No meio da semana, uma pesquisa colocou Pablo Marçal, um candidato com ficha sujíssima, em primeiro lugar na disputa pela Prefeitura de São Paulo. Com 25,2% das preferências, contra 23,3% de Guilherme Boulos e 17,9% de Ricardo Nunes, o atual prefeito do MDB, apoiado oficialmente pelo PL, o partido de Bolsonaro.
Foi um empate técnico, dentro da margem de erro, e essa pesquisa podia não ser muito confiável, já que foi produzida por um instituto, Futura Inteligência, que não é tão conhecido quanto o Datafolha, por exemplo. Logo, ficou em contraste com a pesquisa seguinte, da Quest, que recolocava Boulos em primeiro lugar, com Marçal em segundo, com os números agora invertidos: 25% para Boulos e 23% para Marçal.
Marçal, portanto, está bem perto do segundo turno, e sua campanha torna ainda mais suja uma ficha de antecedentes que inclui golpes financeiros pela internet, comparáveis aos antigos e plebeus contos do vigário.
Comparável à campanha sujíssima de Donald Trump contra Kamala Harris nos Estados Unidos, a de Marçal atraiu, em seguida a essas pesquisas, a atenção do filho 02 de Bolsonaro, Carluxo, que andava sumido. Tiveram um encontro “muito simpático e bacana”, segundo Carluxo. Um encontro que, segundo se noticiou, terá como resultado o eleitorado bolsonarista ser desviado de Nunes para Marçal, embora com Bolsonaro pai fingindo que continua fiel ao candidato oficial de seu partido.
Toda essa situação pode parecer um caso vergonhoso de piora nos sinais dos tempos na maior cidade do Brasil e ainda é agravada pela suspeita, segundo O Globo, de uso de recursos não declarados “para remunerar influenciadores” e pela criação de contas alternativas nas redes sociais para driblar proibições legais e judiciais.
Esse envolvimento de Marçal com o submundo da internet tem conexões orgulhosamente confessadas com seu guru, o britânico Andrew Tate, processado criminalmente na Romênia por acusações que incluem até o tráfico internacional de pessoas.
Com essa ficha, Marçal já é, objetivamente, instrumento da crescente mobilização política de Elon Musk no plano internacional. A prioridade de Musk no momento é a eleição presidencial dos Estados Unidos, mas, no continente americano, se estende pelo menos ao Brasil, onde ele perdeu os serviços que Bolsonaro lhe prestava no governo, e à Argentina, onde ganhou os do governo Milei.
Marçal foi um grande achado para a articulação da extrema-direita, que, com ele, tenta fazer da eleição em São Paulo uma espécie de terceiro turno da eleição de Lula há dois anos e, assim, uma nova plataforma de combate a seu governo.
Para além da eleição municipal deste ano, fica a questão da ameaça à democracia e aos valores fundamentais do processo civilizatório, resultante do controle de tecnologias tão perigosas quanto poderosas por pessoas como Musk, dispostas a transformar em líder político o primeiro vigarista vulgar que lhes passe pela frente.
(*) Por José Augusto Ribeiro – jornalista e escritor, é colunista do Jornal Brasil Popular com a coluna semanal “De olho no mundo”. Publicou a trilogia A Era Vargas (2001); De Tiradentes a Tancredo, uma história das Constituições do Brasil (1987); Nossos Direitos na Nova Constituição (1988); e Curitiba, a Revolução Ecológica (1993); A História da Petrobrás (2023). Em 1979, realizou, com Neila Tavares, o curta-metragem Agosto 24, sobre a morte do presidente Vargas.