Nesta Coluna Justiça e Paz o tema é o julgamento no Supremo Tribunal Federal da nova Lei de Improbidade Administrativa (ARE-843989) finalizado na última quinta-feira (dia 18 de agosto). O julgamento teve foco nas alterações havidas na referida lei.
A primeira delas, a que passou a exigir a intenção do agente para configuração da improbidade (não mais punindo ações e omissões descuidadas não intencionais).A segunda, a que tratou da prescrição intercorrente, isto é, prazo de quatro anos para o judiciário concluir o julgamento das ações de improbidade uma vez iniciadas.
Pois, bem, as mudanças provocadas pela Lei 14.230, já alcançam todos os cidadãos e cidadãs brasileiros desde outubro de 2021. Ojulgamento da Suprema Corte versou sobre a eventual retroatividade dos efeitos das duas alterações. Em outros termos, o ARE 84.3989, serviu de base para uma discussão muito mais ampla, que foi decidir se processos de improbidade administrativa discutidos em tempo anterior poderiam ser atingidos pelas alterações legislativas.
É importante ressaltar que ademais do impacto na comunidade jurídica, o julgamento tomou atenção especial da sociedade brasileira em um ano eleitoral, pois, um dos efeitos de condenação imposta em face da tipificação da improbidade administrativa é a suspensão dos direitos políticos. A depender do alcance da decisão tomada pela Suprema Corte, uma série de candidaturas até então impedidas poderiam ter curso homologado, impactando já no pleito de 2022.
É essanatureza híbrida dos efeitos da Lei de Improbidade Administrativa, em certas matérias tendo repercussão cível, em outras repercussão penal, é que, em boa medida abriu divergência na Suprema Corte, embora, com o debate,a ampla maioria formada logrou pacificar a temática.
Em apertada síntese, as teses levantadas pelos Ministros seriam as seguintes: a) a retroatividade (volta no tempo) irrestrita dos efeitos das alterações; b) a retroatividade apenas para processo que estão ainda em julgamento; c) a decisão se a prescrição intercorrente deve ou não voltar no tempo;
Quanto a primeira e segunda posições (teses opostas), vigorou a segunda, no sentido de que os efeitos da lei de improbidade administrativa, não aproveitam processos já solucionados, e, só podem voltar no tempo para processos ainda em andamento. Já quanto à terceira, entendeu-se que o prazo de contagem da prescrição intercorrente (os quatro anos anteriormente mencionados) apenas pode ser aproveitado para processos instaurados após a entrada em vigor da lei
As razões tomam por conta alguns aspectos jurídicos, em respeito ao ato jurídico perfeito e em observância aos princípios da segurança jurídica, do acesso à Justiça e da proteção da confiança(Voto Min. Alexandre Moraes ARE-843989), levando à posição de que os processos já definidos sejam mantidos.
Por outro lado, fixou o Supremo que a nova Lei 14.230/2021 se aplica aos atos de improbidade administrativa praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior. Assim, o juízo competente analisará a intenção (dolo) por parte do agente. Isto porque, é necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se – na Lei 14.230 (arts. 9º, 10º e 11º) – a presença do elemento subjetivo –dolo. (ARE-843989).
Em termos práticos, a decisão, sem desobedecer às garantias constitucionais, sejam a da retroatividade da lei mais benéfica ou o ato jurídico perfeito e a segurança jurídica, ao tempo que aproveita ações em curso, mas não processos findos, acaba por frustrar eventuais planos de políticos e agentes públicos condenados pela lei de improbidade, até mesmo dolosamente, que contavam com a prescrição intercorrente para se tornarem elegíveis no pleito de 2022.
A decisão vem na boa direção de toda a mobilização em linha de justiça e paz de encantar a política. Nesse sentido, o caderno “Encantar Política”, produzido por uma rede de organizações, serviços, pastorais sociais e organismos da Igreja, Rede brasileira de fé e política, com o intuito de abrir os horizontes da Boa Política para todos.
Tal como salientou Dom Walmor Oliveira de Azevedo, presidente da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos Brasileiros), aliás, seguindo a exortação do Papa Francisco lançada na EvangeliiGaudium (Evangelizar com Alegria), pontificando ser a política a dimensão sublime da caridade, o propósito do Documento Encantar a Política é exatamente convocar para um protagonismo em salvaguarda do bem comum: “nenhum cristão pode permanecer alheio à tarefa de contribuir para que a sociedade se torne mais justa, solidária e fraterna: é compromisso de fé dedicar atenção à política, buscando resgatar a sua nobre vocação”.
(*) Por Eduardo Xavier Lemos e José Geraldo de Sousa Junior. Os autores são, respectivamente, presidente e membro da Comissão Justiça e Paz da Arquidiocese de Brasília.
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