A Revolução do Bom Senso trumpista, como está no discurso do presidente, no Congresso, nesta terça-feira, é a admissão tácita do império, não expressa claramente, de que a hegemonia global americana acabou.
Tem que dividir o poder com os tão fortes quanto os Estados Unidos, no cenário global de hoje: Rússia, pelo poderio nuclear, e China, pelo potencial econômico, que a transformou na primeira economia do mundo.
Márcio Rúbio, o secretário de Estado, semana passada, deixou claro o que entende por multilateralismo: renúncia americana à hegemonia absoluta.
O bom senso, portanto, é reconhecer o óbvio: O Fim da História era uma ficção neoliberal, bem como é necessário acabar com a paranoia anticomunista americana em relação, tanto à Rússia quanto à China.
Trata-se de concorrentes dos Estados Unidos, ainda, no campo capitalista, que não podem deixar mais de ser considerados potências, o que leva ao bom senso de admiti-los como tais.
O poder imperialista americano, portanto, na visão que emerge do governo, pelo discurso que fez no Congresso, é isso aí: admitir que o império não é mais aquele de antigamente, que cresceu espetacularmente no pós guerra, em Bretton Woods, em 1944.
NOVA DIVISÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO
A partir dali os Estados Unidos adquiriram o privilégio exorbitante de emitir moeda hegemônica que lhe deu vantagens sobre os demais países.
Passados 81 anos de Bretton Woods, essa realidade acabou.
Não é mais possível aos Estados Unidos garantir inflação barata e juros baixos, em relação aos demais, realizando déficit comercial mediante superávit financeiro – a partir da própria emissão monetária – de modo a não precisar preocupar-se em buscar superávits comerciais, para evitar déficits em contas correntes no seu balanço de pagamento.
Agora, o jogo é outro.
O dólar forte, que desvaloriza as outras moedas, permitindo-as vantagens comparativas para exportar ao poderoso mercado consumidor americano, implicou em desindustrialização e em dívida pública que alcançou os estratosféricos 36,2 trilhões de dólares e déficit público de quase 8% do PIB.
Tal situação cobra um preço alto dos Estados Unidos, que não pode mais ser pago, salvo se, por meio do protecionismo trumpista, desvalorizam o dólar, para valorizar moedas dos concorrentes e, dessa forma, fugir do perigo de colapso cambial, que jogaria a economia americana em hiperinflação.
O Brasil, como os demais países que se beneficiaram do dólar valorizado, estão, como disse o presidente aos congressistas americanos, estão na mira de Washington, para sofrer sanções protecionistas.
O modelo keynesiano de garantir ao Estado condições de puxar a demanda global, mediante juro e inflação baixa, produziu desindustrialização e dívida pública impagável.
Keynes pode ter deixado de ser solução, para virar problema.
RECADO DE ADAM SMITH
É bem provável ou não que os Estados Unidos aproveitem o que lhe resta de poder imperial para fazer o que Adam Smith pregava: dívida interna não se paga, renegocia?
Se, com o protecionismo, Trump terá que buscar aumento de exportações via desvalorização cambial, para fugir de colapso financeiro, potencialmente hiperinflacionário, estaria ou não no horizonte do império, não só a desvalorização do dólar, mas, também, uma moratória da dívida por um longo prazo, exemplo, 30, 40 anos, de modo a desafogar a economia?
Em entrevista a Fernando Haddad, certa vez, Delfim Netto, com o couro curtido pela crise mundial detonada pelo aumento do juro americano, em 1979, citou o exemplo de Sólon, líder de Atenas, que, diante do excesso de dívida impagável do Estado, empobrecendo a população, promoveu moratória geral, o que, certamente, hoje, levaria Wall Street e a Faria Lima à loucura.
Mas, fazer o que, se os limites do endividamento keynesiano do Estado foram alcançados?
Insistir na financeirização para provocar, no limite, revolução mundial, abrindo as portas ao socialismo?
Seria, nesse caso, necessário ou não promover o que Trump pregou ontem no Congresso: a Revolução do Bom Senso?
O discurso do líder direitista americano, portanto, desmancha dois mitos que envolvem a humanidade, desde o pós-guerra, por conta do poderio bélico e militar americano financiado por dívida pública impagável:
1 – o do anticomunismo, mesmo depois que a União Soviética foi derrotada pelo neoliberalismo, em 1991,com a tal da mentira do “Fim da história”, e;
2 – o da eternidade da hegemonia do dólar que se desmancha diante do colapso neoliberal, gerado pela fantástica dívida pública americana, cujas consequências são o empobrecimento da população americana e mundial, sacrificadas para continuar esticando o impossível de ser mantido: a farra da financeirização de Wall Street e da Febraban/Faria Lima.
Trump, com seu discurso no Congresso, está ou não dando a dica para o BC brasileiro, para parar com o jogo do mercado especulativo, que está jogando a economia brasileira no buraco e viabilizando a volta da direita fascista, tentando impedir o desenvolvimentismo democrático lulista?
(*) Por César Fonseca, jornalista, atua no programa Tecendo o Amanhã, da TV Comunitária do Rio, é conselheiro da TVCOMDF e edita o site Independência Sul Americana.
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