Angel Prado disse que consulta popular realizada no país demonstra apoio expressivo a revolução bolivariana
Angel Prado é um dos primeiros ministros da Comuna da Venezuela que já foi militante em uma destas formas de organização social baseada na autogestão . Desde junho ele tem a função de gerir as comunas no país e manter diálogo direto com o governo, que considera a pasta estratégica para alcançar dois pontos fundamentais do que os chavistas chamam de projeto revolucionário bolivariano: a transformação do Estado e a disputa política no país.
Prado não tem uma história ligada à administração pública. Apesar de ter sido prefeito de Simón Planas, município do estado de Lara, as grandes marcas do ministro até tomar posse na pasta foi ter coordenado a organização Unión Comunera e fundado a comuna El Maizal, a maior da Venezuela.
Esse tipo de organização popular foi criado ainda com o ex-presidente Hugo Chávez que, em 2010, criou uma lei regulamentando os grupos. O objetivo era conduzir a sociedade a uma forma organizativa que chegasse a uma nova forma de gestão do território: o Estado comunal.
Em entrevista ao Brasil de Fato, Angel Prado afirmou que esse modelo de organização social está no horizonte e ajuda a reforçar que tipo de sociedade o venezuelano não quer.
“Queremos mudar o Estado, não queremos mais esse Estado liberal, burguês, burocrático. Temos que recorrer a outro modelo, queremos que seja o Estado comunal gostaríamos de um sistema político que não nos coloque condições. Gostaríamos de nos aprofundar na Constituição, mas temos que ir por partes. Estarei muito velho quando ver o lugar onde definitivamente queremos chegar com o nosso modelo de democracia, mas a alegria que temos é que hoje fazemos parte dele e temos a grande oportunidade de lutar”, afirma.
De acordo com o ministro, a política venezuelana tem hoje uma disputa envolvendo três forças. A primeira é a direita reacionária, que nos últimos 10 anos foi liderada por figuras que ficaram conhecidas pelas tentativas de golpes, como Leopoldo López, Juan Guaidó e María Corina Machado. A segunda força seria representada por setores reformistas, que envolvem desde empresários até dissidentes do chavismo.
O socialismo se constrói corpo a corpo, é construído pela mulher, pelo homem, pela criança. A gente constrói a partir da prática introduzindo um pouco de pragmatismo, certo? E é bom assumir a ação como parte do risco.
Já a terceira força, o Poder Popular é composta pelos revolucionários venezuelanos. As comunas estão dentro desse espectro. Para Prado, a crise econômica que a Venezuela passou entre 2015 e 2021 fez com que os setores reformistas, que não querem um aprofundamento da revolução, ganhassem espaço.
“Somos muito sinceros, não é um país onde há uma revolução consolidada, não é um país onde o socialismo já foi construído. É um país que tem um processo revolucionário muito interessante, com um povo muito firme e determinado a lutar, disputar e existe uma correlação de forças em que estamos. Reconhecemos que existe um inimigo, que existem setores que não nos amam e acreditam no processo”, disse..
Consulta e a mobilização popular
No final de agosto, as comunas venezuelanas votaram em 4.500 projetos a serem executados pelo governo em todo o país. Mais do que participação direta na tomada de decisões, a Consulta Popular teve também o caráter de mobilizar comuneros em uma demonstração de apoio ao governo um mês depois das eleições presidenciais no país.
A reeleição de Nicolás Maduro para um terceiro mandato foi contestada pela oposição e criou tensão diplomática com países governados pela direita. Para Angel, a consulta neste período ajuda a mostrar para a oposição e para os outros países que a revolução bolivariana é forte e enfrenta um modelo neoliberal.
“A direita venezuelana tem muito medo, a burguesia tem muito medo que o povo adote o modelo, legitime o modelo e que depois não haja mais volta, não, e o imperialismo e as burguesias da América Latina têm muito medo que esse tipo da experiência do processo começará a ser exigida em outros países onde a política participativa não é proposta de forma alguma, mas sim a representação do Estado burguês e da superestrutura”, afirmou.
A primeira consulta popular foi realizada em abril. De lá para cá, 85% dos projetos votados já foram executados. A transferência dos recursos para essa segunda leva de projetos também foi finalizada e o objetivo é fazer mais uma consulta até o final do ano.
O governo e os comuneros entendem que, quanto mais autonomia as comunidades tiverem na definição de prioridades e na forma que os gastos públicos serão executados, mais consolidada será uma democracia participativa, na qual a população define os rumos do orçamento.
“Neste novo governo vamos implementar novos métodos, novas formas de fazer política, vamos aprofundar e inovar na procura de metodologias para conseguir mudanças e transformações para que o orçamento nacional possa ser executado com comunidades organizadas. O povo tomava as decisões e a liderança popular atua há anos em seu território, organizada em uma comissão de trabalho”, disse Prado.
Organizações políticas latinoamericanas
Se na Venezuela a disputa pelo poder político já coloca diversos desafios para uma revolução que ainda está em curso, no resto da região a força das elites econômicas cria barreiras ainda mais difíceis de serem derrubadas. Para Angel Prado, ainda assim, cada país tem o seu contexto e os movimentos populares conhecem essas realidades e têm a sua forma de fazer política.
“Esses grupos criaram os seus próprios e novos métodos de trabalho, os seus governos não fizeram as exigências. Aparentemente, não há muita vontade política para transferir o poder ao povo em outros países, governos que são muito conservadores querem preservar o poder e não querem que o povo tenha esse direito de decidir”, afirmou.
Mesmo assim, ele entende que o intercâmbio é importante para fortalecer os projetos que estão imersos em outras disputas políticas. Prado cita, por exemplo, a ideia de aproximação com os Comitês de Defesa da Revolução (CDR) de Cuba e o Movimentos dos Trabalhadores Rurais sem Terra (MST) do Brasil.
“Os movimentos sociais da América Latina têm força, têm organização, têm métodos para trabalhar, acho que eles podem tirar algumas ideias do que estamos fazendo na Venezuela, assim como também buscamos ideias para complementar o nosso trabalho. Mas o mais sensato e o mais importante é pensar na territorialização da política e na coletivização dos meios de produção, na coletivização da gestão da administração, uma gestão não pode ser feita onde temos um representante da comunidade”, afirmou Prado.
A articulação com o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) foi uma demanda trazida pelo próprio presidente Nicolás Maduro. Ele pediu o envio de uma brigada de mil agricultores da organização ao país para produzir em solo venezuelano. O MST tem uma brigada que atua no país há quase 20 anos e ajuda as comunas em projetos de agroecologia, além de formação técnica e a produção de alimentos orgânicos.
“Nós concordamos com a necessidade de construir o projeto histórico, de construir o socialismo, mas também concordamos que produzir alimentos é uma tarefa revolucionária, é uma das principais tarefas no campo produtivo do MST. Ali lemos em algum momento que Fidel Castro reivindica esse slogan produzir alimentos para uma tarefa revolucionária. Queremos debater a luta histórica da América Latina, fazer uma análise com o MST e outros movimentos sociais da América Latina porque nos vemos assim, a Pátria Grande nos vemos porque somos da mesma classe”, afirmou Prado.