Em todo o globo, ao longo dos últimos séculos, datas e monumentos foram criados pelos Estados, colaborando para a construção da memória de uma nação. Esse percurso, por sua vez, nem sempre abarcou nem deu voz a todos que pertencem a um país. Assim, nas últimas décadas, como resultado de lutas reivindicatórias e organizações sociais, por meio de novos decretos e leis, bem como com trabalho de pesquisadores, a história vem sendo debatida de forma que indivíduos, grupos e segmentos sociais, até então submetidos e subjugados, têm tido seu lugar reconhecido.
A Lei nº 12.987/2014 é símbolo desse movimento de transformação ao estabelecer 25 de julho como sendo o “Dia Nacional Tereza de Benguela e da Mulher Negra”, em sintonia com o “Dia Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha e da Diáspora”, sendo este último celebrado na mesma data e reconhecido pela ONU, em 1992.
Essa celebração tem origem no encontro realizado na República Dominicana na data acima assinalada que teve como objetivo denunciar as opressões e debater soluções na luta contra o racismo e o sexismo. Ou seja, a data comemorativa, neste caso, busca apresentar à sociedade mundial as condições de existência nas quais historicamente as mulheres negras da América Latina e Caribe foram submetidas, da mesma forma que coloca em evidência suas pautas e a urgente necessidade de transformações sociais.
Quando o Estado brasileiro institui a data em território nacional e adiciona o nome de Tereza de Benguela, líder quilombola no século XVIII, demonstra que a história brasileira foi construída por meio de lutas, nem todas até agora reveladas, e assume a responsabilidade de lidar com os conflitos e suas consequências.
É certo que a criação de uma lei não altera por si as relações sociais. No entanto, a sua existência, como resultado de reivindicações políticas e sociais, potencializa a formação de consciência, proporcionando o diálogo e viabilizando um conjunto de ações como ponto de partida para transformações e a construção de uma nova memória.
Valéria Pilão é doutora em Ciências Sociais, professora do curso de Sociologia do Uninter.