O debate sobre a regulação das redes sociais é um tema espinhoso que vem à baila quando polêmicas como a desobediência de Musk às leis brasileiras estouram. Parado no Congresso, o PL das fake news trata com minúcia de casos como este, previsto no projeto de regulação das redes, que conta com o apoio do governo nas discussões, garante João Brant, secretário de políticas digitais da Secom
Nas redes, o bilionário Elon Musk, alinhado à ultra direita, desafia constantemente a soberania digital do Brasil – especialmente após ter sua rede social, o “X”, que criou após comprar o Twitter, derrubada após decisão do STF no dia 31 de agosto, quando venceu o prazo que a corte deu de 24h para que a empresa estabelecesse representação legal no país.
Desde que Musk comprou o X, o empresário tem o Brasil como alvo. Além das mudanças constantes na estrutura da empresa, com demissões em massa e paralisação de serviços, a gestão de Elon Musk culminou com a afronta à soberania brasileira quando resolveu, motivo da decisão, não cumprir determinações judiciais, descumprir o Código Civil brasileiro e encerrou representação legal no Brasil.
Na sexta-feira passada, o Moraes havia ordenado a derrubada “imediata, completa e integral” do X no Brasil. Um dia antes, o X anunciou que não cumpriria a ordem judicial do STF para indicar um representante legal no Brasil. Na própria quinta-feira, Musk viu outra empresa sua, a Starlink, ter suas contas bloqueadas por ordem do ministro Alexandre de Moraes.
A partir da 0h do sábado (31/8), a rede social já estava fora do ar em diversos dispositivos no Brasil, mas a derrubada foi gradual, já que envolve diferentes operadoras de internet espalhadas pelo país. Na sexta-feira (30/8), Moraes determinou uma multa diária de R$ 50 mil, além de outras sanções civis e criminais, para indivíduos e empresas que tentarem acessar o X utilizando mecanismos como VPN (rede virtual privada), mesmo após a ordem de bloqueio.
Como quem dá entrevistas com frases prontas pensando nos cortes que serão produzidos e disseminados fora de contexto, Musk age fora da Lei para se posicionar como vítima e endossar o discurso de “ditadura e censura prévia”. Sua movimentação movimenta a política brasileira às vésperas das eleições municipais – e isso não é uma coincidência.
A solicitação para a nomeação de um representante ocorreu após a empresa encerrar suas operações no país, em um contexto marcado pelo não pagamento de multas relacionadas ao descumprimento de ordens anteriores sobre a suspensão de perfis na plataforma.
Musk argumenta que as solicitações para suspender perfis violam a liberdade de expressão, algo com o qual ele não concorda, embora tenha acatado pedidos semelhantes em outros países e censurado conteúdo sobre si próprio na rede social.
Caso não cumpra a decisão da Justiça, a plataforma pode continuar bloqueada no Brasil, uma vez que a derrubada é válida até que as ordens judiciais sejam cumpridas, com multas pagas e a indicação de um representante legal no território nacional.
Ataques em série
A verdade é que a rede social desrespeita o povo brasileiro ao ignorar as determinações do judiciário. Todos sabem qual é o objetivo de Musk: incitar a extrema direita nacional à insubordinação.
Desde abril, o empresário tem atacado o ministro Alexandre de Moraes, iniciando uma série de postagens críticas nas quais o acusa de ser um censor e pedindo seu impeachment. Para essa campanha difamatória, chegou a mobilizar deputados da ultra direita dos Estados Unidos, que fizeram diversas acusações infundadas e foram prontamente apoiados por bolsonaristas.
Especialistas destacam que o fechamento do escritório da empresa no último mês, que contava com cerca de 40 funcionários, também teve um propósito estratégico, dificultando o cumprimento de ordens judiciais, mesmo que essas já não estivessem sendo respeitadas.
É imprescindível lembrar: apesar do encerramento do escritório, a rede X ainda está sujeita ao Marco Civil da Internet brasileiro, e o descumprimento de ordens judiciais, seja por falta de apelação ou acúmulo de multas, pode resultar em suspensões temporárias, como já ocorreu com o Telegram.
Debate reacende regulação
A polêmica reacende o debate acerca do PL 2630/21, que trata da regulação de redes sociais, as big tech, com atenção especial a empresas estrangeiras que atuam em território nacional de forma não regulada. O projeto de lei conhecido como PL das Fake News busca regular as redes sociais no Brasil com o objetivo de combater a desinformação e a publicação de conteúdos ilícitos.
O projeto prevê que as plataformas sejam responsáveis por remover conteúdos considerados ilícitos dentro de um prazo máximo de 24 horas após a determinação judicial. Além disso, exige que as plataformas sejam mais transparentes quanto às suas políticas de moderação de conteúdo e ao uso de algoritmos, obrigando-as a publicar relatórios periódicos sobre essas práticas.
Segundo João Brandt, secretário de Políticas Digitais da Secom, o governo federal não se esquiva do debate, pelo contrário. Tem promovido diálogo, encontros e é favorável ao que chama de “Arcabouço legal” que dê conta da legislação regulatória das plataformas em questão, mas admite que vê com mais entusiasmo o debate promovido no Congresso Nacional, onde o PL está estacionado – e pode ganhar tração agora.
Em abril, Lira criou um grupo para propor uma nova versão do PL das Fake News. O Grupo teria 40 dias para apresentar nova proposta, mas até hoje a discussão não avançou no Congresso, estacionou.
1ª Turma do STF confirma decisão de Moraes
Por unanimidade, a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) confirmou nesta segunda-feira (2) a decisão do ministro Alexandre de Moraes de suspender as operações da rede social X [antigo Twitter] no Brasil. A interrupção do serviço ocorreu na sexta-feira (30), após o proprietário da rede, Elon Musk, se recusar a nomear um representante legal da empresa no país, como exigido pela Constituição brasileira.
Moraes também estipulou uma multa diária de R$ 50 mil para pessoas e empresas que utilizarem “subterfúgios tecnológicos”, como VPNs, para continuar acessando a rede social, apesar da ordem judicial. A multa se aplica igualmente a quem tentar fraudar a decisão judicial por meio de tais ferramentas.
Durante a votação, Moraes destacou que a empresa demonstrou um comportamento reiterado de descumprimento de ordens judiciais no Brasil, com a intenção deliberada de se esquivar de suas responsabilidades legais. “Lamentavelmente, as condutas ilícitas foram reiteradas na presente investigação”, afirmou Moraes, mencionando o desaparecimento dos representantes legais da empresa no país.
Os demais ministros, incluindo Flávio Dino, Cristiano Zanin, Luiz Fux e Cármen Lúcia, acompanharam o voto de Moraes. Dino comparou a situação à de uma empresa privada que, alegando liberdade de locomoção, se recusaria a cumprir uma ordem judicial para interromper o tráfego em uma rodovia para capturar criminosos. Cármen Lúcia, por sua vez, ressaltou que o Brasil não pode ser um lugar onde “ideologias sem ideias de Justiça” prevaleçam.