Uma nova estrutura organizacional para o Brasil, com foco na soberania e cidadania, visando uma gestão mais eficiente.
Durante quase 400 anos, o Brasil manteve a mesma estrutura organizacional para ação do Estado. Foi aquela da Carta Régia de Dom João III, entregue a Tomé de Souza para constituir o Governo-Geral, em 1548. Por este documento o Estado Colonial Brasileiro tinha um Capitão-mor da Costa, para a defesa da colônia de invasões estrangeiras, um Ouvidor-Geral, para defesa interna e promover a justiça, de acordo com as leis portuguesas, e um Provedor-mor da Fazenda, para fiscalizar as finanças da colônia, arrecadar tributos e garantir as remessas para a Corte lisboeta.
Neste período o Brasil cresceu, fez-se independente, e apenas pelo volume de encargos e para, sendo Estado independente, relacionar-se com os demais houve mudanças; as três funções continuaram existindo, redenominadas.
O capitão-mor da Costa tornou-se ministro da Marinha que teve para defesa das fronteiras terrestres o ministro da Guerra, depois do Exército.
O ouvidor-geral expandiu-se no ministro da Justiça, para ordem interna, e do Interior, para administração do Império e, depois, da República, e no Poder Judiciário para aplicação das leis agora brasileiras.
O provedor-mor foi o que mais cresceu, pois além da Fazenda, passou a tratar da Agricultura, Comércio e Obras Públicas, participando também de algumas incumbências da pasta do Interior.
E a novidade trazida pela Independência do Ministério dos Negócios Estrangeiros.
Ao fim da I República, ou República Velha, com a presidência de Washington Luís Pereira de Sousa, os Ministérios eram: da Marinha, da Guerra (capitão-mor da Costa), da Justiça e Negócios Interiores e o Poder Judiciário (ouvidor-geral) e da Fazenda, da Agricultura, Indústria e Comércio, Viação e Obras Públicas (provedor-mor), além do Ministro das Relações Exteriores.
Coube a Getúlio Dornelles Vargas, ainda como presidente do Governo Provisório, empossado em 3 de novembro de 1930, criar dois Ministérios, iniciando o processo de organização do Estado brasileiro: Ministério dos Negócios da Educação e Saúde Pública (14 de novembro) e Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio (26 de novembro).
Depois, como presidente do Estado Novo e como presidente eleito em 31 de janeiro de 1951, Getúlio Vargas moldou o Estado Brasileiro com órgãos da administração direta, autarquias, comissões e conselhos, fundações, institutos e com empresas públicas e de economia mista.
Muitos críticos veem neste conjunto um espírito centralizador de Vargas, quando se deu exatamente o oposto. Pessoa culta, leitora do que saía no Brasil e no exterior sobre administração e política, Vargas promoveu a especialização e a participação mais ampla com organismos até então desconhecidos no Brasil.
“Iniciativa ímpar, pode-se, retrospectivamente, afirmar, teve o governo Vargas ao criar a Comissão Especial do Legislativo e do Executivo (Lei 51, de 14/5/1935), cujo objetivo era apresentar uma proposta de reorganização administrativa e revisão geral de vencimentos, respeitando-se o critério de igual remuneração para aqueles que exercessem funções e responsabilidades iguais” (Olavo Brasil de Lima Junior, “As reformas administrativas no Brasil: modelos, sucessos e fracassos”, Revista do Serviço Público, Ano 49, nº 2, abril-junho de 1998).
No mesmo trabalho do doutor Olavo Brasil de Lima Junior, se encontra: “A criação de institutos, autarquias e grupos técnicos foi o recurso utilizado pelo governo para intervir diretamente nas relações econômicas, até então essencialmente privadas: equilibrar o consumo e a produção; regular a exportação e a importação; incentivar a indústria; e implantar, ampliar e remodelar a infraestrutura com vistas a industrializar o país”.
A tragédia de sua morte foi o último ato de defesa do Brasil praticado por Vargas. Intimidados pela impressionante manifestação de dor da população, visível na capital e nos mais escondidos e incógnitos cantos brasileiros, a oposição, em boa parte alimentada por interesses estrangeiros que viam como ameaça o nosso desenvolvimento, recolheu-se e só voltou a atuar com o golpe de 1964. A vitória desta oposição antinacional se dá com a denominada “redemocratização” e a invasão neoliberal financeira a partir de 1980, ainda presente em 2024.
Nesta terceira década do século 21, é inimaginável retomar a estrutura construída por Getúlio Vargas. Apenas o sentido nacionalista e o valor do trabalho devem guiar o projeto. O mundo mecanicista transformou-se no mundo virtual, ameaçado pelas armas termonucleares, agora conduzidas por impulsos digitais.
Será dentro destas novas condições que se colocará o projeto de estrutura organizacional do Brasil, tendo em vista que não se buscam modelos, apenas exemplos, no estrangeiro, como ensinou José Ortega y Gasset (“Misión de la Universidad”, Revista de Occidente, Madrid, 1960, 3ª edición).
Premissas para o projeto de organização
A premissa básica exige a educação política do povo, como já se mencionou nesta série. Se o povo participa e discute, ele compreende. Se não participa, as redes sociais, os sites de relacionamento e desinformação, controlados por empresas financeiras estrangeiras, distorcem fatos e confundem os mais patriotas dos brasileiros. O povo será então enganado e sofrerá as consequências.
Outra premissa é a dimensão territorial do Brasil. O receio da fragmentação do Brasil vem desde a colônia, influiu para que o Patriarca José Bonifácio de Andrada e Silva aceitasse a permanência dos Braganças no governo brasileiro, sob regime monárquico, mesmo tendo alcançado nossa independência. Como se sabe, travava-se nas Américas espanholas a luta da integração bolivariana contra a fragmentação monroísta, Bolívar versus Monroe, como se manifesta o cientista político e professor venezuelano José Gregorio Linares, era a dignidade nacional contra a ingerência estrangeira.
O Brasil incorpora sob a mesma língua, a mesma história, as mesmas dificuldades e êxitos, situações tão distintas quanto a caatinga do nordeste, a exuberância da floresta amazônica, os pampas gaúchos e o pantanal mato-grossense. Ninguém, fora aqueles idiotizados pelas pregações antinacionais ou venalizados pelo capital estrangeiro, imagina constituir um país independente. Até mesmo pela condição de nação miscigenada que a todos envolve.
Porém, no momento de traçar as soluções para qualquer tipo de questão, as que envolvem a soberania nacional ou a saúde de um grupo, as condições específicas do local precisam prevalecer para garantir as suas eficácias.
Por conseguinte, a estrutura organizacional brasileira precisa, ao mesmo tempo, ser unitária, centralizada, e diversificada, descentralizada. O esforço de garantir esta condição heterodoxa é um dos desafios que se nos depara.
Toda função pública deve ter origem na explícita manifestação popular, é um axioma que deve prevalecer. Nenhum poder dele se afastará.
O executivo surge então das diversas assembleias que são constituídas nos distritos, subdivididas pelas capacitações cognitivas, e percorrem toda hierarquia do poder nacional brasileiro.
Ter-se-ão as assembleias distritais, as assembleias municipais, as assembleias estaduais, as assembleias regionais e a assembleia nacional, onde são tratadas as políticas e estratégias brasileiras.
O percorrer das assembleias, sem saltos e com a avaliação dos eleitores, formará o político e o administrador público brasileiro. Ao chegar à Assembleia Nacional, após 20 ou mais anos de atividades, nas assembleias e nas governanças, o cidadão que só poderá ser candidato após 21 anos, terá acumulado experiência, vivência e cultura que se poderá exigir dele o melhor e mais consistente desempenho. É a garantia que hoje não se tem com arrivistas ambiciosos e inescrupulosos.
Sobre as questões ambientais e identitárias
Lorenzo Carrasco, Silvia Palacios e Geraldo Luís Lino, da direção da Capax Dei Editora (RJ), escreveram e coletaram muitas informações para o livro Máfia Verde – O ambientalismo a serviço do governo mundial, em 12ª edição, em 2017, e onde se lê: “O fácil apelo popular do ambientalismo, com o discurso de uma alegada ‘proteção’ da natureza contra os excessos das atividades humanas, o converte em um dos mais influentes fatores indutores da crise civilizatória em curso, ao lado da hegemonia conferida aos ‘mercados’ financeiros na determinação das políticas econômicas. Em seu cerne, a ideologia ambientalista, baseada no conceito do biocentrismo, considera o ser humano como apenas mais uma entre as milhões de espécies da biosfera terrestre, ou seja, o rebaixa ao nível dos demais seres vivos e lhe nega qualquer primazia de um papel protagonista no presente estágio da evolução universal.”
Esta ideologia se viu explicitada em 1992, no Rio de Janeiro, por ocasião do quinto centenário da nossa “descoberta” pelos portugueses, durante o primeiro governo eleito da Nova República, na Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento, Rio-92 ou Eco-92, anunciando a utópica “Nova Ordem Mundial”, ou seja, o fim dos Estados Nacionais soberanos e a entronização do “Governo Mundial”, do mercado financeiro, sob as roupagens ambientalistas e identitárias, naquele momento reduzida à política indigenista. Recordar a polêmica reserva indígena de 90 mil km², em área de fronteira com a Venezuela, destinada aos 6.510 ianomâmis, distribuídos em 58 aldeias.
Não há como negar ter a civilização do homem branco subordinado a mulher e os negros aos seus caprichos e poder. Porém não é aprofundando a secção, o identitarismo, que se lhe poderá garantir independência e participação. Apenas com a educação cidadã, com a efetiva igualdade de participação nos destinos da nação, que se corrigirá esta disfunção cultural. E não será pelo “mercado” que se atingirá esta meta civilizatória, pelo poder cujo objetivo primordial é o lucro. Apenas o Estado para todos, sem outro objetivo que não seja da integração do povo miscigenado, conseguirá este desidério.
Apenas para fechar esta consideração sobre os grandes inimigos do Estado Soberano e Cidadão, é imperioso referir ao instrumento básico de ação destes opositores, as Organizações Não Governamentais (ONGs) que atuam com recursos públicos brasileiros ou com recursos das finanças apátridas, escondidos em paraísos fiscais. No livro citado, Máfia Verde, há todo um capítulo dedicado à “súbita emergência das organizações não governamentais, gestada no seio do aparato da inteligência britânico”, que o privatista ex-presidente Fernando Henrique Cardoso denominava “organizações neogovernamentais”.
Ideias para estrutura organizacional
Reafirma-se a proposta de ampla discussão a respeito do modelo organizacional brasileiro. Porém apresentam-se algumas ideias como aberturas às heterodoxias dos modelos usuais.
Viu-se, nesta série, que dois pilares são distintos mas indispensáveis à gestão nacional: defesa da soberania e construção da cidadania.
A Assembleia Nacional, ao escolher o presidente do País, poderia escolher também dois vice-presidentes, um para as questões envolvendo a Soberania e outro para a Cidadania. Ao primeiro estariam afetas a defesa nacional, os recursos para a informação e comunicação, o desenvolvimento tecnológico e o industrial, a energia e o transporte, a moeda e as finanças e as relações exteriores. Ao segundo, a educação e a saúde, a habitação e a alimentação, a mobilidade urbana, a defesa de todos direitos para efetiva cidadania, as formas de expressão da sociedade para os poderes públicos e privados, e a integração nacional.
Neste nível mais elevado da ação governamental seriam tratadas as políticas, as linhas mestras do planejamento, a coordenação e o controle da execução e auditagens. Seriam objeto das Assembleias Regionais, Estaduais, Municipais e Distritais as programações e execuções dos projetos, e suas fiscalizações.
Em todos os níveis existiriam ações diretas do poder público e aquelas derivadas deste poder, exercidas por organismos paraestatais, de economia mista e mesmo privados. O Estado sempre será o representante do poder do povo, e como tal deve ser sempre entendido. Os demais podem atender a objetivos setoriais, econômicos, tecnológicos e de classes, que são e devem ser respeitados, jamais se sobrepondo ao da Nação organizada.
(*) Pedro Augusto Pinho é administrador aposentado.
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