Está passando da hora de se discutir a necessidade de Forças Armadas no Brasil… Forças armadas por quê? Para quê? Desde a luta do “Petróleo é nosso”, ficou claro, dentre outros absurdos, a presença nas Forças Armadas de um número absurdo de entreguistas… Tudo pago com recursos públicos. Excluída a estúpida e desnecessária guerra do Paraguai, quantas outras guerras e ameaças ocorreram de lá até hoje? Que país sul-americano tem ameaçado outro? Basta de Forças Armadas, a discussão de alternativas precisa ser feita urgentemente. No tempo da ditadura, o colunista Lourenço Diaféria (Folha de S. Paulo) foi cassado ao afirmar que “o povo urina nos heróis de pedestal” na crônica intitulada “HERÓI. MORTO. NÓS.” [Crônica publicada em 1º de setembro de 1977]
Texto do Observatório da Imprensa de 18 de setembro de 2008 revive esse momento da ditadura militar. “Naquela época, em pleno regime ditatorial, Lourenço Diaféria era o jornalista que havia desafiado os militares – e muitos assim fizeram – com a publicação da crônica ‘Herói. Morto. Nós’ em 1º de setembro de 1977, no jornal Folha de S.Paulo [ver o texto abaixo]. Esse fato resultou na sua prisão, além de seu enquadramento na LSN (Lei de Segurança Nacional), pois o conteúdo foi considerado ofensivo às Forças Armadas”, informa Franklin Valverde, em conteúdo divulgado no OI.
“[Nota da Redação: Depois da prisão de Diaféria, em protesto, a Folha publicou em branco sua coluna no caderno ‘Ilustrada’. Os militares subiram nas tamancas e o general Hugo Abreu, então ministro-chefe da Casa Militar do governo do general Ernesto Geisel, por telefone ameaçou o publisher da Folha, Octávio Frias de Oliveira, de fechar o jornal caso persistissem as críticas ao governo e a coluna continuasse a ser publicada em branco. Frias cedeu. E desse episódio resultou a saída de Cláudio Abramo da direção de Redação do jornal. Ver, neste Observatório, ‘Cláudio Abramo e a FSP – Quando a Folha se tornou a Folha‘ e as matérias correlatas, disponíveis à direita da página, (Luiz Egypto)]”
O texto tratava do heroísmo de um sargento que dera sua vida ao pular num poço de ariranhas para salvar um menino que lá havia caído. Em sua defesa ao ato do sargento, em certo momento Diaféria diz:
Neste texto foi mantida a grafia original da época
HERÓI. MORTO. NÓS.
Lourenço Diaféria
Não me venham com besteiras de dizer que herói não existe.
Passei metade do dia imaginando uma palavra menos desgastada para definir o gesto desse sargento Sílvio, que pulou no poço das ariranhas, para salvar o garoto de catorze anos, que estava sendo dilacerado pelos bichos. O garoto está salvo. O sargento morreu e está sendo enterrado em sua terra. Que nome devo dar a esse homem?
Escrevo com todas as letras: o sargento Silvio é um herói. Se não morreu na guerra, se não disparou nenhum tiro, se não foi enforcado, tanto melhor. Podem me explicar que esse tipo de heroísmo é resultado de uma total inconsciência do perigo. Pois quero que se lixem as explicações.
Para mim, o herói – como o santo – é aquele que vive sua vida até as últimas consequências.
O herói redime a humanidade à deriva. Esse sargento Silvio podia estar vivo da silva com seus quatro filhos e sua mulher. Acabaria capitão, major. Está morto. Um belíssimo sargento morto.
E todavia eu digo, com todas as letras: prefiro esse sargento herói ao Duque de Caxias. O Duque de Caxias é um homem a cavalo reduzido a uma estátua. Aquela espada que o Duque ergue ao ar aqui na Praça Princesa Isabel – onde se reúnem os ciganos e as pombas do entardecer – oxidou-se no coração do povo.
O povo está cansado de espadas e de cavalos. O povo urina nos heróis de pedestal. Ao povo desgosta o herói de bronze, irretocável e irretorquível, como as enfadonhas lições repetidas por cansadas professoras que não acreditam no que mandam decorar. O povo quer o herói sargento que seja como ele: povo. Um sargento que dê as mãos aos filhos e à mulher, e passeie incógnito e desfardado, sem divisas, entre seus irmãos.
No instante em que o sargento – apesar do grito de perigo e de alerta de sua mulher- salta no fosso das simpáticas e ferozes ariranhas para salvar da morte o garoto que não era seu, ele está ensinando a este país, de heróis estáticos e fundidos em metal, que todos somos responsáveis pelos espinhos que machucam o couro de todos.
Esse sargento não é do grupo do cambalacho. Esse sargento não pensou se, para ser honesto para consigo mesmo, um cidadão deve ser civil ou militar. Duvido, e faço pouco, que esse pobre sargento morto fez revoluções de bar, na base do uísque e da farolagem, e duvido que em algum instante ele imaginou que apareceria na primeira página dos jornais.
É apenas um homem que – como disse quando pressentiu as suas últimas quarenta e oito horas, quando pressentiu o roteiro de sua última viagem – não podia permanecer insensível diante de uma criança sem defesa.
O povo prefere esses heróis: de carne e sangue.
Mas, como sempre, o herói é reconhecido depois, muito depois. Tarde demais.
É isso, sargento: nestes tempos cruéis e embotados, a gente não teve o instante de te reconhecer entre o povo. A gente não distinguiu teu rosto na multidão. Éramos irmãos, e só descobrimos isso agora, quando o sangue verte, e quanto te enterramos. O herói e o santo é o que derrama seu sangue. Esse é o preço que deles cobramos.
Podíamos ter estendido nossas mãos e te arrancado do fosso das ariranhas – como você tirou o menino de catorze anos – mas queríamos que alguém fizesse o gesto de solidariedade em nosso lugar.
Sempre é assim: o herói e o santo é o que estende as mãos.
E este é o nosso grande remorso: o de fazer as coisas urgentes e inadiáveis – tarde demais.
Crônica publicada na Folha de S. Paulo, p. 44, em 1º de setembro de 1977. Obore
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