Livro homenageia benzedeiras por meio da mescla entre fotografia e bordado
No último mês, foi lançado o livro “Benzedeiras do Jequitinhonha”. A obra é uma produção de Aline Ruas e Lori Figueiró, fundadores do projeto Guardiãs das Palavras Benditas, que valoriza e homenageia as benzedeiras do Vale do Jequitinhonha, região de Minas Gerais.
O nome do projeto faz menção àquelas que cuidam das palavras de benzimento e que levam essa função como ofício de vida, por meio de gestos de afeto e cuidado com as comunidades. O projeto é amplo e conta ainda com outros trabalhos artísticos além do livro. Bordados, fotografias, vídeos e até bonecas fazem parte da iniciativa.
O livro
O livro é uma mescla de fotografia e bordado, junção que Aline e Lori chamam carinhosamente de “luzes e laços em oração”. Essa união foi o que deu início ao projeto em 2021, quando Aline pediu as fotografias de Lori para bordar e, assim, expandiram o projeto para toda a região.
No primeiro volume, o livro traz um panorama geral dessa tradição centenária, com histórias de vida das benzedeiras, cantigas e orações.
“É a forma que a gente encontrou para homenagear as benzedeiras, trazendo o anúncio da história de vida das mesmas e uma apresentação desse universo”, comenta Aline, em entrevista ao Brasil de Fato MG.
Ela afirma ainda que “pelos depoimentos das benzedeiras, os leitores poderão ver a riqueza do conhecimento tradicional dessas mulheres, de superação em vida, dos saberes da espiritualidade e também da alegria”.
Além de homenagear as benzedeiras do Vale do Jequitinhonha, Aline declara que o livro é uma forma de honrar a história da região, que passa por dificuldades – principalmente em municípios onde mineradoras exploram o lítio e interferem na vida dos moradores da cidade.
Desafios
Um dos principais desafios que o projeto enfrenta, segundo os artistas, é a falta de investimentos e de parcerias com organizações que tenham os mesmos valores que a iniciativa, uma vez que a atual conjuntura do estado apoia a mineração de lítio, que afeta grande parte do território do Vale.
“Nós precisamos ser coerentes com as parcerias a serem construídas, que precisam respeitar o território e o povo que faz esse território ser o que ele é”, relata.
Além disso, Aline conta há a intolerância religiosa e o preconceito de pessoas que não respeitam essa tradição. Esse fator, segundo a autora, fez com que muitas pessoas migrassem para outras religiões e deixassem o benzimento de lado.
Além disso, os criadores falam sobre o ritmo da vida moderna, que vai contra o tempo exigido pelos métodos das benzedeiras, que acolhem, conversam e gastam tempo de qualidade com as pessoas.
“Com a modernidade e o avanço do capital, muitas dessas tradições e saberes podem se perder. A gente vê que não tem o mesmo número de benzedeiras que tinha antes, por exemplo, na época da minha avó. Mas elas estão resistindo e mostrando a importância da tradição”, argumenta.
Fotografia
Há quase 20 anos, Lori Figueiró faz registros das manifestações culturais e religiosas do Vale do Jequitinhonha. Lori diz que só consegue fazer esses registros por conta das relações afetivas que ele mantém com a população da região. Segundo ele, “é necessário olhar para o outro segundo as suas particularidades e singularidades”.
Por essa razão, Figueiró começou a fotografar tudo o que abrange as anciãs e a cultura popular. Dando continuidade, junto com Aline, ao projeto e ao livro.
“São elas que acolhem e proporcionam confortos, são elas as detentoras de saberes e fazeres ancestrais. Poder conviver e registrar os mestres da cultura popular é, para mim, motivo de inspiração, alegria e gratidão”, diz o fotógrafo.
“As fotografias bordadas que compõem este livro têm cheiro de ervas frescas colhidas ali no quintal, têm o calor do fogo das velas acesas nos altares e das brasas do fogão à lenha, têm o som das águas do rio que corre e do murmúrio das orações”, sintetiza Sueli do Carmo Oliveira, curadora do projeto.