Se formalizou o início do diálogo com a Nova Marquetalia, o grupo que fundou em 2019. O analista León Valencia faz uma retrospectiva da vida do guerrilheiro.
O presidente Iván Duque deu por morto ao comandante Iván Márquez, quem foi o chefe da negociação das FARC-EP com o governo Santos. Tinha sobrevivido a um atentado em 2022 no qual não morreu, porém saiu em muito más condições físicas. Foi acolhido pelo presidente Maduro num hospital em Caracas e ali se recuperou até firmar o acordo para iniciar a negociação de seu grupo a Nova Marquetalia LINK com o Comissionado de Paz Otty Patiño em representação do governo de Gustavo Petro. Serviu como testemunha o embaixador da Venezuela em Colômbia Carlos Martínez Mendoza e se soube que Cuba atuará como país garantidor.
O analista León Valencia, diretor da Fundação Paz e Reconciliação, escreveu este texto no qual faz uma retrospectiva da turbulenta vida durante 40 anos de guerra de Iván Márquez, quem, depois de ter sido o chefe da equipe negociadora das FARC-EP em Havana com o governo Santos, regressou às montanhas em agosto de 2019, denunciando ameaças contra sua vida. O acompanharam um punhado de aguerridos ex-comandantes das FARC, entre os quais se encontravam Jesús Santrich, El Paisa, Romaña e Walter Mendoza. De todos eles só há dois sobreviventes: Walter –quem se escapou das balas e do cárcere- e Márquez, os quais estarão à frente da negociação.
Publicado por Las Dos Orillas | fevereiro 12, 2024. Confira o artigo na íntegra. Tradução de Joaquim Lisboa Neto (*)
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As sete vidas de Iván Márquez: liderará a mesa de negociação de seu grupo com o comissionado de paz
Se formalizou o início do diálogo com a Nova Marquetalia, o grupo que fundou em 2019. O analista León Valencia faz uma retrospectiva da vida do guerrilheiro.
Por: Las Dos Orillas | fevereiro 12, 2024
O presidente Iván Duque deu por morto ao comandante Iván Márquez, quem foi o chefe da negociação das FARC-EP com o governo Santos. Tinha sobrevivido a um atentado em 2022 no qual não morreu, porém saiu em muito más condições físicas. Foi acolhido pelo presidente Maduro num hospital em Caracas e ali se recuperou até firmar o acordo para iniciar a negociação de seu grupo a Nova Marquetalia LINK com o Comissionado de Paz Otty Patiño em representação do governo de Gustavo Petro. Serviu como testemunha o embaixador da Venezuela em Colômbia Carlos Martínez Mendoza e se soube que Cuba atuará como país garantidor.
O analista León Valencia, diretor da Fundação Paz e Reconciliação, escreveu este texto no qual faz uma retrospectiva da turbulenta vida durante 40 anos de guerra de Iván Márquez, quem, depois de ter sido o chefe da equipe negociadora das FARC-EP em Havana com o governo Santos, regressou às montanhas em agosto de 2019, denunciando ameaças contra sua vida. O acompanharam um punhado de aguerridos ex-comandantes das FARC, entre os quais se encontravam Jesús Santrich, El Paisa, Romaña e Walter Mendoza. De todos eles só há dois sobreviventes: Walter –quem se escapou das balas e do cárcere- e Márquez, os quais estarão à frente da negociação.
Otty Patiño substituiu a Danilo Rueda como Alto Comissionado de Paz e lidera os diálogos e aproximações do governo de Gustavo Petro com as guerrilhas e dissidências ativas.
Esta é a história das Sete vidas de Iván Márquez.
Iván Márquez está vivo em Venezuela depois de um atentado que por pouco lhe custou a vida. Se recupera e está a par das aproximações de seu grupo armado –a Nova Marquetalia- com o governo do presidente Gustavo Petro. Assim o disse em seu momento o ex-Alto Comissionado de Paz, Danilo Rueda, numa entrevista com Yamid Amat.
A trajetória de Márquez escapa de toda proporção. Participou nas muito diversas negociações entre as FARC e o governo da Colômbia desde 1984. Firmou dois acordos de paz e retornou à guerra depois de um tempo na vida civil. Foi um brilhante e loquaz parlamentar da União Patriótica, o agrupamento que surgiu dos acordos de paz e trégua entre as FARC e o governo de Belisario Betancur.
Escapou da morte no grave segundo lustro dos anos oitenta do século passado, quando arrasaram com a União Patriótica sacrificando a seus candidatos presidenciais Jaime Pardo Leal e Bernardo Jaramillo, a seus parlamentares e prefeitos, e a mais de três mil militantes do movimento no mais espantoso genocídio da história do país. Voltou à guerrilha.
Depois saiu vivo do mais estranho dos episódios de uma guerrilha pródiga em acontecimentos obscuros e complicados. Nos tempos em que liderava o Bloco Caribe e se movia pela Sierra Nevada de Santamarta se pôs a falar com Simón Bolívar através de um médium que, depois se descobriu que era um infiltrado do exército em pleno coração das FARC-EP. O relato desta aventura do realismo mágico está na Blanca Oscuridad [Branca Escuridão], o romance em chave de Jorge Enrique Botero.
As sessões de espiritismo se realizaram periodicamente por mais de um ano e comprometeram o destacamento guerrilheiro na busca dos restos [mortais] de Bolívar e de alguns pertences que deveriam se converter em símbolos da segunda independência pela qual tanto Hugo Chávez como as FARC lutavam. A aventura finalizou quando o médium pôs uma bomba debaixo da cama de Márquez, que explodiu com um estrondo de mil demônios num momento em que o guerrilheiro se havia levantado subitamente para esvaziar sua bexiga.
Se escapou também da armadilha que autoridades dos Estados Unidos e o ex-promotor geral Néstor Humberto Martínez lhe prepararam com a colaboração de seu sobrinho Marlon Marín. Márquez tinha aberto as portas das FARC para seu sobrinho e este havia conquistado a confiança dos mandos da guerrilha, porém ao mesmo tempo tinha começado a trabalhar com a DEA.
Munido dessa confiança, envolveu a Jesús Santrich nuns negócios que tinham o veneno de fornecer provas de que tanto Santrich como Márquez estavam na empresa de exportar dez toneladas de cocaína pros Estados Unidos. Santrich se prestou para gravações que o culpavam, porém Márquez sentiu o cheiro da cilada e expulsou aos empurrões o seu sobrinho de sua casa em Bogotá e abortou a operação. Assim se referem o enredo os companheiros de Márquez que permaneceram na vida civil.
Márquez era um tranquilo professor de colégio no estado do Caquetá nos anos oitenta do século passado e se vinculou às FARC quando esta guerrilha emergiu no cenário política empunhando as bandeiras da abertura democrática e da reforma agrária, buscando um acordo de paz no momento em que Belisario Betancur decretou uma anistia geral e incondicional para todos os guerrilheiros do país que viessem para a vida civil.
Com a fama adquirida na liderança da União Patriótica e no exercício parlamentar, foi promovido à cúpula das FARC e, depois da morte de Manuel Marulanda, de Alfonso Cano e de Raúl Reyes, se converteu no principal líder político dessa guerrilha e no chefe da delegação que depois de mil vicissitudes firmou o Acordo de Paz do Teatro Colón que levou à desmobilização da maior e mais antiga insurgência do país e do hemisfério.
Quando Jesús Santrich caiu preso carregando sobre seus ombros as acusações arquitetadas por Marlón Marín, pela DEA e pelo ex-promotor Martínez, Márquez se foi para as montanhas do sul do país e não quis atender aos chamados de seus companheiros, nem os requerimentos da Justiça Especial para a Paz-JEP-. Depois declarou rompido seu compromisso com o Acordo de Paz e junto com onze comandantes se dispôs a retomar as armas e construir uma força guerrilheira recolhendo aos dissidentes do processo de paz.
Não teve muito êxito neste segundo retorno às guerrilhas. Boa parte dos dissidentes não o acolheram como seu comandante e formaram tenda à parte. Os chefes guerrilheiros notáveis que o acompanharam foram dados como de baixa, começando por Santrich, em operações que têm todos os vestígios de ações de caça-recompensas norte-americanos que se movem na fronteira com a Venezuela e se lançaram por encomenda sobre os chefes da Nova Marquetalia. E aí está outra vez o insólito: Márquez, ainda que mutilado e mal ferido, sobreviveu ao ataque e seus companheiros morreram. Sabiam [os inimigos] que [ele] era um fumante obsessivo de charutos e lhe enviaram um explosivo numa caixa de tabacos cubanos.
Esperemos que nesta oportunidade o espírito de Bolívar lhe aconselhe a terminar sua aventura e vir definitivamente para a vida civil para nunca [mais] regressar à guerra.
Tradução > Joaquim Lisboa Neto
Acessar original > https://www.las2orillas.co/las-siete-vidas-de-ivan-marquez-liderara-la-mesa-de-negociacion-de-su-grupo-con-el-comisionado-de-paz/
El Paisa, Iván Márquez e Jesús Santrich deram as costas ao processo de paz que se firmou com o presidente Juan Manuel Santos e fundaram La Segunda Marquetalia. Dos três somente Márquez queda com vida.
(*) Por Joaquim Lisboa Neto, colunista do Jornal Brasil Popular, coordenador na Biblioteca Campesina, em Santa Maria da Vitória, Bahia; ativista político de esquerda, militante em prol da soberania nacional.