Em editorial publicado nesta segunda-feira (25), o Estadão voltou a criticar a atuação do ministro Alexandre de Moraes no Supremo Tribunal Federal (STF), afirmando que ele “marca e cobra o pênalti”. Desta vez, o jornal pediu que o magistrado se declare impedido de relatar o inquérito que investiga a elaboração de um plano golpista após as eleições de 2022:
Para o bem do Brasil, o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), deveria declarar-se impedido de relatar o inquérito que apura a elaboração de um plano golpista após as eleições de 2022. Poderia ir além e tornar-se apenas o primeiro de outros movimentos igualmente benéficos para o bom funcionamento do STF e a legitimidade de suas decisões, como declarar-se impedido também de julgar o caso quando este chegar ao plenário da Corte. (…)
Embora seja improvável que Moraes ignore tal clamor, seria um gesto de grandeza, com abdicação republicana de sua reconhecida afeição pelo protagonismo político, policial e judicial. Ao fazê-lo, o ministro evitaria deixar brechas desnecessárias que venham, no futuro, permitir a anulação de processos, como ocorreu na malfadada Operação Lava Jato, ou mesmo que se volte a falar na delirante ideia de anistia que sistematicamente ronda o Congresso.
O Inquérito 4.874 adquiriu contornos ainda mais graves depois que a Operação Contragolpe, da PF, revelou um audacioso plano para matar o presidente Lula da Silva, o vice-presidente Geraldo Alckmin e o próprio ministro Moraes. (…)
A extensão do furor delitivo, o número de envolvidos, o grau de participação de Bolsonaro e que tipo de punição merece tamanha afronta à democracia e à vontade popular serão objeto de análise dos ministros do STF, sob a liderança do relator. Não há o que questionar até aí. O duvidoso é o quanto a relatoria de Moraes pode tisnar o que precisa ser inquestionável.
Já tem longa vida o incômodo com a mixórdia de poderes adquiridos por Moraes, hoje um onipotente e onisciente condutor de inquéritos sigilosos e onipresentes. (…)
Desde então, inquéritos que deveriam prever prazo para acabar, ser transparentes e ter objeto determinado foram prorrogados livremente, assim como também se avançou em cautelares distorcidas, combate à ganância das Big Techs, investigação da falsificação do cartão de vacinas de Bolsonaro e outros tentáculos. Sob a chancela dos seus pares, Moraes se autoatribuiu o papel de livrar a democracia do extremismo e do discurso de ódio, motivando-se a censuras, bloqueios de contas, multas exorbitantes e prisões preventivas cuja legalidade não pôde ser verificada, porque correm sob sigilo.
Que não reste dúvida sobre o entendimento deste jornal: o Brasil, ao que parece, quase foi alvo de uma intentona golpista, cujo extremo pode ter sido a montagem de um plano destinado a matar autoridades, Bolsonaro foi, no mínimo, o estimulador-geral do espírito golpista daquele tempo, e seus artífices e executores precisam ser julgados por seus crimes. Nada disso, porém, reduz o dano dos excessos produzidos pelo ministro Moraes nem oblitera a sua condição de alvo, vítima ou objeto da mesma causa que estará relatando, acusando e julgando. Não há virtuose de tal ordem na defesa recente da democracia que justifique tantos poderes.