Relator da ONU sobre Verdade, Justiça e Reparação, Fabian Salvioli, fala sobre a decisão do governo Lula de não marcar os 60 anos do golpe militar
O relator da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre Verdade, Justiça e Reparação, Fabian Salvioli, afirmou que a decisão do governo Lula (PT) de vetar comemorações oficiais em memória das vítimas do golpe militar de 1964, que completa 60 anos no próximo dia 31 de março, revela que a ditadura ainda não foi superada no Brasil.
Questionado pelo jornalista Jamil Chade, em entrevista publicada no Uol, sobre aqueles que afirmam que Brasil não deve olhar o passado e que devemos olhar para os desafios atuais, o especialista deixa claro que é “um erro pensar que, por ter ocorrido há 60 anos, o golpe não deve ser lembrado“.
Relator do tema na ONU há seis anos, Salvioli declarou que ficou surpreso diante da determinação do presidente Lula, uma vez que o silêncio significa o abandono e a revitimazação das vítimas da repressão, algo que o estado “nunca” poderia fazer.
“Há uma intenção clara de não querer se abordar determinados fatos. Quando alguém diz que não quer fazer barulho ou molestar, o que isso quer dizer é que não se quer molestar aos perpetradores. O problema é que, assim, se molesta a quem já foi vítima e voltam a ser vítimas“, afirmou o especialista.
A decisão de Lula foi vista como um aceno aos militares, irritados com o avanço das investigações sobre o atentado à democracia em 8 de Janeiro. Salvioli pontou que seria “muito grave” se tal decisão for parte de uma “chantagem das Forças Armadas“.
“Talvez, pela particular situação que atravessa o Brasil, entendo que o governo não tenha hoje a liberdade para fazer o que é devido. E isso é muito grave. Se ele obedece à chantagem das Forças Armadas, seria algo muito grave. Governos não podem funcionar sob chantagem das Forças Armadas“, disse.
O processo de memória é um valor em si mesmo
Questionado sobre a importância de marcar datas como os 60 anos do golpe, Salvioli explicou também que as comemorações tem grande valor em termos de memória coletiva, “para recordar o que ocorreu, para prestar as devidas homenagens para as vítimas dessas aberrações. E para dar um sinal de que, da parte do Estado, há uma condenação. E que é uma condenação permanente a essa questão“.
“Ninguém ousaria dizer que devemos deixar de marcar o dia das vítimas do Holocausto. E isso ocorreu há mais tempo. Quando os países atravessam esse tipo de questões, é muito importante sinalizar as coisas como elas são. E isso deveria ser uma política de estado“, declarou.
O relator da ONU ressaltou ainda que “o processo de memória é um valor em si mesmo. Não pelo que ocorreu no passado. É um valor para a construção de uma democracia forte e saudável para o futuro“.
https://jornalggn.com.br/ditadura/lula-esta-equivocado-em-virar-a-pagina-de-1964-diz-genoino-ao-ggn/
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