Aprendendo com os campos de batalhas modernos, desde o palco ucraniano aos conflitos no Oriente Médio, criminosos têm cada vez mais empregado drones civis convertidos para uso militar. Ouvidos pela Sputnik Brasil, especialistas destacam o desafio que essa nova tecnologia traz para as forças de segurança.
Na zona de operação especial russa, um aclamado tanque Abrams norte-americano — cujo valor pode chegar à casa das dezenas de milhões de dólares —, é facilmente abatido por um drone russo Lancet, produzido por cerca de US$ 30 mil (aproximadamente R$ 160 mil na conversão atual).
A disparidade de custo e capacidade de destruição de ambos os equipamentos chamou a atenção não só de observadores militares e de forças armadas ao redor do mundo, mas também do crime organizado, que cada vez mais utiliza drones para suas atividades, desde a vigilância do território e tráfico de drogas à eliminação de rivais.
No geral, os drones usados pelo mundo do crime são convertidos de modelos para uso recreativo ou comercial, sendo modificados para portar armas de fogo, câmeras de alta resolução, visão noturna e aumentar a capacidade de carga, explica Tatiana Garcia, especialista em geopolítica e defesa e pesquisadora associada ao Instituto Sul-Americano de Política e Estratégia (ISAPE).
“O uso de drones civis convertidos para fins militares por organizações criminosas é uma tendência crescente que representa um sério desafio para as forças de segurança”, disse ela em declarações à Sputnik Brasil.
Há anos, no México, por exemplo, os cartéis têm utilizado esses equipamentos para transportar drogas pela fronteira com os Estados Unidos, de maneira que sejam contornadas rotas tradicionais e reduzindo o risco de apreensão.
“Drones também têm sido usados para contrabandear itens para prisões ao redor do mundo”, diz Garcia. “Em 2017, um drone foi utilizado para entregar celulares, drogas e serras a prisioneiros em uma penitenciária em Londres.”
Em um caso ainda mais sério, em 2018, o presidente venezuelano, Nicolás Maduro, sofreu um atentado contra sua vida durante um desfile militar em Caracas. Dois drones carregados com explosivos conseguiram se aproximar do palco onde o líder da Venezuela estava discursando, mas falharam em atingir o chefe de Estado.
“O episódio destacou o potencial dos drones para serem usados como armas por criminosos ou insurgentes.”
No Brasil, facções criminosas têm utilizado esses aparelhos para monitorar as operações policiais nas favelas e até como armas improvisadas. Em julho, um drone foi utilizado por uma quadrilha de traficantes para carregar uma granada até o território de outro grupo.
Para Robson Rodrigues, antropólogo, pesquisador do Laboratório de Análise da Violência (LAV) da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e coronel da reserva da Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro (PMERJ), “não é nenhuma novidade o uso de tecnologia como meio de obter uma vantagem tática”.
“Eles vão usar tudo que eles puderem usar para pender essa balança para o seu lado.”
Assim que as câmeras de vigilância civis começaram a se popularizar, lembra o pesquisador, o crime organizado as instalou em seus territórios para se antecipar de possíveis invasões e incursões das forças de segurança.
No entanto, essa utilização de drones é classificada como “simplória” por Rodrigues quando comparada aos usos encontrados por megatraficantes internacionais, como cartéis, para esses equipamentos. “O ‘varejo’ os utiliza muito mais para manter território.”
“É claro que eles não terão o nível de sofisticação que têm os megatraficantes internacionais, como o caso dos cartéis, que investiam pesado em tecnologia e contavam até mesmo com submarinos não tripulados para transportar drogas.”
Mas foi com pequenos investimentos em tecnologia que essas organizações criminosas chegaram a onde estão hoje. “É um fator para se preocupar, mas não acho que seria o caso aqui ainda. Quem tem que responder isso é a inteligência policial.”
Segundo ambos os especialistas consultados, o investimento em drones acaba por alterar a balança de poderio bélico entre as polícias e as facções uma vez que as permite ter uma visão aérea de seu território, algo que antes era reservado aos helicópteros policiais.
“Isso torna as operações policiais mais perigosas e menos eficazes”, destaca Garcia.
Para o ex-coronel da PM, o que mais espanta é que o uso de drones pelas forças policiais ainda é muito incipiente. “A tecnologia, legal, regulada, já está à disposição das forças de segurança já há um tempo […] Poderíamos estar fazendo o patrulhamento sem o risco de estarmos com os helicópteros.”
Em vez disso, a polícia ainda insiste no uso dos helicópteros para o patrulhamento aéreo, lamenta Rodrigues. Não só o veículo demanda maiores gastos como combustível e seguro, como oferece um maior risco à população civil e à vida do policial.
“Não só uma vez já tivemos helicópteros abatidos. Essa opção é anacrônica.”
Fonte: Sputnik Brasil
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