Vitória de Orsi deve fortalecer Mercosul e cooperação bilateral entre Uruguai e Brasil, avalia Roberto Goulart Menezes
A eleição de Yamandú Orsi como presidente do Uruguai representa um “diálogo mais estreito” na cooperação bilateral com o Brasil e pode contribuir para “recompor a coesão” no Mercosul. Esse é a análise de Roberto Goulart Menezes, vice-diretor do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília (UnB).
“A agenda do Uruguai no Mercosul foi muito tensa nos últimos anos em função da obsessão uruguaia em negociar um acordo em separado com a China e assim violar a Decisão 32/00 do Mercosul que definiu a negociação em conjunto com parceiros extra-região. Agora com a mudança de governo esses temas poderão ser tratados no grupo, apesar dos obstáculos que a Argentina de Javier Milei tem imposto ao funcionamento do bloco”, disse Menezes ao Brasil de Fato.
A gestão do direitista Luis Lacalle Pou (2020-24) no governo uruguaio foi marcada pela orientação de fortalecer acordos com União Europeia e reduzir a participação no Mercosul, um dos pontos que enfraqueceu o acordo entre os dois blocos, que o governo brasileiro de Luiz Inácio Lula da Silva busca costurar. Menezes avalia que Lula deve bucar alinhamento com o novo governo uruguaio em nova tentativa de tirar do papel o acordo entre o Mercosul e a União Europeia, que não avançou durante o encontro do G20 no Rio de Janeiro, devido ao posicionamento contrário do presidente francês Emmanuel Macron.
Uma das maneiras de fortalecer os laços entre o Brasil e o Uruguai com foco no Mercosul é a redução das assimetrias, de forma a tornar mais competitivas as economias dos menores países do bloco, caso de Uruguai e Paraguai. Uma antiga demanda do Uuguai desde a formação do bloco, o fim da dupla tributação, em relação aos tributos sobre a renda e o capital foi atentida pelo governo Lula por meio de um decreto presidencial assinado em outubro de 2023.
“Esse é um mecanismo que o Brasil entende como de redução de assimetrias para dar espaço nos mercados brasileiro e argentino para os produtos do Paraguai e do Uruguai. Então creio que tem sim o compromisso do Brasil em fazer avançar isso que já foi acertado em 2023.”
Investimento brasileiro
O Brasil é o principal parceiro comercial do Uruguai, com fluxo de US$ 5,3 bi (R$ 30 bi) em 2023, segundo o Ministério das Relações Exteriores. No que diz respeito às relações bilaterais entre os dois países, Menezes avalia que os investimentos em energia eólica feitos pelo Brasil no Uruguai – iniciados em 2012 durante o primeiro mandato do presidente José Mujica – devem ser ampliados. A energia eólica é a principal fonte energética do Uruguai, representando 39% do total em 2023.
Em 2015 uma parceria entre a Eletrobras e a UTE (estatal uruguaia de energia) nos governos de Dilma Rousseff e José Mujica foi responsável pela criação do Parque Eólico Artilleros em Colônia, a cerca de 170 km da capital uruguaia Montevidéu. Além da usina eólica compartilhada entre os países já em funcionamento, o Brasil pretende amplicar o relacionamento com o Uruguai na área de energia.
A realização de novas obras de investimento do Brasil nos países do Mercosul, com financiamento do Banco Nacional do Desenvolvimento de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), porém, enfrenta a resistência do Congresso Nacional brasileiro, onde tramita o Projeto de Lei (PL 87/2023) de autoria do senador Plínio Valério (PSDB-AM) que visa proibir o BNDES de financiar e conceder crédito a governos estrangeiros, com exceção para o financiamento da exportação de bens e serviços produzidos no Brasil.
“A realização de obras e serviços de engenharia é um problema hoje para o governo brasileiro. Se esse projeto for adiante, trava muito, até mesmo o aval do Tribunal de Contas da União. Então essas obras que estavam previstas o Brasil vai concluí-las como por exemplo a segunda ponte sobre o Rio Paraguai e a eólica.”
O governo brasileiro lançou nesta segunda-feira (25), o Relatório 2024 do projeto Rotas de Integração Sul-Americana, com informações sobre 190 obras espalhadas pelos 11 estados fronteiriços, com investimentos que integram o Novo PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), que traz o status de atuação da administração pública federal nas regiões limítrofes do Brasil com os vizinhos sul-americanos.
As cinco rotas propostas do projeto têm o objetivo de integrar o comércio do Brasil com os países da América do Sul e reduzir o tempo e o custo do transporte de mercadorias entre os países da região com a Ásia. A rota Bioceânica do Sul prevê a ligação de Santa Catarina e Rio Grande do Sul com Uruguai, Argentina e Chile.
O principa objetivo, aponta Menezes, é “ligar o oceano Atlântico ao Pacífico nas diferentes modalidades de transporte, sobretudo ferrovias e portos”. 51 projetos que estão no Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) 2025 integram a agenda das Rotas de Integração Sul-Americana e abarcam parte das 190 obras constantes da agenda das Rotas de Integração Sul-Americanas. O grande pacote anunciado pelo Ministério do Planejamento conta com 65 rodovias federais, 40 hidrovias, 35 aeroportos, 21 portos, 15 infovias, nove ferrovias e cinco linhas de transmissão de energia elétrica.
“Os países da nossa região que estão no Mercosul, alguns têm acordo com a China na Nova Rota da Seda, então o Brasil está procurando combinar esses dois tipos de investimento, o investimento da Nova Rota da Seda no caso da Argentina, mas também o segundo através do projeto de Integração Sul-Americana e um terceiro é o Brasil revitalizar o Fundo de Convergência Estrutural do Mercosul (Focem) para financiar essas obras. Mas com a oposição da Argentina é difícil que avance, então o Brasil teria que estar disposto a arcar com o custo”, aponta Menezes.