Com certeza o melhor comentário ouvido na TV sobre a onda levantada contra Lula, por causa de sua declaração sobre aborto a semana passada, foi o da jornalista Flávia Oliveira no programa “Em Pauta”, da GloboNews. Mulher e negra, Flávia foi corajosamente ao limite do possível numa TV como a GloboNews naquele momento.
O que todo mundo sabe – lembrou ela – é que Lula não está pregando a ampliação do direito ao aborto, está apenas dizendo que existe um aborto legal no Brasil, definido e delimitado por decisões de origem legislativa ou do Supremo, decisões que o permitem em caso de risco à vida da gestante, de gravidez resultante de violência sexual e de anencefalia do feto.
Esse aborto legal é acessível com todas as garantias jurídicas a mulheres que disponham de recursos para pagar clínicas boas, legalizadas e seguras. As mulheres pobres, porém, dependem na maioria dos casos de clínicas baratas, clandestinas e inseguras ou de procedimentos conduzidos perigosamente por elas próprias, até com agulhas de tricô, ou por aborteiras ou aborteiros “práticos” de discutível confiabilidade.
Por isso, disse Lula – e poderia ter dito mais que isso – o aborto no Brasil tem de ser tratado como uma questão de saúde pública, não pode ser conduzido como uma questão religiosa, de pecado ou culpa, de crime e castigo, como vem sendo tratado por uma suposta religiosidade, primitiva, ignorante e intolerante, um fantasma com que essa verdadeira inquisição procura demonizar candidatos dos quais não gosta.
Não gosta, na verdade, por outros motivos, porque não quer qualquer mudança na ordem econômica e social vigente. A invocação do direito à vida com que se disfarça esse conservadorismo retrógrado e reacionário não consegue mais esconder que seu verdadeiro objetivo é a proteção e a preservação de privilégios que envergonham a condição humana e nada têm de cristão ou evangélico.
Trata-se de um movimento em escala internacional, que recorre aos chamados valores da família, outrora chamados de valores da sociedade ocidental e cristã, para precarizar as relações de trabalho, para “uberizar” a economia fingindo que cada profissional se converte em seu próprio empresário, para aumentar a concentração de renda multiplicando o patrimônio escandaloso de seus bilionários. É uma escalada suicida a dessa economia em que poucos têm cada vez mais e muitos têm cada vez menos ou nada têm.
Ela acaba de ter uma vitória na Hungria, com a eleição que manteve no poder o Primeiro-Ministro Victor Orban, e chega ao primeiro turno da eleição presidencial na França com bons índices nas pesquisas para a candidata de extrema-direita Martine Le Pen. Nos Estados Unidos ela espera vencer as eleições legislativas de novembro mas teve nos últimos dias uma derrota, a aprovação da juíza negra Ketangi Jackson para a Suprema Corte, e uma vitória, a aprovação no Estado de Oklahoma de uma apavorante lei antiaborto que pode levar um médico e sua paciente a 20 anos de prisão. Ainda para este ano, espera-se também que a Suprema Corte revogue a chamada decisão Wade versus Roe, que nas últimas décadas assegurou às mulheres, em determinados casos e prazos, exercerem seu direito de escolha.
Existe um denominador comum eleitoral entre figuras como Orban, Le Pen, Donald Trump e – naturalmente – Bolsonaro: a cruzada político-ideológica para fazer prevalecer nas urnas e disseminar-se em seguida na composição dos tribunais e dos órgãos legislativos e no controle da grande mídia, essa doutrina dos supostos valores da família, que esconde a blindagem dos privilégios econômicos mais odiosos.
E esconde também a tentativa de proteger e perpetuar o modelo econômico-social-familiar do patriarcado, que há cinco mil anos oprime e explora a mulher e hoje não se conforma com seu empoderamento e sobretudo com a liberdade que ela vem conquistado em todas as dimensões de sua vida – a profissional, a política, a econômica e a familiar.
O machismo encurralado reage em casos extremos com a multiplicação dos episódios de estupro e feminicídio e na média com atos de resistência misógina e racista como os enfrentados pela juíza Jackson e movimentos contra a liberdade da mulher como as cruzadas antiaborto.
É evidente que, nessa onda, o tema do aborto vai ser usado contra Lula na campanha presidencial deste ano, pouco importa o que ele diga ou deixe de dizer, como na eleição passada se usou contra Fernando Haddad o recurso ao Kit Gay e à mamadeira erótica.
(*) José Augusto Ribeiro – Jornalista e escritor. Publicou a trilogia A Era Vargas (2001); De Tiradentes a Tancredo, uma história das Constituições do Brasil (1987); Nossos Direitos na Nova Constituição (1988); e Curitiba, a Revolução Ecológica (1993). Em 1979, realizou, com Neila Tavares, o curta-metragem Agosto 24, sobre a morte do presidente Vargas.
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