Se fizermos um recorrido integeracional e perguntarmos o que se aprendeu sobre os indígenas nas escolas será uma repetição de chavões.
Se pensarmos em nosso dia a dia, indígenas frequentem noticiários no dia 19 de abril, quando ainda se fala em “dia do índio”, sendo que aos poucos se fala em “indígenas” e “povos originários”. Ou quando o mundo fica perplexo sobre a situação de extermínio do povo ianomâmi, em 2023, no início do governo Lula.
Quem se lembra de Raoni entrando no espaço da Assembleia Nacional Constituinte com seus guerreiros para reivindicar direitos?
É mais presente sua figura depois que subiu a rampa do Palácio na posse do Presidente Lula.
Quem aprendeu ou escutou algo sobre os “tikunas” que mantém sua língua e não falam nosso português?
Aqui, no Rio Grande do Sul, muitos ainda falam nos “bugres”. Tal qual os negros há no Brasil esquecimentos e apagamentos. Em Caxias do Sul, editado com verba pública, encontramos um livro que omite o nome original desta cidade da Serra que era “Campos dos Bugres”.
Como está a situação indígena em sua cidade?
Muitas pessoas nem sabem dos seus indígenas tal a invisibilidade em torno de nossos irmãos que eram “donos da terra brasilis”.
Numa capital importante como Porto Alegre eles frequentam calçadas como esmoleiros, com crianças descalças, pedindo um “troquinho”. Ou aparecem aos borbotões na véspera da Páscoa, para vender cestos.
Mesmo que esta “locus” originalmente não tenha tido uma quantidade tão grande de povos originários, eles existiam, eram mais intensos na antiga Várzea do Gravataí, ao lado do que é Porto Alegre atualmente.
Temos um símbolo forte aqui que nos marca é uma estátua que lembra o mito da índia Obirici.
Para mostrar ao país, lançamos mão de um pedido feito ao historiador Adílio Almeida que passou ao Jornal Brasil Popular um apanhado do tema em Porto Alegre.
Adílio Almeida faz parte do Instituto Apakani uma entidade ativa nos temas do combate ao racismo e na defesa dos povos indígenas.
https://www.instagram.com/instituto_apakani/
(Adeli Sell, da redação do Rio Grande do Sul).
AVALIAÇÃO DA SITUAÇÃO INDÍGENA
ADILIO ALMEIDA (*)
O Instituto APAKANI, avalia neste contexto que na região metropolitana de Porto Alegre, assim como em outras partes do Brasil, tem sido marcada por desafios relacionados a direitos territoriais, inclusão social e reconhecimento cultural. Muitas comunidades indígenas na região enfrentam problemas de desapropriação de terras, desigualdade social e falta de orientações jurídicas que lhes possibilitem o uso de ferramentas e dispositivos legais os quais possam se utilizar na defesa de seus interesses e direitos, legalmente reconhecidos na CF de 1988, bem como demais leis fundamentais criadas para sua proteção, reconhecimento e desenvolvimento como Povos Originários.
Nos últimos anos, houve um aumento nas mobilizações e na busca pela visibilidade das questões indígenas, tanto por parte das próprias comunidades quanto de organizações que as apoiam.
Além disso, eventos, encontros e atividades culturais têm sido realizados para promover a pesquisa, o reconhecimento e o diálogo entre as comunidades indígenas e a sociedade em geral. A resistência e a luta por direitos ainda são centrais. No entanto nas questões de pesquisas Universitárias, nas áreas, sociais, culturais e da biomedicina, o comportamento de muitos campos de pesquisa tem originado um fator predatório e por vezes exploratório, dos meios tecnológicos e culturais, que geram projetos e verbas especificas que nem sempre abrangem de forma ampla, individual ou coletiva o reconhecimento dos dados e das técnicas, avaliadas e aprimoradas, através dos respectivos órgãos e entidades envolvidas; Pois muitas vezes são citados os espaços de coleta de dados e imagens, deixando de serem elaborados os devidos registros de marcas, patentes ou autorizações legais para divulgação do trabalho desenvolvido, e a ser aprimorado cientificamente, sem o devido reconhecimento de seus autores.
O Instituto APAKANI, reconhece como essenciais as pesquisas, os trabalhos acadêmicos ou de desenvolvimento tecnológico de todos saberes indígenas, no entanto também salienta que o resultado destas pesquisas são essenciais para o fortalecimento da cultura de cada povo Indígena e desta forma, os produtos resultantes deste trabalho, originando ganhos culturais, ou valores econômicos, deve legalmente compartilhar com as comunidades os lucros obtidos durante e após a finalização de cada pesquisa o que certamente de alguma forma ira ocorrer um processo de geração de emprego e renda através do pagamento de Royalties que são pagamentos periódicos feitos a uma pessoa ou empresa que concede o uso ou comercialização de algo que detém direitos exclusivos.
Os pagamentos podem ser feitos em troca do uso de propriedades intelectuais, como direitos autorais, patentes, marcas registradas ou tecnologias. Também podem ser pagos por empresas que produzem petróleo e gás natural, como uma compensação financeira para os estados, DF e municípios beneficiários.
Os royalties são geralmente calculados como uma porcentagem das receitas geradas pela utilização dos direitos.
No Brasil, a Lei 9.478/1997 garante que a extração do petróleo pague royalties ao governo do estado produtor. No entanto em vários locais onde ocorrem as demarcações de terras Indígenas, os royalties não são repassados pelos governos às comunidades indígenas locais. Por vezes o repasse não corresponde ao valor real devido como compensação ambiental. No Rio Grande do Sul, temos as tubulações de GLP que atravessam territórios indígenas não originando indenização ou dividendos às comunidades envolvidas.
É necessário exigir o cumprimento integral dos direitos estabelecidos na Convenção 169 da OIT, incluindo o direito à consulta prévia, livre e informada dos povos indígenas em todas as decisões que afetem seus territórios, garantindo assim a sua integridade e autonomia.
Para uma análise mais atualizada e específica, pode ser interessante consultar relatórios de organizações que atuam na defesa dos direitos indígenas ou acompanhar notícias regionais, desta forma além das constatações em campo, vivenciada nos diálogos com representantes indígenas, como o Cacique José Cirilo, Mbya Guarani, Cacique Samuel, Kaingang e Cacica Aquab, Charrua.
Segundo informações do Conselho de Missão entre Povos Indígenas (COMIN) – um órgão que assessora e coordena trabalhos junto aos povos indígenas – temos os seguintes mapas de conflito:
1. _os Guarani Mbya compartilham com os demais povos as seguintes questões:
Territorialidade: as aldeias, como a Anhetenguá, enfrentam problemas com a demarcação de terras e ameaças de empreendimentos imobiliários que impactam o território ancestral e o meio ambiente, prejudicando o modo de vida tradicional.
Condições Sociais: essas comunidades sofrem com a precariedade no acesso a serviços básicos como saúde e educação adaptadas à cultura indígena. A luta pelo reconhecimento de seus direitos culturais e sociais é constante.
2. Kaingang
Urbanização e Vulnerabilidade: a aldeia no Morro do Osso é uma das mais conhecidas, mas enfrenta falta de políticas públicas para sustentar as demandas de moradia, saneamento e infraestrutura.
Educação e Sustento: apesar de esforços para resgatar tradições, as oportunidades econômicas, como o artesanato, não suprem as necessidades de sobrevivência. Enchentes recentes também agravam a insegurança habitacional
3. Charrua
Reconhecimento Cultural: Este povo luta pela preservação de sua identidade e reconhecimento de direitos enquanto comunidade originária, uma vez que sua presença histórica no RS é muitas vezes negligenciada.
Infraestrutura Precária: a aldeia Cacique Polidoro carece de investimentos em saúde, educação e inclusão econômica para superar o histórico de marginalização.
Instituto APAKANI
Resumo das questões comuns e desafios e perspectivas:
a. Demarcação e Uso de Terras: a regularização das terras é um problema crucial, sendo que muitas áreas ocupadas por esses povos são inadequadas ou estão em disputa.
b. Impactos Ambientais e Urbanísticos: a pressão por desenvolvimento urbano ameaça a sustentabilidade ambiental das aldeias, comprometendo recursos naturais essenciais para sua sobrevivência.
c. Os recursos governamentais destinados a pesquisas em territórios Indígenas deveriam obrigatoriamente conter em todos eles verba especifica que beneficiassem os representantes bem como a comunidade objeto de pesquisa, uma vez que coletar uma cultura ou técnica milenar sem o devido pagamento é uma usurpação de seus bens materiais e imateriais.
d. Apoio Emergencial: eventos como enchentes frequentemente impactam severamente essas comunidades, aumentando a necessidade de suporte emergencial, como alimentos, materiais de construção e roupas.
e. Fortalecimento Cultural e Politicas de Geração de emprego e renda com políticas públicas que valorizem à autodeterminação desses povos é essencial para superar essas dificuldades. Ações integradas entre sociedade, governo e entidades civis podem contribuir para um futuro mais justo e respeitoso.
f. O futuro se faz no presente e por este motivo os sistemas de cotas nas Universidades é um espaço de conquista, troca de ideias e saberes, bem como uma quebra dos paradigmas de indígenas idílicos, das narrativas “históricas”, pré-estabelecidas e por vezes infundadas, a possibilidade de formação acadêmica em universidades para os povos Indígenas abre um novo espaço de autodeterminação dos povos indígenas como protagonistas de seu futuro bem como o desenvolver de uma linguagem mais adequada para buscas de espaços na sociedade até então não compreendida pelos indígenas, ir ao encontro da sociedade nacional amplia a visão indígena sobre os aspectos sociais e econômicos de sua própria existência. Neste sentido, os Guarani Mbya, da Aldeia Nhetengua, sonham com a chegada de uma universidade dentro de seu território, assim eles também teriam direito de narrar sua história e seu processo de autonomia frente à sociedade nacional terá seu reconhecimento.
(*) Adilio Almeida de Souza, servidor público, morador da lomba do Pinheiro, Diretor de cultura indígena so Instituto Apakani, descendente e especialista na cultura indígena e nas PANCs (Plantas Alimentícias Não Convencionais). Autor do livreto de poesias Esperança da Criação
PRÓXIMA PASSOS
Com esta matéria o Jornal Brasil Popular quer instigar que a cultura dos povos originários seja conhecida pelo país afora. Quer que com informação os direitos constantes na Constituição e nas normas do país, dos estados e municípios sejam não só respeitadas, mas postas em prática.
(*) Adeli Sell é professor, escritor e bacharel em Direito – 051.999335309 – adeli13601@gmail.com – www.adelisell.com.br
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