Reflexões sobre a esperança e a transformação social através do pensamento de grandes humanistas como Darcy Ribeiro. Por Isaac Roitman
A história nos mostra que os sistemas sociais, econômicos e políticos sofrem transformações. As articulações, muitas vezes nefastas e sem transparência, feitas nos bastidores dos poderes, certamente contribuem para os retrocessos da sociedade humana. É o que testemunhamos atualmente no planeta e no Brasil: um planeta que caminha para a desolação e para a extinção da vida, uma pandemia de violência, uma descrença no mundo político e judiciário, uma indecente justiça social e o sofrimento e a morte de civis inocentes.
No passado, tivemos grandes pensadores que indicaram caminhos para sairmos de um cenário de selvageria e conquistarmos um estágio de civilização plena. Esses seres iluminados, como o Sol, criaram o Humanismo, onde o ser humano é colocado no centro das preocupações sociais e intelectuais. Podemos citar entre eles Confúcio, Sócrates, Descartes, Spinoza, Voltaire, Rousseau, Kant, Hegel, Nietzsche, Ortega y Gasset, Sartre e Hannah Arendt. Muitos contribuíram através da literatura, entre eles Miguel de Cervantes, William Shakespeare e Luís de Camões.
Apesar das mensagens de sabedoria dos nossos antepassados, eles são relembrados somente em círculos intelectuais e acadêmicos restritos. É importante tirar essas ideias de debaixo do tapete, democratizar e aplicar esses ensinamentos. É absolutamente fundamental que não percamos a esperança de que as transformações necessárias serão concretizadas.
A esperança é um sentimento poderoso que nos impulsiona a acreditar em um futuro melhor. É a crença de que coisas boas estão por vir, mesmo quando estamos enfrentando desafios e dificuldades. A esperança nos dá força para continuar lutando, nos motiva a persistir diante das adversidades e nos ajuda a manter a fé em dias melhores. Além disso, a esperança também pode ser vista como uma forma de resistência diante das adversidades. É a capacidade de encontrar luz mesmo nas situações mais sombrias, de acreditar que é possível superar os obstáculos e encontrar soluções para os problemas.
Certamente vamos superar as atuais crises éticas, morais, políticas, da educação, da ciência e tecnologia, da saúde, econômicas e outras. Para entender a identidade brasileira e projetar nosso futuro, vamos nos inspirar nas ideias de nosso saudoso Darcy Ribeiro. Em seu livro O processo civilizatório, publicado em 1972, ele enfatizou a evolução das sociedades humanas procurando entender de forma coerente a evolução da humanidade. Em seu livro O povo brasileiro, publicado em 1995, ele trata das matrizes culturais e dos mecanismos de formação étnica e cultural do povo brasileiro.
Nessas reflexões, ele nos remete às nossas origens, à história que, como brasileiros, fomos construindo. Ele procurou entender os caminhos que percorremos que nos levaram a distâncias sociais tão profundas no processo de formação nacional. Nesse livro, ele assim se expressa: “Faço política e faço ciência movido por razões éticas e por um fundo patriotismo.” Ele denuncia o descaso dos setores retrógrados das classes dominantes pelo povo e pela nação. Ele defende a reordenação social do país sem convulsão social, através de um reformismo democrático.
Mas, conhecendo o caráter da classe dominante brasileira, e ao contrário daqueles que temem a revolução, ele pensa também que essa mudança pacífica “é muitíssimo improvável neste país em que uns poucos milhares de grandes proprietários podem açambarcar a maior parte de seu território, compelindo milhões de trabalhadores a se urbanizarem para viver a vida famélica das favelas, por força da manutenção de umas velhas leis”.
Os desafios são grandes. Ideias inspirativas não faltam. Lembremos uma de Darcy Ribeiro: “Só há duas opções nesta vida: se resignar ou indignar. E eu não vou me resignar nunca.” Vamos todos lutar pelas conquistas dos sonhos e esperanças de Darcy e todos os humanistas.
(*) Por Isaac Roitman, professor emérito da Universidade de Brasília, pesquisador emérito do CNPq, membro da Academia Brasileira de Ciências e do Movimento 2022 – 2030 o Brasil e o Mundo que queremos.