austeridade fiscal às avessas impõe um incremento artificial dos juros, encarecendo a despesa pública e o crédito privado. Para exemplificar: 0,25 ponto percentual de aumento da Selic custa, o equivalente a um ano de todas as políticas públicas federais do Ministério das Mulheres.
Ou seja, temos, ao mesmo tempo também, cortes de gastos em saúde, educação e moradia. Isso desacelera o crescimento da economia, corta empregos e contém a tênue recuperação dos salários no setor privado. É uma exigência da malta endinheirada para atenuar o conflito distributivo latente.
Nosso país, a cada dia é mais agrobusiness, mineração e finanças e menos industrial. Tem vaga de trabalho, mas o salário é baixo, e a informalidade ainda é alta. Agora, inclusive, o trabalhador “uberizado” ainda está preso na armadilha do endividamento familiar.
Nosso mundo urbano está embasado em uma indústria da segunda revolução industrial, um inchaço dos serviços e um trabalho cada vez mais precarizado. Já o campo, acabou se entrelaçando com o capital financeiro e com as tecnologias de ponta para formar um grande centro de gravidade na economia brasileira; esta experiência é intitulada, internacionalmente, como “a fazenda do mundo”, via riqueza do agronegócio.
Mas, com tudo isso, além crise ambiental revelada pelas das queimadas, temos escassez de recursos disponíveis para satisfazer as necessidades concretas de subsistência do cidadão comum, cada dia mais suscetível a se sujeitar a relações opressivas, perda de direitos e maior dependência da chamada ‘viração” para sobreviver na terra da jabuticaba.
Há uma frase genial de Millôr Fernandes que se encaixa como uma luva ao tempo presente: “Um idiota nunca aproveita a oportunidade. Na verdade, muitas vezes, o idiota é a oportunidade que os outros aproveitam”.
Nesse diapasão, tem ministro da área econômica sendo vaiado na USP, e pesquisa Ipec constata que 58% dos brasileiros não sugerem ao atual mandatário buscar uma reeleição em 2026, apesar da inegável recuperação econômica e da estabilidade da inflação vigente no tempo presente. E aí?