Felizmente para a humanidade, não existe tal crise ambiental. Por Geraldo Luís Lino
A julgar pelo noticiário prevalecente, o mundo parece estar às portas de uma catástrofe ambiental de proporções planetárias, em especial, no tocante à alegada emergência climática que colocaria em risco o futuro próximo da humanidade.
Ameaça que implicaria mudanças radicais em praticamente todos os aspectos das atividades humanas, começando pelos usos de energia, com drástica e rápida redução no uso dos combustíveis fósseis – carvão mineral, petróleo e gás natural – com inevitáveis ajustes para baixo nas aspirações e planos de desenvolvimento de cada país e sociedade.
Felizmente para a humanidade, não existe tal crise ambiental. Existem, sim, problemas ambientais, a grande maioria pontuais, de alcance local ou regional, que podem e devem ser enfrentados com conhecimento científico, recursos tecnológicos, vontade política e, sobretudo, doses planetárias de bom senso, artigo que anda escasso nessa discussão. Alguns poucos têm um alcance maior, como a poluição dos oceanos, mas nada que possa ser qualificado como uma crise global.
O ambientalismo como o conhecemos não é um fenômeno sociológico espontâneo, oriundo de uma conscientização ampla e legítima sobre a necessidade de se compatibilizarem as ações humanas com certos requisitos racionais de proteção do meio ambiente. De fato, é uma ideologia criada artificialmente por grupos oligárquicos da América do Norte e Europa, a partir da década de 1960, com objetivos pouco disfarçados:
- controle demográfico;
- preservação de recursos naturais como “reservas estratégicas”;
- limitação da industrialização e do desenvolvimento econômico em geral, preferencialmente, aos “40 países ricos”;
- desde a crise de 2008, uma boia de salvação para o sistema financeiro “globalizado”, com a criação de investimentos “verdes” (créditos de carbono etc.) vinculados aos fluxos financeiros.
Em síntese, o objetivo geral dessa doutrinação é “convencer” os povos e países ainda não desenvolvidos de que a Terra não teria os recursos naturais necessários e o meio ambiente não suportaria as suas pretensões de atingirem níveis de desenvolvimento socioeconômico pelo menos próximos daqueles das nações avançadas.
Todo o discurso do “desenvolvimento sustentável” e suas eufônicas palavras de ordem – “capacidade de suporte”, “pegada” ecológica ou de carbono, “sobrecarga da Terra” e outros conceitos afins – são orientados para tal finalidade. A histeria climática e a pauta do “carbono líquido zero” (net zero, em inglês) são parte desse processo.
Como admite um dos notórios operadores dessa agenda, o economista alemão Ottmar Edenhofer, vice-diretor do Instituto Potsdam para Pesquisa de Impactos Climáticos (PIK) e copresidente do Grupo de Trabalho 3 (WG3) do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC):
“Basicamente, é um grande erro discutir a política do clima separadamente dos grandes temas da globalização… É preciso libertar-se da ilusão de que a política climática internacional é política ambiental. Isto não tem mais quase nada a ver com política ambiental, com problemas como o desmatamento ou o buraco na camada de ozônio (Neue Zürcher Zeitung, 14/11/2010).”
O discurso apocalíptico sobre o clima se baseia na tese de que as emissões de carbono das atividades humanas – combustíveis fósseis, agropecuária etc. – estariam provocando um aquecimento ameaçador da atmosfera da Terra, com as emissões de gases de efeito estufa, como o dióxido de carbono (CO2) e o metano (CH4).
No entanto, para que isso fosse verdadeiro, seria preciso que os padrões das oscilações das temperaturas da atmosfera e dos oceanos e dos níveis do mar, a partir da Revolução Industrial do século 18, apresentassem anomalias em relação aos registrados nos séculos e milênios anteriores. Mas tais anomalias simplesmente não existem e, assim, não há qualquer evidência concreta da alegada influência humana na dinâmica climática global.
No Holoceno Médio, entre 6.000–8.000 anos atrás, as temperaturas atmosféricas e oceânicas e os níveis do mar eram superiores aos atuais, mas as concentrações de CO2 na atmosfera eram cerca de 40% inferiores às atuais. Os modelos climáticos usados para sustentar o atual catastrofismo não explicam tal contradição, evidenciando que outros fatores influenciam de forma preponderante a dinâmica climática global.
A única influência humana no clima ocorre nas cidades, com o conhecido efeito das “ilhas de calor” urbanas, decorrente da impermeabilização do solo com asfalto e concreto, que diminui a infiltração das águas pluviais no subsolo e a consequente evapotranspiração. Assim, as temperaturas urbanas são superiores às das zonas rurais e áreas não urbanizadas, mas tal influência não tem alcance planetário, pois as cidades representam menos de 0,9% da superfície total do planeta.
Quanto às emergências reais, o maior problema ambiental são as deficiências de saneamento básico, que afetam mais da metade da população mundial. Na terceira década do século 21, é vergonhoso que mais de 1,5 bilhão de pessoas ainda tenham que fazer suas necessidades fisiológicas ao ar livre. E o lançamento de esgotos sem tratamento é a principal fonte de poluição dos cursos d’água.
Outros problemas sérios, inclusive no Brasil, são a gestão do lixo urbano e a ocupação irregular de áreas de risco, como encostas, várzeas e outras.
A chamada “transição energética” envolve a substituição acelerada dos combustíveis fósseis por fontes de baixas emissões de carbono, com ênfase preponderante nas eólicas e solares, alegadamente, para impedir um aumento das temperaturas atmosféricas superior a 1,5-2,0 C em relação ao considerado período pré-industrial.
Os seus proponentes e propagandistas afirmam ser possível substituir significativamente os fósseis até a década de 2050, mas a realidade dos fatos está demonstrando a inviabilidade técnica e econômica da proposta, sem falar nas consequências sociais e políticas:
- O petróleo, gás natural e carvão mineral respondem por mais de 80% de todos os usos de energia no mundo, e cerca de 61% da geração de eletricidade, uso no qual são preponderantes na grande maioria dos países, principalmente, os industrializados; usinas hidrelétricas e nucleares correspondem a 26,5%; e todas as demais, a pouco mais de 13%.
- As fontes eólicas e solares, favoritas dos ambientalistas, são intermitentes e de baixa eficiência energética, não sendo adequadas para o abastecimento elétrico de grandes centros urbanos e industriais, que requerem um fornecimento contínuo (“despachável”). Ademais, os materiais e equipamentos componentes das centrais eólicas e solares – pás, geradores, painéis solares etc. – não podem ser produzidos a partir de fontes eólicas e solares; ou seja, não são fontes autorreproduzíveis.
- Os cenários de net zero para 2050 exigirão um enorme aumento da produção mundial de minerais críticos (cobalto, cobre, grafite, lítio, manganês, terras raras etc.), estimado em seis vezes sobre os níveis atuais pela Agência Internacional de Energia (AIE). Além de não existirem jazidas comerciais suficientes para atender sequer a uma fração significativa de tais demandas, a entrada em operação de novas jazidas pode levar dez anos ou mais, e ainda haveria o sério problema ambiental da disposição dos rejeitos de tamanha expansão das atividades de mineração, sem falar nos custos colossais de todo esse esforço hipotético.
- A substituição das fontes tradicionais dos sistemas elétricos de base ou despacháveis – termelétricas, hidrelétricas e nucleares – por outras de menor densidade energética, como eólicas e solares, representa um retrocesso tecnológico. A rigor, uma transição energética efetiva deve envolver fontes de maior densidade e eficiência energética, como as tecnologias nucleares mais avançadas, inclusive reatores de fissão modulares e o desenvolvimento da fusão nuclear.
- No Brasil, o apagão que afetou quase todo o País em 15 de agosto de 2023 proporcionou uma amostra das inconveniências de se agregarem fontes eólicas e solares na rede elétrica de base. A experiência de outros países mostra que a introdução de fontes intermitentes na geração de base tende a aumentar a insegurança das redes, os custos de geração e a ineficiência do sistema como um todo, com impactos negativos diretos sobre a economia em geral. Perspectiva nada animadora para uma economia debilitada como a brasileira, em franco processo de desindustrialização.
A realização da conferência climática COP30 em Belém (PA), em novembro próximo, evidencia de forma insofismável as percepções equivocadas que orientam as políticas ambientais brasileiras. A capital paraense é uma perfeita vitrine do contraste entre uma política ambiental mais obcecada com uma proteção radical dos biomas amazônicos do que com os problemas reais enfrentados pela grande maioria da população da região, como as deficiências de infraestruturas básicas.
Para infortúnio dos quase 30 milhões de amazônidas, a região tem sido alvo de uma vasta campanha internacional de desinformação sobre uma alegada importância vital dos seus biomas para a estabilidade do clima global, os quais, segundo a tese, deveriam ser mantidos virtualmente intocados – visão que, infelizmente, conta com o apoio acrítico de numerosos cientistas brasileiros.
Na prática, a política vigente para a Amazônia Legal tem sido a de manter toda a região em uma espécie de santuário biológico praticamente vedado a atividades produtivas e infraestruturas modernas.
Em linhas gerais, essa é a “receita” aprovada para a região, embrulhada com o enganoso rótulo de bioeconomia. Sem dúvida, o vasto potencial biológico da região deve ser desenvolvido e explorado ao máximo, com o envolvimento dos poderes públicos, instituições de pesquisa, iniciativa privada e comunidades locais, em uma sinergia de esforços de enorme potencial para consolidar o setor como um diferencial para as perspectivas de desenvolvimento e progresso dos amazônidas.
Entretanto, isso não pode significar uma renúncia às demais atividades econômicas, como a produção agropecuária, indústria madeireira, mineração, exploração de petróleo e gás e a implementação de infraestruturas modernas, sem as quais qualquer esforço de desenvolvimento será inócuo.
Talvez, nenhum outro país tenha permitido uma influência tão grande da ideologia ambientalista-indigenista na determinação das suas políticas de desenvolvimento, refletida no grande número de empreendimentos econômicos e de infraestrutura bloqueados, retardados, desnecessariamente encarecidos e até sabotados, em especial, na Amazônia Legal. O custo dessa submissão, em valores diretos, oportunidades não realizadas e impactos socioeconômicos negativos, é verdadeiramente incalculável.
A caminho da quarta década do século 21, é hora de o Brasil assumir o grau de protagonismo permitido pelas suas dimensões e potenciais humanos e naturais, recuperando a soberania plena sobre as suas perspectivas de desenvolvimento e progresso.
Na área ambiental, o País precisa reorientar as suas políticas para vinculá-las a uma agenda de retomada do pleno desenvolvimento das suas capacidades produtivas, enfrentando decididamente as suas emergências reais e não as definidas por entidades estrangeiras.
Tal reorientação deve incluir, minimamente: uma restrição aos superpoderes dos órgãos ambientais, retirando-lhes o poder de veto absoluto sobre empreendimentos estratégicos, transferindo-os a um colegiado interministerial específico, mais político e técnico do que ideológico; e uma mudança de ênfase da “transição energética” para fontes não intermitentes e de maior densidade energética, como a energia nuclear, inclusive, com incentivos ao desenvolvimento de pequenos reatores modulares e às pesquisas com fusão nuclear.
Não será com créditos de carbono e instrumentos semelhantes que o Brasil poderá dar o salto de desenvolvimento necessário para galgar o patamar das economias avançadas. De modo algum, a “floresta em pé” e o “desmatamento zero” poderão ser os principais ativos do País nessa trajetória.
É preciso abandonar a ilusória ideia de apresentar-se ao mundo multipolar como uma “potência verde” disposta a oferecer às potências produtivas uma gama de “serviços ambientais”, utilizando os biomas Amazônia e Cerrado como contrapartidas para a atração de investimentos “verdes”, “climáticos”, “sustentáveis” ou qualquer outro rótulo do gênero. Em vez disso, precisa envidar todos os esforços para recuperar e aprimorar as capacidades produtivas condizentes com uma verdadeira potência que dispense rótulos enganosos.
(*) Geraldo Luís Lino é geólogo, ex-consultor ambiental e diretor do Movimento de Solidariedade Ibero-americana (MSIa).
Fonte: Monitor Mercantil