O ministro Gilmar Mendes previu para “depois do Carnaval” o julgamento, na 2ª. Turma do Supremo, da qual é presidente, do recurso dos advogados de Lula que pede a suspeição de Sérgio Moro e, portanto, a anulação da sentença deste condenando Lula no caso do tríplex de Guarujá.
Pelo que vem dizendo há tempo e mais ainda pelo que disse na última sessão da turma, Gilmar está mais de convencido, está indignado com o comportamento, com as decisões e com a escandalosa parcialidade de Moro, e só tem adiado o julgamento desse recurso à espera de que as revelações da Vaza Jato e agora da operação Spoofing criem na maioria da turma o ambiente propício à absolvição de Lula por falta de provas.
Nessa última sessão cresceram as expectativas nesse sentido, porque a ministra Carmen Lúcia, que antes só votava contra Lula, votou agora a favor. Foi um voto exclusivamente técnico, reconhecendo que a defesa de Lula tinha o mesmo direito que o Ministério Público e a Polícia Federal de acesso ao conteúdo das conversas entre os procuradores e Moro reveladas pela Spoofing. Mesmo sendo exclusivamente técnico, esse voto desvendou uma mudança substancial na postura da ministra, que antes votava sistematicamente contra Lula, mesmo que contrariando as evidências técnicas.
Com sucessivos retardamentos no julgamento, Gilmar tenta claramente evitar a absolvição de Moro, que seria uma grande vitória póstuma da Lava Jato, cuja força-tarefa acaba de ser extinta pelo Procurador-Geral Augusto Aras. Por trás da Lava Jato, e já agora sem disfarce, atuam os piores interesses antibrasileiros, tanto interesses estrangeiros de caráter colonial quanto interesses nativos e reacionários que não querem saber de governos progressistas como o de Lula.
Foi a Lava Jato, com sua cobertura de mídia, que possibilitou o impeachment da Presidente Dilma, o afastamento de Lula da eleição de 2018 e a eleição do Bolsonaro. Essa cobertura deu grande apoio popular à Lava Jato e encobriu os verdadeiros problemas do país, a concentração de renda e da propriedade, a dependência econômica e a exclusão social.
O tempo, porém, a recessão econômica e a revelação dos abusos da Lava Jato fizeram com ela e com seu modelo político obscurantista aquilo que acontecera antes com o governo militar do golpe de 64, a decadência e afinal o colapso.
O reconhecimento da suspeição de Moro, hoje sócio de uma consultoria multinacional que opera nos escombros da devastação empresarial produzida pela Lava Jato, abrirá caminho para mais que a absolvição de Lula: permitirá que o Brasil comece a reconstruir, politicamente, economicamente e socialmente, o que ela demoliu.
Nos Estados Unidos, com o despejo de Trump da Casa Branca, começa a acontecer a mesma coisa. Trump e a Lava Jato foram subprodutos de um mesmo fenômeno ocorrido em escala planetária: a radicalização do neoliberalismo.
Não é sem consequências, como lembrou já em 2019 um relatório da Oxfam, a ONG ligada à Universidade de Oxford e dedicada ao estudo do problema na fome no mundo, que as 26 pessoas mais ricas do mundo tenham ganhos equivalentes aos 50% mais pobres. Ou seja, esses 50% mais pobres são 3,5 bilhões de seres humanos, 3,5 bilhões de uma população total de 7 bilhões do planeta, compartilhando o mesmo que o clube exclusivo dos 26 maiores bilionários.
De olho no mundo
Os vídeos exibidos pelos acusadores democratas, no debate sobre o impeachment de Trump no Senado dos Estados Unidos, mostram que a multidão de arruaceiros na invasão do Capitólio a 6 de janeiro chegou a menos de 30 metros de distância do então Vice-Presidente Mike Pence, enquanto este, ameaçado de morte por enforcamento, corria em busca de abrigo.
Um detalhe no vídeo não foi percebido por esses acusadores: ao lado do Vice estava um oficial da Força Aérea uniformizado e carregando a maleta negra que contém os códigos de lançamento de armas nucleares. Esses códigos são ativados automaticamente na maleta do Vice, caso o Presidente morra ou se torne incapacitando para o exercício de suas funções.
Por pouco os arruaceiros não chegaram a ter as mãos ao alcance desses códigos.
(*) José Augusto Ribeiro – Jornalista e escritor. Publicou a trilogia A era Vargas (2001); De Tiradentes a Tancredo, uma história das Constituições do Brasil (1987); Nossos Direitos na Nova Constituição (1988); e Curitíba, a Revolução Ecológica (1993). Em 1979, realizou, com Neila Tavares, o curta-metragem Agosto 24, sobre a morte do presidente Vargas.