Contrato assinado em março de 2022 inclui serviços em 332 unidades, inclusive uma linha que tem parceria com a prefeitura de São Paulo; prefeito deixou a sociedade apenas em janeiro de 2022, após Companhia Paulista de Trens Metropolitanos iniciar concorrência
A Nikkey Controle de Pragas, principal empresa da família do prefeito Ricardo Nunes, possui um contrato de R$ 2,8 milhões com a Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM), vinculada ao governo do estado de São Paulo e que atua em parcerias com a SPTrans, órgão da prefeitura. Os serviços incluem o combate e controle de pragas nos complexos operacionais e de manutenção da CPTM, com utilização de equipamentos próprios e fornecimento dos produtos, materiais e insumos.
Quem assina é Ricardo Nunes Filho, filho do prefeito e atual sócio da Nikkey, ao lado da esposa Amanda Zillig. A contratação, válida por 30 meses, ocorreu em 8 de março de 2022, apenas dois meses após o pai de Ricardinho deixar a sociedade. À época do lançamento do pregão eletrônico, em 2021, Nunes ainda era o presidente da empresa que ele fundou em 1997.
A Nikkey assinou seis meses depois outro importante contrato público, com o Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo, órgão responsável por inspecionar as contas de campanha dos políticos paulistas: “Empresa de Ricardo Nunes e família, a Nikkey, tem contrato com o TRE-SP“.
O prefeito não quis responder aos questionamentos da reportagem. A assessoria da imprensa da prefeitura informou que a própria Nikkey — uma empresa privada — falaria sobre o assunto. A empresa não vê conflito de interesses no contrato com a CPTM.
A contratação da Nikkey por órgãos públicos é o tema do segundo vídeo da série Endereços, sobre o poder em São Paulo. O primeiro pode ser visto aqui: “O Sítio de Nunes em Área de Nascente“. A série marca o início da cobertura eleitoral do De Olho nos Ruralistas, que parte da maior metrópole do país e depois falará sobre municípios da Amazônia e do Cerrado, entre outros biomas.
SPTRANS TEM PARCERIA COM A CPTM NA LINHA ESMERALDA
O contrato firmado entre Nikkey e CPTM inclui os serviços de desratização, desinsetização e manejo e controle de pombos, morcegos e serpentes, além da capina química com agrotóxicos nas unidades operacionais e de manutenção da companhia.
Ao todo, são 332 unidades de proteção. Além das próprias estações, o contrato prevê ações nas ciclovias, subestações e cabines, repetidoras de rádio, bases de manutenção, salas técnicas, túneis, pátios de estacionamento e nos complexos administrativos da Roosevelt e da Estação da Luz — este último, instalado em um dos principais pontos turísticos de São Paulo.
O contrato da empresa da família Nunes abrange cinco das sete linhas ferroviárias que cortam a região metropolitana de São Paulo. São elas as linhas Rubi, Coral, Safira, Jade e Turquesa. As linhas Esmeralda e Diamante, não contempladas no pregão, foram privatizadas em abril de 2021 pelo então governador João Dória (PSDB). A operação é hoje controlada pelo consórcio ViaMobilidade, encabeçado pela CCR e pelo fundo RuasInvest.
Esse consórcio vem desenvolvendo diversas parcerias com a gestão do prefeito Ricardo Nunes. Entre elas, as obras de expansão da linha Esmeralda, pagas pela ViaMobilidade, que abarcam a integração da nova Estação Varginha, na zona sul, com o terminal de ônibus de mesmo nome, controlado pela SPTrans.
Procurada pela reportagem, a CPTM informou, em nota, que a contratação da Nikkey para a prestação de serviços de combate e controle de pragas nos complexos operacionais e de manutenção da companhia “foi realizada por meio de licitação, em formato de pregão eletrônico, seguindo as exigências legais e foi homologada em março de 2022”.
NIKKEY DIZ QUE CONTRATOS FORAM LEGAIS E REALIZADOS COM TRANSPARÊNCIA
Procurada pela reportagem, a Nikkey Controle de Pragas e Serviços Técnicos emitiu uma nota assinalando ser uma empresa “legalmente constituída, com mais de 25 anos de história e trajetória reconhecida pela seriedade no seu ramo de atuação”. “A Nikkey tem orgulho do que construiu e reitera que estará sempre vigilante”, diz o comunicado. “Diante de reportagens descontextualizadas e com objetivos eleitoreiros e escusos, a empresa irá recorrer ao Judiciário para defender a sua honra e legado diante de qualquer ameaça ou deturpação de sua história”.
A empresa informa que foi aberta em 1997 com capital social de R$ 20 mil. Os dados batem com os da Junta Comercial do Estado de São Paulo. Com “capital próprio de seus sócios”— Ricardo Nunes e José Sergio Silvestre — e valor “atualizado ao longo dos anos”, conforme o desenvolvimento da empresa. O nome Nikkey foi escolhido por significar perseverança, longevidade e prosperidade.
“Os contratos mencionados foram resultados de processo licitatório na modalidade pregão eletrônico e menor preço realizado dentro da legalidade, com toda a transparência devida e participação de diversas empresas”, responde a Nikkey. “Importante reiterar que nunca, em sua história, a Nikkey teve contratos com a Prefeitura de São Paulo”.
De Olho nos Ruralistas constatou que a empresa fez, em julho de 2020, uma ação de desinfecção e higienização “sem custos” da subprefeitura da Capela do Socorro, região onde fica a sede da empresa. A alguns meses da eleição, com divulgação da própria subprefeitura. O vídeo do observatório fala dos contratos da empresa com creches conveniadas da prefeitura, por meio da Associação da Criança e do Adolescente (Acria), conforme noticiado por Folha e Estadão.
Esses contratos foram assinados pela Nikkey Serviços, um desdobramento da empresa principal. Baixada em 2021, ela teve como sócias Mayara Nunes e Regina Carnovale, respectivamente filha e esposa do prefeito de São Paulo. Ao contrário do mencionado em nosso vídeo, Regina não foi sócia da Nikkey Controle de Pragas, apenas da unidade de serviços.
A empresa tem contratos com prefeituras pelo país, como a de Alfenas (MG). Com o governo federal, os principais contratos são com o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento e com o Ministério de Minas e Energia, em especial com a Petrobras.
(*) Alceu Luís Castilho é diretor de redação do De Olho nos Ruralistas.
(*) Bruno Stankevicius Bassi é coordenador de projetos do observatório.