Períodos de estiagem se tornaram mais frequentes no final do século passado. Confira uma lista de dez períodos de seca grave da história recente do país.
A forte seca que assola o Brasil é considerada uma das piores dos últimos anos. Segundo dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), a estiagem já resultou em pelo menos 180.137 focos de incêndios, número que representa 50,6% do total registrado em toda a América do Sul.
A Amazônia é o bioma mais afetado, com 49% das queimadas registradas, seguida do Cerrado (30,5%), Mata Atlântica (13,2%), Pantanal (5,4%) e Caatinga (1,9%).
O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva vem tomando medidas para conter os efeitos da seca, como a criação de uma autoridade nacional para o clima. O ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, afirmou que há possibilidade de ser retomado o horário de verão, política criada para reduzir o consumo de energia elétrica extinta em 2019, pelo governo Jair Bolsonaro.
Ademais, o Supremo Tribunal Federal (STF) aprovou a solicitação do governo federal para abrir créditos extraordinários excluídos dos cálculos do teto de gastos e metas fiscais para combater incêndios e secas.
Embora tenham se tornado mais frequentes nos últimos anos, os períodos de seca afetaram o Brasil em vários momentos ao longo da história. A Sputnik Brasil listou os mais recentes períodos de seca vivenciados pelo Brasil desde o final do século IXX.
A Grande Seca de 1877
Conhecida como Grande Seca, a estiagem afetou o Brasil entre 1877 e 1879, assolando sobretudo o Nordeste, com efeitos mais graves para o Ceará. É considerada a seca mais letal da história do país, tendo deixado pelo menos 500 mil mortos, número que representava 5% do total de 10 milhões de habitantes da época.
Estimativas apontam que o número de mortos chegou a 400 por dia. A maioria das mortes eram decorrentes de sede e fome causados pela seca. Ademais, a situação levou a uma grande migração para capitais como forma de sobreviver à estiagem.
Na época, leis aprovadas pelo Parlamento e decretos destinaram verbas às províncias sem chuva, usadas principalmente para fornecer alimentos aos afetados pela seca, em especial a população do Norte do país que, na época, era dividido em apenas duas regiões: Norte e Sul.
No entanto, documentos do acervo histórico do Arquivo do Senado Federal, replicados pela Agência Senado, mostram que o socorro aos afetados gerou forte rejeição entre a elite política da época, com alguns senadores afirmando que a distribuição fomentaria um novo tipo de socialismo no Brasil. Eles defendiam que a população sertaneja deveria trabalhar em obras públicas como forma de ter direito ao auxílio.
Estiagens de 1915 e de 1932
Dois períodos de seca castigaram o Nordeste, em 1915 e 1932, sendo o Ceará novamente o estado mais afetado. Quando a seca de 1915, narrada no romance “O Quinze”, de Rachel de Queiroz, eclodiu, o coronel Benjamin Liberato Barroso, então governador do Ceará, criou espaços de contenção para alocar migrantes da seca, impedindo que chegassem a Fortaleza. Os espaços ficaram conhecidos como “currais humanos” e “curais do governo” e tinham como objetivo impedir o ocorrido em 1877, quando cerca de 100 mil retirantes migraram para a capital.
O primeiro espaço criado foi Alagadiço, localizado nos arredores de Fortaleza, que chegou a abrigar 8 mil pessoas em condições precárias e vigiadas constantemente. Elas não eram autorizadas a deixar o espaço a não ser para trabalhar em obras públicas ou engenhos próximos. Em troca, recebiam uma refeição por dia. Na seca seguinte, em 1932, como o espaço não era mais suficiente para conter o número de migrantes, outros sete espaços foram criados.
1934–1936
A estiagem que afetou o Brasil entre 1934 e 1936 é considerada uma das piores já registradas no país. Ela não se restringiu ao Nordeste, afetando também estados como Minas Gerais e São Paulo.
Foi a seca a responsável por colocar no imaginário popular a ideia do sertão nordestino como um problema nacional. Ela também foi tema de obras que cumpriam o papel de denúncia social, como o livro “Vidas secas” (1938), do escritor Graciliano Ramos, e a série Retirantes, composta por três telas (“Os retirantes”, “Enterro na rede” e “Criança morta”) pintadas por Candido Portinari em 1944, que retratavam nordestinos migrando para fugir da seca.
1963–1964
Em 1963, o país passou por um período de forte estiagem e onda de calor que perdurou até o ano seguinte, sendo marcado por ressecamento da vegetação e incêndios florestais.
A falta de chuva afetou com mais gravidade Amazonas, Rio de Janeiro, São Paulo, Minas Gerais e Distrito Federal. No Paraná, o cenário foi devastador, com 128 dos 166 municípios existentes à época afetados por incêndios florestais. Na época, Ney Braga, então governador do estado, divulgou uma carta aberta na qual afirmou que pelo menos 21 mil quilômetros quadrados da área do estado estava em chamas, causando em torno de 110 mortos e afetando mais de 30 mil pessoas.
Seca entre 1979 e 1983
Em 1979 teve início no Brasil uma grave seca que perdurou até 1983, afetando com mais gravidade o Nordeste. O número projetado de mortos não é exato, mas pesquisas apontam entre 3,5 mil e 4 mil mortos, a maioria crianças, por desidratação severa e desnutrição.
El Niño: 1997–1998
No final da década de 1990, o fenômeno El Niño levou a uma forte onda de calor no Brasil que resultou em um período de estiagem. O Nordeste sofreu os efeitos mais graves. Por conta da morte de animais e perda de lavouras, a população afetada da região passou a fazer saques a depósitos de alimentos.
Em algumas cidades, como no Recife, a água encanada passou a ser fornecida apenas uma vez por semana. Em contraponto, o fenômeno fez com que a região Sul registrasse chuvas acima da média.
2001
Mesmo após encerrado, os efeitos subsequentes do El Niño entre 1997 e 1998 perduraram até 2001. Com um nível acentuadamente baixo nos reservatórios causado pela falta de chuvas, o governo do então presidente Fernando Henrique Cardoso anunciou a necessidade de cortar em 20% o consumo de energia no país.
Para isso, foi implementada a política que ficou conhecida como “apagão”, com a população sendo obrigada a reduzir o consumo de energia sob risco de multa em caso de descumprimento da meta. Aqueles que economizassem acima da meta eram beneficiados com descontos na conta de luz.
2007–2008
No ano de 2007, Minas Gerais foi afetado pela pior seca já registrada no estado. Não houve chuva no estado entre março e novembro daquele ano, e a estiagem continuou até o ano seguinte, desta vez com precipitações abaixo do esperado.
Pelo menos 25 cidades mineiras foram afetadas pela seca, com 24 decretando estado de calamidade. A falta de chuvas prejudicou as lavouras e levou a um pico no preço dos alimentos.
2013–2014
Nos anos de 2013 e 2014, o Brasil vivenciou uma seca que afetou as regiões Nordeste e Sudeste, causando falta de água nas grandes cidades. No Sudeste, São Paulo sofreu os efeitos mais graves, atravessando uma crise hídrica que levou a baixas históricas nos reservatórios.
2020–2021
O baixo índice de chuvas registrado entre setembro de 2020 e abril de 2021 no Centro-Oeste e no Sudeste brasileiro, que representam 70% da capacidade de armazenamento de energia hidrelétrica do país, desencadeou um período de estiagem em todo o país.
O cenário foi agravado pelas altas temperaturas, que levaram a queimadas na Amazônia e no Cerrado, e pelo desmonte de instituições de monitoramento ambiental pelo governo do então presidente Jair Bolsonaro.