Uma pergunta que ainda nem começou a ser feita, quanto mais respondida, é: quem fez chegar ao New York Times o caprichadíssimo vídeo de Bolsonaro na Embaixada da Hungria em Brasília? Mais importante que o vídeo, a informação de que ele passou dois dias hospedado lá durante o Carnaval também foi divulgada.
A notícia e o vídeo foram publicados bem próximo ao desfecho do caso Marielle. Esse caso favoreceu muito o governo Lula por tê-lo resolvido e prejudicou o governo Bolsonaro, já que este impediu por quatro anos que a Polícia Federal entrasse nas investigações e o resolvesse.
A revelação do nome dos mandantes e sua prisão foi, de certo modo, decepcionante para quem esperava algo absolutamente novo. Em alguns casos, esperava-se até algum nome muito ligado aos Bolsonaro ou até mesmo um Bolsonaro como mandante. “Mas são só eles?” – perguntaria alguém que considerasse os irmãos Brazão como possíveis mandantes.
Nesse momento, os bolsonaristas comemoravam o fato de todos os Bolsonaros estarem finalmente fora de suspeita. Bolsonaro voltou às manchetes com o vídeo publicado pelo New York Times. Enquanto se questionava por que ele passou dois dias “hospedado” na embaixada, não se prestou atenção ao fato de que o vídeo só poderia ter saído do sistema de segurança da embaixada com o consentimento dela ou por sua iniciativa.
Também não se considerou o fato de que a embaixada não entregaria o vídeo a nenhum repórter curioso do “Fantástico”, mas apenas a alguém de confiança dos Bolsonaro. Quem sabe o filho 02, Carluxo, do gabinete do ódio, que sabidamente visitou o pai na embaixada?
Do Brasil, o vídeo foi parar nos Estados Unidos, na redação do New York Times. Por que lá e não no Brasil, na TV Globo, na TV Bandeirantes ou na Folha de S. Paulo? Simplesmente porque no Brasil seria muito mais difícil encobrir que o vídeo, na verdade, era uma peça de propaganda plantada na mídia como notícia.
Bolsonaro reagiu irônico e sorridente à divulgação do vídeo. “É crime – perguntou – dormir numa embaixada?” Crime não era, mas era desconcertante. Já seria desconcertante uma visita convencional, mas em pleno Carnaval, à embaixada de um país governado por um aliado de extrema-direita de Bolsonaro, levanta a questão: por que não um encontro reservado com o embaixador ou com algum emissário enviado de Budapeste pelo primeiro-ministro Orbán?
Talvez porque, no mundo das fake news, uma jogada de reality show de vez em quando seja um bom recurso de luta política e domínio da narrativa – e quanto mais desconcertante e surrealista, melhor.
Como preconiza e pratica o guru internacional da extrema-direita, Steve Bannon, mais importante que o resultado é o movimento. Bolsonaro já preparava, caso seu passaporte fosse liberado, um novo movimento, uma nova jogada de reality show – uma viagem a Israel, a convite de Netanyahu, possivelmente sugerida pelo próprio Steve Bannon. O que levanta outra pergunta: aproveitando a oportunidade, Bolsonaro não iria também confraternizar com as tropas de Netanyahu em operação na Faixa de Gaza?
(*) Por José Augusto Ribeiro – jornalista e escritor, é colunista do Jornal Brasil Popular com a coluna semanal “De olho no mundo”. Publicou a trilogia A Era Vargas (2001); De Tiradentes a Tancredo, uma história das Constituições do Brasil (1987); Nossos Direitos na Nova Constituição (1988); e Curitiba, a Revolução Ecológica (1993); A História da Petrobrás (2023). Em 1979, realizou, com Neila Tavares, o curta-metragem Agosto 24, sobre a morte do presidente Vargas.