Diante do silêncio do tenente-coronel Mauro Cid no depoimento que prestaria à Polícia Federal sobre a falsificação de registros de vacinação de Bolsonaro e sua filha, a defesa deste comemorou e seu ex-Secretário de Comunicação e atual advogado Fábio Weingartner disse considerar “tecnicamente perfeita” a orientação do advogado de Cid, por ainda não ter tido acesso ao conteúdo do celular de Cid e em outros itens apreendidos em sua casa.
Entende-se que Weingarten se mostre otimista, mas Cid não terá antecipado a seus advogados o que a perícia pode revelar sobre o conteúdo do celular e sobre a origem de um desses outros itens, os 35 mil dólares descobertos num cofre?
om muito mais credibilidade, a jornalista Andreia Sadi, da GloboNews, ouviu pessoas no entorno de Bolsonaro e revelou estarem elas preocupadas com a postura do ex-ajudante de ordens:
— Eles acreditam que o silêncio pode significar que houve uma mudança de rota e que Cid pode estar cogitando fazer uma delação premiada – sinal que se soma ao fato de Bernardo Fenelon, especialista nesse tipo de colaboração, ter sido nomeado para fazer sua defesa após a saída de Rodrigo Roca, ligado à família Bolsonaro.
Objetivamente o que existe, em primeiro lugar, é Bolsonaro dizendo que nada teve a ver com a falsificação e que, se Cid a promoveu, não foi nem com sua autorização nem com seu consentimento; e, dois dias depois, Cid calado, nem assumindo a responsabilidade pela falsificação, nem alegando que cumpria ordens ou que o chefe teve conhecimento do que era feito.
Weingarten, cuidando mais da versão que dos fatos, pode ter considerado tecnicamente perfeita a conduta de Cid, mas Bolsonaro teve pouco depois outra reação. A pretexto de visitar o gabinete do filho 01, Flávio, o senador, ele esteve no Senado, sabendo que com certeza seria abordado pelos jornalistas. Quando isso aconteceu, Bolsonaro, visivelmente contrariado e de fisionomia mais zangada que habitualmente, respondeu:
— O que eu vi agora no rodapé de uma TV é que ele ficou em silêncio. Isso é ele com o advogado dele.
E acrescentou:
— Cada um segue a sua vida.
(Na sexta-feira, a mulher de Cid, Gabriela, admitiu à Polícia Federal, segundo fonte da investigação citada pelo Globo, que usou certificado de vacinação falso e afirmou que a responsabilidade pela inserção dos dados falsos foi de seu marido. Com essas declarações, naturalmente a conselho dos advogados de defesa, ela procurou isentar-se de qualquer responsabilidade na falsificação e reduzir seu envolvimento no caso ao uso de um cartão falso. Em nada parecem piorar a situação do marido, nem melhorar a de Bolsonaro.)
DECEPCIONADO COM CID, FURIOSO COM PAULO GUEDES
Decepcionado com Mauro Cid, Bolsonaro está furioso com seu ex-Ministro da Economia Paulo Guedes, que o convenceu a não baixar o preço do gás de cozinha, agora reduzido em 20% por Lula.
Segundo o jornal O Dia, do Rio, Bolsonaro reclamou por Guedes tê-lo convencido a manter os aumentos sucessivos que vinham sendo praticados e com certeza o prejudicaram muito em sua tentativa de reeleição em 2022. Agora a redução tão acentuada do preço prejudica-o ainda mais e beneficia Lula politicamente.
Pelos termos da reclamação, teria ficado claro que Bolsonaro, furioso por Lula ter podido cumprir em tão pouco tempo sua promessa sobre o gás, sentiu-se enganado por Guedes e cobrou satisfações.
O que convenceu Bolsonaro, segundo O Dia, a parar de pressionar pelo corte no preço do gás de cozinha em 2022 foi uma frase de Guedes:
— Não dá para agradar pobre a toda hora. Se você agrada pobre, desagrada o rico e quem manda no país é o rico.
A reportagem diz ainda que a conversa foi muito exaltada “e os ânimos entre os dois ficaram acirrados”:
— O Paulo não gostou de ser questionado como se ainda fosse empregado do ex-presidente e respondeu à altura.
270 MILHÕES PARA A DOAÇÃO DE BOTIJÕES DE GÁS
Outra notícia que vai incomodar Bolsonaro é que o Tribunal de Contas da União iniciou investigações sobre um programa social da Petrobrás que no ano eleitoral de 2022, no governo Bolsonaro, alocou 270 milhões de reais para a doação de botijões de gás de cozinha e cestas básicas a famílias em situação de vulnerabilidade.
Enquanto permitia a constante alta nos preços do gás de cozinha, Bolsonaro se permitia pagar com dinheiro da Petrobrás a compra de botijões que doava a eleitores pobres. Em 2022, o valor gasto nesse programa foi nove vezes maior do que o de 2021: dos 300 milhões totais, apenas 30 milhões foram utilizados em 2021 e todo o restante, 270 milhões ficou para o ano da eleição presidencial.
(*) Por José Augusto Ribeiro – jornalista e escritor. Publicou a trilogia A Era Vargas (2001); De Tiradentes a Tancredo, uma história das Constituições do Brasil (1987); Nossos Direitos na Nova Constituição (1988); e Curitiba, a Revolução Ecológica (1993); A História da Petrobrás (2023). Em 1979, realizou, com Neila Tavares, o curta-metragem Agosto 24, sobre a morte do presidente Vargas.
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