Além de banir, matar, torturar e desaparecer com milhares de lideranças políticas, sindicalistas, camponeses/as, educadores/as e jovens estudantes, a ditadura militar, instalada pelo golpe de 1º de abril de 1964, produziu uma remodelagem no sistema educacional do país, deixando marcas profundas na educação brasileira.
Usando do aparato jurídico da ditadura, o regime implantou, por meio de leis, um modelo centralizador e autoritário centrado, sobretudo, em reformas voltadas para a mudança de uma educação tradicional para uma educação tecnicista, baseada nos ideais do racionalismo, objetivando, à moda militar, “organização e eficiência”.
Com base nessa política,que considerava o/a educador/a apenas um/a técnico/a que deveria ser treinado para cumprir instruções técnicas, além de construir prédio precários, a ditadura criou a modalidade de graduação conhecida como Licenciatura curta, teoricamente para formar mais educadores/as em menos tempo.
A Constituição militar de 1967 “desobrigou” a União e os estados a investirem um mínimo, alterando um dispositivo previsto na Lei de Diretrizes e Bases, aprovada em 1961, onde previa que a União tinha que investir ao menos 12% do Produto Interno Bruto (PIB) em educação.
Essa mesma Constituição da ditadura desobrigou os estados e municípios de alocarem 20% se seus orçamentos na Educação. A nova Constituição também abriu o ensino para a iniciativa privada, abrindo as portas do ensino brasileiro para a precarização da escola pública, precarizado.
A partir daí, a oportunidade de jovens pobres entrarem na Universidade, que passou a ser reduto dos/as filhos/as de ricos, com condições de pagar as novas escolas privadas para preparar suas crias para ocupar as vagas nas universidades públicas, acentuando, assim, a dualidade entre o ensino público e o ensino privado.
Do ponto de vista da ideologia e dos costumes, a ditadura introduziu mudanças curriculares para “fazer a cabeça” de crianças e jovens. Uma delas foi a introdução da matéria Educação Moral e Cívica para os alunos/as do 1º e 2º grau. A Educação Moral e Cívica só deixou de ser obrigatória em 1992 e só foi abolida em 1993.
O regime também alterou o conteúdo da disciplina Organização Social e Política do Brasil (OSPB), pensada por Anísio Teixeira, ex-ministro do presidente João Goulart, para que a juventude brasileira conhecesse melhor a legislação do país. Com a mudança, a OSPB passou a ser um instrumento de propaganda da ditadura. Em consequência de tantas mudanças absurdas, o país entrou em um redemoinho de revoltas estudantis, de prisões, torturas, mortes e desaparecimentos muitos/as jovens brasileiros/as.
Perdeu-se, com o golpe, a “Educação como Prática da Liberdade”, de Paulo Freire. Voltou-se a uma educação bancária, autoritária, repressora e domesticadora, social e culturalmente empobrecida, estruturada em uma ideologia da “pressão e repressão” sobre estudantes e professores/as.
O Ato Institucional número 5 (AI-5), editado em 1968, a peça jurídica mais repressora da ditadura, cuida, especialmente, da educação, no capítulo sobre funcionários públicos:
1° – sendo que tais infrações definidas neste artigo serão punidas/castigadas:
I – se fazer parte ou for membro do corpo docente, funcionários, ou empregados de estabelecimentos educacionais com pena de demissão ou dispensa, ou a proibição de ser nomeado, despedido ou contratando por qualquer outra da mesma situação, por tempo de cinco anos;
II – se for aluno, com a punição de desligamento, e sendo proibido de se matricular em qualquer outro estabelecimento educacional pelo prazo de três anos;
2° – se o infrator tiver a bolsa de estudos ou tiver qualquer ajuda do Poder Público, irá perdê-la, e não poderá utilizá-la por cinco anos; 3° – se tratando de bolsista estrangeiro, será solicitada a sua retirada do território Brasileiro.
Pra completar, entre os anos de 1964 e 1968, o regime fechou doze acordos com o governo norte-americano, os chamados Acordos MEC-USAID, permitindo a uma nação estrangeira influenciar e impactar na condução de todos os setores da educação brasileira, como as reformas do ensino superior e posteriormente de 1º e 2º graus, tendo por norte os pilares do “civismo” e “patriotismo”, essenciais na ideologia da “Educação e Segurança”.
Somente na década de 1980, com a ditadura já em frangalhos, com a comprovação do fracasso da implantação da reforma da Lei da LDB (Lei de Diretrizes e Bases) e da Lei nº. 7.044/82, as escolas foram dispensadas obrigatoriedade da profissionalização.
O objetivo da educação não era formar consciência crítica, era formar mão de obra barata e silenciosa para os projetos do regime. Mais escolas técnicas, com cursos profissionalizantes de nível médio, as chamadas “escolas polivalentes”, menos jovens pensantes nas universidades. Mais violência nos protestos estudantis, chamados de “subversivos”.
Decretaram a intervenção nos sindicatos, inclusive no Sindicato dos Professores de Brasília, o SINPRO/DF. Colocaram na ilegalidade a UBES (União Brasileira de Estudantes Secundários), a UNE (União Nacional dos Estudantes), mataram centenas de jovens. Em Brasília, o jovem estudante da UnB, Honestino Guimarães, continua até hoje desaparecido.
É por tudo isso que, nos 60 anos do golpe militar, não nos resta outro caminho que dizer:
DITADURA NUNCA MAIS!
(*) Por Rosilene Corrêa –
Rosilene Corrêa, professora, vice-presidenta do PT/DF, diretora da CNTE, ex-dirigente do Sinpro-DF, conselheira da Revista Xapuri.