O neoliberalismo que roubou direitos dos trabalhadores no Governo Bolsonaro atuou como armadilha contra esquerda nas eleições de 2024.
O desemprego caiu, mas – como dizem os argentinos, todo lo mas – os salários, também, despencaram.
Com eles, emergiu a sensação de empobrecimento relativo, apesar de os trabalhadores trabalharem mais e ganharem menos.
Os empresários acharam ótimo o modelo neoliberal para os salários, pois elevaram seus lucros, diante da redução dos custos de manutenção das folhas de pagamentos dos trabalhadores.
A sensação de alegria operária por todos estarem trabalhando e ganhando justo pelo trabalho realizado não se realizou desde a supressão dos direitos trabalhistas, com a destruição da CLT.
O neoliberalismo enterrou Vargas e o voto contra dos trabalhadores foi a sua vingança.
A taxa de mais valia cresceu e, igualmente, o volume de horas trabalhadas não pagas, para elevar a lucratividade do capital, criou o ambiente de insatisfação relativa dos assalariados.
Resultado: voto contra o governo Lula nas eleições municipais.
Se Bolsonaro tivesse faturado a disputa eleitoral em 2022 – faltou pouco –, e não Lula, quem estaria amargando a derrota seria o ex-presidente.
CENÁRIO FAVORÁVEL AO BOLSONARISMO
Não é à toa que diante da vitória da direita e da ultradireita na maioria dos municípios, com o maior número de votos sendo abocanhado pelo PL bolsonarista, Bolsonaro esteja a fim de disputar as eleições de 2026.
A vontade do ex-presidente aumenta quanto mais os bolsonaristas antevêem o desgaste eleitoral que provocará o arcabouço neoliberal proposto pelo ministro Fernando Haddad, da Fazenda.
São grandes as possibilidades de derrota eleitoral, em 2026, se o presidente Lula aprovar os cortes de gastos nos setores sociais – educação, saúde, previdência, seguro-desemprego, abono salarial, BPC etc – para alcançar o déficit orçamento zero prometido pela equipe econômica.
Pule de dez, devem estar esfregando as mãos os bolsonaristas, se saírem para a disputa.
Afinal, são os gastos sociais que puxam a demanda global, aquecendo o mercado interno, visto que a contrapartida dele, como sabe muito bem o presidente da República, são investimentos que se traduzem no silogismo capitalista: emprego, renda, consumo, produção, arrecadação e investimentos.
Repetiria ou não em 2026 o que aconteceu em 2024, ainda mais com o exemplo expressivo da vitória eleitoral de Trump sobre Kamala, nos Estados Unidos, pelos mesmos motivos?
DESASTRE ELEITORAL DEMOCRATA AMERICANO
Biden e Kamala, durante a campanha eleitoral, soltaram foguetes por estarem os Estados Unidos vivendo pleno emprego keynesiano, porém, com salários cadentes.
Os economistas clássicos, como Pigou, já tinham prognosticado que o pleno emprego sinaliza salário zero ou negativo na sua máxima expressão do termo.
Todos podem trabalhar na fase do pleno emprego pelo salário disponível, que Marx, em O Capital, igualmente diz ser aquele que é o ideal para o capitalista, ou seja, zero ou abaixo de zero.
Só não trabalha quem não quer pelo salário disponível no mercado, o que leva o trabalhador à conclusão de que é melhor não trabalhar, viver de auxilio estatal, do que pagar para trabalhar, como comprovaram as experiências neoclássicas sob capitalismo liberal do laissez faire, que implodiu na crise de 1929.
Enquanto Kamala e Biden comemoravam equivocadamente o pleno emprego keynesiano, Trump denunciou que o poder de compra dos salários dos americanos estava cada vez mais cadente.
Resultado: Trump ganhou todas as disputas: para a Casa Branca, para as duas casas no parlamento, com maior número de votos no colégio eleitoral e no cômputo geral da apuração nacional.
Barba, cabelo e bigode.
FINANCEIRIZAÇÃO CRIA OPERÁRIO DE DIREITA
O neoliberalismo, tanto nos Estados Unidos, como no Brasil, e em todo os lugares em que está sendo implementado pela financeirização econômica, dominada pelos mercados especulativos, criou o operário de direita, quando mais cai o poder de compra dos salários no capitalismo produtivo, massacrado pelos juros altos.
Não é à toa, portanto, que uma semana depois da vitória de Trump e de seu resultado negativo para os democratas, que afundaram a social-democracia, por terem deixado os trabalhadores de lado, como disse Bernie Sanders, o reflexo no Brasil é grande.
As forças progressistas que apoiaram Lula em 2022 estão, agora, rachadas.
Ministros das áreas sociais, como Trabalho, Previdência, Saúde, Direitos Sociais, alertam que podem abandonar o governo, porque serão desmoralizados diante do eleitorado.
Irão – se forem – às eleições em 2026 sem cacife eleitoral, cair na armadilha do arcabouço neoliberal?
Quem se habilita?
Nesta semana, o presidente Lula tem diante de si a dura tarefa de escolher: apostar na reeleição, dobrando a aposta no que sempre o elegeu, ou seja, os programas sociais, ou na sua previsível derrota, por ameaçar de destruição seu patrimônio eleitoral, se arrochar os mais pobres.
(*) Por César Fonseca, jornalista, atua no programa Tecendo o Amanhã, da TV Comunitária do Rio, é conselheiro da TVCOMDF e edita o site Independência Sul Americana.
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