O fundo da questão relativa à emergência fulminante de Pablo Marçal, no cenário político nacional e, paulista, em particular, está relacionada à base econômica vigente no país alheia à estrutura produtiva, mas, meramente, vinculada à economia especulativa, rentista, determinada pela financeirização econômica global que tomou conta do Brasil, da América Latina etc.
Trata-se da criação de uma cultura da esperteza, desvinculada do valor-trabalho como gerador de riqueza social, direcionada à população na sua luta pela sobrevivência com dignidade e luta política no ambiente ideológico capitalista.
Acabou o capitalismo produtivo e, mesmo, os mais espertos empresários não mais acreditam em valor-trabalho, em eficiência e em produtividade, nos termos do sistema capitalista clássico, ancorado no silogismo produção, consumo, emprego, arrecadação, investimento etc.
Afinal, a burguesia, no ambiente de total incerteza econômica e financeira, está jogando mais de 2/3 do resultado operacional das suas empresas na jogatina rentista, porque nela é possível ganhar juros reais de 7% acima da inflação de 4%, 4,5%, graças aos juros extorsivos comandados pelo Banco Central Independente (BCI), comandado pelo neoliberal Campos Neto.
No cenário da financeirização especulativa, ficou muito fácil ganhar dinheiro, para quem tem base primitiva de capital acumulado, onde, a cada semana, a pesquisa Focus, realizada, apenas, por um punhado de bancos, sem nenhuma transparência, projeta a inflação futura, trazendo-a valor presente, para ditar a taxa de juros Selic.
Não é só no Brasil que acontece tal fenômeno.
Ele é mundial.
JOGO ELEITORAL DO IMPÉRIO
No centro capitalista especulativo americano, o Banco Central, o FED, agora, projeta juro mais baixo, para permitir Kamala Harris, candidata do Dep State, patrocinador das guerras imperialistas, ganhar a eleição, no Império, com protestos do fascista Donald Trump, para que os capitalistas americanos transportem suas poupanças para onde, como no Brasil, os juros estão nas alturas estratosféricas.
Passadas as eleições nos Estados Unidos, certamente, o FED fará o ajuste e, aí, será o de sempre, aquele Deus nos acuda especulativo, bancarrotas etc. e tal.
Os Pablo Marçal se proliferam nesses ambientes, no qual o valor-trabalho deixou de ser uma cultura moral da sociedade, para evoluir pelo esforço meritocrático, aliado às condições de classes sociais de cada segmento econômico, como é a norma do capitalismo, para dar lugar ao seu oposto, à esperteza, a malandragem, ao vale-tudo antiético etc.
O que faz Marçal, a sensação eleitoral tupiniquim, na maior metrópole da América do Sul?
Indiretamente, ele admitiu fazer parte do PCC, porque, disse, em SP todo mundo tem ligação com o PCC.
Deu razão à concorrente na disputa pela prefeitura paulista, Tabata Amaral, que denuncia ser ele traficante de cocaína, trocando a droga por carros de luxo etc.
Ora, a fortuna de Marçal, registrada na justiça eleitoral, para permitir sua disputa na eleição municipal, alcança R$ 200 milhões.
Certamente, é maior do que isso, pois ele destacou, em entrevista ao canal de youtube, “Os sócios 198”, para falar sobre “História, Negócios e Política”, que dispõe de 19 empresas que, indiretamente, participa de 40 outros empreendimentos, por sua vez, coligados, com potencial de expansão em mais de 200 novos empreendimentos nos quais seus tentáculos alcançam etc.
Verdade ou mentira?
JOGATINA E NEGOCIATAS
Cabeça ágil de quem já está faz tempo em negociatas, Pablo Marçal, 40 anos, casado, 4 filhos, atropela, sobretudo, não apenas entrevistadores, como adversários, em saraivadas de argumentos que dão a entender tratar-se de um globe-trotter com tendências à total inescrupulosidade, para dizer o mínimo.
Faz questão de dar exemplos de esperteza e sabedorias econômico-financeiras ao dizer que compra tudo em leilão para obter descontos no mínimo de 50%.
Se comprar um edifício, com disse que comprou, que vale R$ 100 milhões, oferece, à vista, R$ 40 milhões ou R$ 50 milhões, para vender por R$ 70 milhões, abocanhando lucro líquido de R$ 20 milhões.
Rapidamente, acumula R$ 1 milhão de dólares e paga o empreendimento com aluguel em imobiliárias que controla, etc.
Capital puxa capital.
Ele quer comprar a CNN, para alavancar, certamente, sua candidatura presidencial, talvez, em 2026, depois de, possivelmente, passar pela prefeitura de São Paulo, se for o caso, etc.
E assim vai abrindo picadas em velocidade de cruzeiro em céu de brigadeiro com suas aeronaves que diz possuir.
As redes sociais estão entupidas de Pablo Marçal, e como a comunicação hoje se dá por redes sociais, muito mais que por tevê e rádio, ele está convencido de que chegará lá, onde almeja, no Planalto, para governar o Brasil.
DOMÍNIO DO IMAGINÁRIO POPULAR
O imaginário popular é tomado de assalto por esse personagem que ganha dinheiro como água no ambiente da financeirização econômica especulativa, seja fazendo negócio com PCC, como denuncia Tabata Amaral, seja comprando edifícios, carros e trocando por cocaína, que, como qualquer outra mercadoria, é negociada no mercado, elevando lucratividade dele, exponencialmente.
É, portanto, na especulação, no capitalismo de jogatina em que se transformou a economia capitalista moderna que Marçal vai conquistando seus espaços e arrebanhando admiradores.
Resultado: vai se encantando com esse personagem intrépido e fagueiro o senso popular massacrado pelo modelo neoliberal da jogatina rentista que impõe à população o arcabouço fiscal que não deixa o presidente Lula realizar, satisfatoriamente, investimentos produtivos, para construir a infraestrutura nacional.
Afinal, a prioridade maior do governo, atualmente, está, umbilicalmente, relacionada ao atendimento da demanda financeira especulativa da Faria Lima, cujo substrato social são os Pablo Marçal da vida, enquanto a administração lulista tem que cortar gastos sociais para pagar juros e amortizações da dívida pública que abocanham mais de R$ 800 bilhões/ano do Orçamento Geral da União(OGU).
CULTURA DE SILVIO SANTOS
Pode-se ou não dizer que Pablo Marçal é um herdeiro, bem mais inescrupuloso que um Silvio Santos, que acaba de falecer, mas que, enquanto viveu, acumulou fortunas dando calotes no populacho por meio das telesenas e dos baú da felicidade, encanto e objeto de desejo de milhões e milhões de espectadores, enlouquecidos pelo chamamento televisivo de “Quem quer ganhar dinheiro?”.
Por acaso, a cultura de SS não se dissemina na jogatina das Bets, capitaneadas pelos campeonatos de futebol?
O governo federal, impulsionador do jogo de azar, nos últimos dois anos, autorizou concessões de mais de 200 agentes para tocar essa jogatina que se transforma, operativamente, em sangria da poupança popular, logrando redução do poder de compra dos trabalhadores, levando-os ao sonho de ficarem ricos, da noite para o dia.
Nesse ambiente, não seria, também, sonho dos trabalhadores, massacrados pelos salários baixos, no modelo neoliberal, onde as chances de sucesso pelo trabalho inexistem, chegar aonde chegou Pablo Marçal, que promete governar SP e quiçá o Brasil?
O estímulo ao jogo, impulsionado pela institucionalidade capitalista, é ou não a principal parteira dos Pablo Marçal da vida?
Foto Intercept Brasil
(*) Por César Fonseca, jornalista, atua no programa Tecendo o Amanhã, da TV Comunitária do Rio, é conselheiro da TVCOMDF e edita o site independência Sul Americana.