Sanitarista e ex-presidente da Anvisa, Cláudio Maierovitch, elogiou reunião, aplaudiu a aprovação da CoronaVac e Oxford e avisou que os primeiros meses de 2021 serão ainda piores do que a metade de 2020
A reunião da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), realizada neste domingo (17), que aprovou o uso emergencial das vacinas CoronaVac e Oxford, foi aplaudida por Cláudio Maierovitch, médico sanitarista da Fiocruz Brasília e ex-presidente da Anvisa entre 2002 e 2008. “A Agência demonstrou competência e maturidade no seu critério. As análises foram feitas com muito cuidado e com a atenção para se pesar o risco de eventuais informações que estivessem faltando em relação ao benefício que a vacina poderá trazer, neste momento, tão especial, de emergência de saúde pública”, declarou.
Ex-presidente da Anvisa, Cláudio Maierovitch / Foto: Fiocruz
Logo após a aprovação das vacinas, a enfermeira Mônica Calazans, 54, foi a primeira brasileira imunizada com a vacina do Butantan contra a Covid-19 no País: CoronaVac. “Mulher, negra e com perfil de alto risco para complicações provocadas pelo coronavírus, não deixou de atuar nos hospitais da capital paulista para ajudar a salvar vidas”, afirma a imprensa. Mônica atua no Instituto de Infectologia Emílio Ribas, epicentro do combate ao coronavírus em São Paulo.
Distanciamento e tratamento precoce – Em entrevista ao Jornal Brasil Popular, Cláudio Maierovitch destacou a importância de o atual presidente da Anvisa, que, embora já tenha aparecido em eventos públicos e aglomerações com o Presidente da República, ter falado, para além da vacina, da importância das medidas de distanciamento.
“Também foi muito importante Meiruze Sousa Freitas, relatora do processo, ter destacado algo muito importante que é a inexistência de qualquer tratamento ou medicamento que deva ser dado precocemente a pessoas com Covid-19 ou que possam prevenir a Covid e que não sejam a vacina. A agência honrou a capacidade de seu corpo técnico e a sua autonomia institucional”, declarou o ex-presidente da Anvisa.
Ineditismo – Explicou que as vacinas contra a Covid-19 foram desenvolvidas num tempo, absolutamente, inédito na história. “São grandes avanços científicos, pois, em menos de um ano, foram obtidas vacinas eficazes e seguras para enfrentar a doença. O governo brasileiro saiu atrasado. Duas importantes instituições públicas tiveram a iniciativa de negociar compras de vacinas e a transferência de tecnologia, no caso, o Instituto Butantan e a Fundação Oswaldo Cruz”.
Negligência federal – Contudo, segundo ele, o governo federal não fez a sua parte, não negociou com outros fabricantes, como aconteceu com quase todos os países, notadamente, Chile, Canadá, EUA e países europeus. Dessa forma, ele considera que não adianta o Brasil ter um programa nacional de imunizações exemplar se a parte que os mandatários têm de fazer, no caso, o Presidente da República e o Ministro da Saúde, não for feita.
“Com isso, chegamos atrasados na disputa internacional por vacinas e, hoje, somos um país que começa tarde a vacinar. Felizmente, a Anvisa teve um tempo rápido, o Butantan e a Fiocruz foram ágeis com o seu trabalho e o Brasil começou a vacinação hoje”, disse.
Catástrofe – Maierovitch disse que as duas vacinas aprovadas pela Anvisa neste domingo demonstraram muita segurança em seus estudos, ou seja, elas não causam problemas, são semelhantes, no quesito da segurança, às melhores vacinas que do calendário de vacinação brasileiro. “E demonstraram uma eficácia que deve ser suficiente para que se consiga reduzir a transmissão do coronavírus do Brasil num momento em que vivemos uma catástrofe epidemiológica. A única solução que temos de imediato para esta catástrofe é a vacina”, alerta.
O médico disse ainda que, para além da vacina, “deveríamos também ter atitudes mais seguras, com a redução da mobilidade, o aumento do isolamento das pessoas e a restrição de várias atividades econômicas, especialmente, aquelas que reúnem pessoas, como bares, restaurantes e festas para conter o espalhamento do vírus”, adverte.
Segurança – As vacinas, segundo ele, se revelaram extremamente seguras ao longo de todos os estudos com milhares de pessoas. “Só foram observados problemas muito leves, como, por exemplo, dor no local em que a vacina foi aplicada ou um pouco de mal-estar, uma sensação de um pouquinho de indisposição no dia seguinte da vacina e, mesmo assim, com uma frequência muito pequena. A maior parte das pessoas que recebeu as vacinas não sentiu absolutamente nada. São vacinas muito seguras”, assegura.
Transmissão – O médico critica o governo federal e lembra que, desde de março de 2020, a pandemia atingiu muito duramente o Brasil. O País não teve nenhum plano federal para enfrentar a doença de forma que ela teve seu comportamento com velocidade máxima de transmissão do vírus. “Isso nem chegou a ser uma onda porque, quando começava a baixar de um nível inaceitável de mais de mil mortes por dia, ou seja, quando baixou para 500, 600 mortes por dia, que ainda eram níveis inaceitáveis, a frequência voltou a subir, como aconteceu com a chamada segunda onda na Europa e outros países”, declara.
Lockdown – E completa: “Agora, presenciamos uma velocidade enorme da transmissão do vírus. Provavelmente, esses primeiros meses de 2021 serão ainda piores do que aquilo que nós vivemos na metade de 2020. E muito pouco se está fazendo para conter essas ondas. Nós deveríamos restringir a circulação de pessoas, restringir atividades econômicas de forma que funcionasse somente aquilo que realmente é essencial, suspender qualquer tipo de reunião, eventos, atividades e, mesmo naquele que é o dia a dia, em que há necessidade de as pessoas saírem de casa, afirmar e reafirmar a necessidade de uso da máscara e da higienização frequente das mãos. Nada disso tem sido feito com a ênfase que deveria ter”.
Expertise – Maierovitch lembra que o Brasil é dono do maior programa público de imunização do mundo. “São cinco décadas de aperfeiçoamento desse programa de forma que conseguimos erradicar algumas doenças, chegamos a eliminar algumas outras, diminuímos muito a frequência de doenças que eram muito preocupantes para a nossa população. Infelizmente, nos últimos anos tem diminuído as coberturas vacinais. Isso se deve, em parte, à falta de investimento tanto naquilo que é a base de nosso Sistema Único de Saúde (SUS), que é a nossa atenção primária, os Centros de Saúde, Postos de Saúde e, especialmente, equipes de Saúde da Família e também deixamos de investir em comunicação”.
Confiança – Ele afirma que os programas de saúde pública funcionam quando há confiança da população no governo. “Infelizmente, durante esta epidemia do novo coronavírus, o governo federal tem dado seguidos motivos para a desconfiança. Para que as pessoas não saibam o que está acontecendo ou que elas acreditem em notícias falsas. O próprio Presidente da República já disse que era uma gripezinha, já disse que ia passar sozinha, já reagiu com expressões como “e daí”, “não sou coveiro”, como se ele não tivesse nada que ver com o que acontece no Brasil”.
Reflexão – Assim, este é um momento de uma reflexão importante porque todo mundo deve se unir para que o nosso programa de imunização funcione bem e para que as pessoas tenham certeza de que elas receberão vacinas seguras e que ajudarão a nossa população a superar essa pandemia e a reduzir esse sofrimento enorme que vivemos. Temos de deixar de lado nossas diferenças políticas e todas as lideranças devem convocar a população a comparecer para receber sua vacina.