Dois momentos me marcaram nas últimas semanas: a comemoração do dia da Amazônia, num momento que a Amazônia queima e está seca como nunca; em Ascención de Guarayos na Bolívia, em meio a fumaça, uma comunidade rezava para um santo protetor acabar com o fogo.
Em 5 de setembro comemorou-se o dia da Amazônia, historicamente foi um dia badalado, pois frequentemente o planeta mira a Amazônia com um olhar afetuoso, pela contribuição deste território na mediação climática, seja pelos rios voadores, seja pela absorção de CO2.
Ano passado, a seca foi severa na Amazônia e na sequência, a chuva foi escassa para recuperar a umidade no interior da floresta, por isso não encharcou o solo para tributar os rios, ou seja, este ano os rios estão mais secos e as florestas com menos umidade. Algumas consequências deste evento são graves e visíveis: a floresta está mais propícia a pegar fogo e os rios secaram quase dois meses antes que é normal.
Agregado a isso, o número de focos de incêndio em 2024 teve crescimento bem superiores aos praticados em anos anteriores. O quadro a seguir mostra o percentual de crescimento de focos de incêndio na Amazônia em relação a 2023, em janeiro cresceu 233%, março 256%, agosto 253%, ou seja, os dados mostram que em 2024 duplicou as quantidades na maior parte dos meses; em setembro os valores serão bem altos, só para os primeiros 15 dias setembro o percentual já foi de 139%.
Base 2023 | Janeiro | Fevereiro | Março | Abril | Maio | Junho |
2024 | 233 | 185 | 256 | 114 | 137 | 118 |
Base 2023 | Julho | Agosto | Setembro | Outubro | Novembro | Dezembro |
2024 | 185 | 253 | 139 | 0 | 0 | 0 |
Fonte: https://terrabrasilis.dpi.inpe.br/queimadas/situacao-atual/estatisticas/estatisticas_estados/
Os danos para a Amazônia são várias, entre elas, a qualidade do ar na Amazônia nunca foi tão ruim e insalubre (ver dados da qualidade do ar da cidade Porto Velho, que chegou a acumular 15 vezes mais concentrado de Material Particulado do que indica a Organização Mundial da Saúde (OMS) – disponível em https://www.instagram.com/p/C-LBSepsPyJ/?igsh=enI2bjJzZ3JzdHRr).
Os focos de incêndios se expandem rapidamente, porque a floresta está mais seca e o crescimento e a proliferação do fogo são mais rápidas. Os rios estão secos impactam diretamente a sobrevivência dos ribeirinhos. Também, deve-se lembrar que a Amazônia envia umidade para o restante do Brasil e hoje está enviando fumaça, que impacta a economia e a qualidade de vida do restante do Brasil.
Hoje o que está acontecendo na Amazônia é a segunda tragédia Ambiental de grandes proporções de 2024, a primeira foi no Rio Grande do Sul e a segunda é na Amazônia. No Rio Grande teve excesso de água e a gestão pública foi insuficiente para conter as enchentes. Já na Amazônia há excesso de fumaça, escassez de água e a qualidade do ar está péssima para a saúde humana e o poder público não consegue fazer ações para conter a tragédia.
O que chama a atenção é que nada está sendo feito pelo poder público. Quando muito, depois de dois meses (as queimadas iniciaram em junho), estados emitiram decreto para conter o fogo, mas o estrago já tinha iniciado e não foi nem está sendo contido.
Mas, o que salta aos olhos é que os governos e a sociedade se mobilizaram para ajudar e reconstruir o Rio Grande do Sul, mas para a Amazônia não há nada no horizonte. Na Amazônia o povo ribeirinho precisa de máscaras, comida, água, transporte, ou seja, o povo precisa de apoio.
Por fim, será que os ribeirinhos Amazônicos precisam ser como aqueles de Ascención de Guarayos, e terão que se apoiar na reza para que alguma coisa seja feita?
(*) Artur de Souza Moret, físico, doutor em Planejamento de Sistemas Energéticos é pesquisador amazônico em Energia Renovável. Marxista, Ambientalista, Pacifista e anti Capitalista.