“Caminhante, não há caminho, faz-se caminho ao andar”.
Antônio Machado.
Repetindo, o Rio Grande do Sul, que foi celeiro do país, vanguarda na politica do Império e da República, como exemplo que foi em várias áreas, amarga de algum tempo destinos não muito claros, diria até destinos de amedrontar.
Foi o que falamos no texto anterior. Vamos adiante com os dilemas do Estado mais meridional do país.
Nunca houve caminhos, nem trilhas, nem marcações por onde começar, por onde passar, até quando chegaram os bandeirantes, os portugueses e os espanhóis que marcharam ao Sul, tentando conquistar territórios, preando gado, tirando o couro, fazer dinheiro, depois fazendo charque, escravizando irmãos.
Havia o mar, a lagoa, as matas densas. O Rio Grande do Sul se fez a ferro e fogo.
Os guaranis foram dizimados pela força das armas, pela ira do sanguinário Borges do Canto.
O ferro às vezes foi a faca afiada cortando o pescoço do adversário, como na Guerra Civil de 1893-95.
Noutras vezes foi o fuzilamento dos presos de guerra.
O Rio Grande do Sul sempre foi uma terra belicista.
Nem vamos aqui discutir se os Farrapos na guerra dos 10 anos queria ou não se apartar do Brasil. Ao fundar o Estado do Piratini parece-nos termos alguns elementos de separatismo.
Os dirigentes iluminados que criaram o moderno estado do Rio Grande do Sul provinham das elites rurais, sendo chimangos e maragatos.
Logo, nem os chimangos eram tão progressista como se vendem e como até a esquerda os compra até hoje, nem os maragatos eram conservadores como eram acusados e até hoje se fala.
Aqui, o preador só tinha olhos para o gado vacum solto e bravio, para mulas e cavalos. O espírito errante era o predominante, não foi um local que se fez o caminho ao caminhar, mas no lombo de um cavalo para laçar gado, animais que eram mortos muitas vezes pelo simples couro e a carne a apodrecer ao leu.
O caminho que fez o tropeiro comendo charque foi com mulas pela Serra em direção a São Paulo.
O caminho que faz a soja nos dias atuais não é para o engenho de moagem para tirar óleos e farináceos, mas o caminho é o do Porto de Rio Grande para chegar ao outro lado do mundo, singrando mares.
O caminho da madeira não é para construir casas para as pessoas, mas para fazer papel branco para se escrever não se sabe onde e que mesmo.
“Ao andar se faz caminho, e ao voltar a vista atrás se vê a senda que nunca se voltará a pisar. Caminhante, não há caminho, mas sulcos de escuma ao mar.”
Talvez para quem nos leia, pode parecer apenas o poema de Antônio Machado. Mas não é só um poema. É uma provocação a mim, a ti, a todos os rio-grandenses, sejam homens ou mulheres, das cidades e do interior.
A gente comprou mitos e lendas, engole mentiras até hoje, por isso não deu certo e não dará certo.
80 mil porto-alegrenses se mandaram daqui em pouco mais de 10 anos.
Se tivéssemos governos sérios procurariam saber as razões. Minhas escutas me dão a convicção é de que é puro descontentamento.
Quem pode se manda daqui para viver nalguma praia do vizinho estado de Santa Catarina.
Até uma professora aposentada com a merreca que ganha do erário pode sair, morar num local bacana e sobreviver, até porque a cesta básica daqui é de longe – faz tempos – a mais cara do país. Em Arroio Silva, passando o Mampituba, em Santa Catarina, ela viverá melhor e com menos recursos.
Em Santa Catarina, o IPVA é mais barato, o IPTU nem se compara com a ganância arrecadadora daqui. Alimentos custam menos por lá.
Cora Coralina nos dá conselhos, os quais aqui não se deu o devido valor: “O que vale na vida não é o ponto de partida e sim a caminhada. Caminhando e semeando, no fim, terás o que colher.”
Nosso ponto de partida, como vimos, não foi nada “humanitário”, a caminhada foi de pouca semeadura!
Não se faz mais a preagem do gado, mas por que razão aqui no pobre vizinho Uruguai se cria gado melhor e com carne de muito melhor qualidade?
Por que nossas divisas são tão devassáveis, relembrando, a entrada ilegal de vinho da Argentina?
Por que nossa soja é simplesmente exportada, e as nossas indústrias foram para o beleléu?
Há dez anos a manchete da mídia era que a Bunge havia fechado sua operação em Passo Fundo, zona de grande produção do grão, porque não tinha competividade com o azeite.
Em 2019 somos surpreendidos com a manchete:
“Gaúcha Olvebra entra em recuperação judicial”. Era a gigante dos óleos de soja que ia à breca.
E o Jornal do Comércio ainda dizia: “Mais uma empresa com sede no Rio Grande do Sul ingressou em recuperação judicial.”
Nada mais é preciso falar, não é?
Dos tempos de prear gado e vender o couro que era curtido nos campos, secado, vendido para várias utilidades, vieram novas formas de curtimento, chegando ao “blue wet” não sem antes passar por uma guerra ambiental onde o Rio Grande do Sul frequentou páginas e páginas de jornais com denúncias de afronta ao meio ambiente, como a poluição do Rio dos Sinos, na Região Metropolitana, na região calçadista.
Não bastassem estas crises e contratempos, sem uma política industrial efetiva ao setor por parte dos governos, vieram as enchentes e destruíram um dos maiores curtumes do Rio Grande do Sul por duas vezes no Vale do Taquari.
Ou seja, fica evidente que neste Estado a política ambiental sempre anda com retardo, ou seja, o caminho parece não se fazer ao caminhar, contraditando nosso grande poeta espanhol.
Conhecidos como o Estado das cervejarias, em especial, as artesanais, não podemos esquecer que fecharam muitas tracionais como a Serramalte em Getúlio Vargas, a Polar de Estrela que tinha filiais em Guaporé e Porto Alegre. A área da Ambev de Montenegro vai virar Centro Comercial.
A notícia mais impactante do setor se deu há pouco, com o fechamento de uma das primeiras indústrias artesanais e icônica no setor, a DadoBier, depois de 22 anos. A notícia mostra um descontentamento do seu criador.
Paramos por aqui, pois aqui foi o berço das cervejarias do país.
Infelizmente, ainda haverá muito a contar sobre os “Destinos” de nosso Estado.
Aguardem!
(*) Adeli Sell é professor, escritor e bacharel em Direito.