Várias avaliações de colunistas sobre os últimos e tensos acontecimentos destacam apenas a reforma ministerial e a “acomodação” de Bolsonaro ao centrão.
Pegam uma possível consequência para explicar o que aconteceu. Mas isso não me satisfaz, pois toda consequência tem causa e temos de conhecê-la para chegarmos à raiz dos problemas, como disse Lula.
Penso que essa nova tentativa golpista de Bolsonaro, que tudo indica vai fracassar como as anteriores, começou com retomado dos direitos políticos de Lula e cresceu em sua mente com a pressão articulada do Congresso e da grande mídia pela demissão de Ernesto Araújo, o ministro do Exterior ideológico, apoiado pelo clã presidencial.
Essa pressão acendeu em Bolsonaro a luz vermelha que o fez detonar a corrida golpista para culminar no dia 31 de março, com suas hordas clamando por intervenção militar nas portas dos quarteis.
Mas o golpe que ele pensa não seria com a intervenção direta do Exército, mas com este dando cobertura aos motins das PMs estaduais sob o pretexto de defesa da liberdade contra a suposta ditadura do “estado de sítio” dos governadores, que é como Bolsonaro chama a medida sanitária extrema mas necessária para conter a elevadíssima contaminação e do número de mortes pelo Covid.
Ele pensa no tipo de golpe como o que foi executado na Bolívia, no ano passado, e já derrotado pela força eleitoral do povo.
O problema foi que o primeiro motim planejado, da PM baiana, fracassou, depois que a ação de um PM rebelado não foi seguida por outros e ele acabou atirando em seus próprios colegas e por isso sendo morto. Provavelmente tal fracasso se deu porque o motim não contou com o respaldo ou mesmo a omissão do Alto Comando militar. Isso fez Bolsonaro, desesperado, demitir o ministro da Defesa que defende o papel das FFAA como instituição de Estado e não como instrumento político do governo.
Mas ao tomar essa decisão radical Bolsonaro precipitou uma gravíssima crise militar que ele, por seu atual isolamento político e social, não tem condições de enfrentar ou superar.
A nação que almeja a defesa da vida e a normalidade democrática não pode se conformar com algum recuo de Bolsonaro, pois ele continuará matando a população e tentando novos retrocessos antidemocráticos.
É preciso dar um basta nesse governo genocida e afastá-lo do cargo de presidente.
Isso começa pelo afastamento da deputada bolsonarista Bia Kicis da presidência da CCJ, a comissão da Câmara dos Deputados que defende o respeito à Constituição, coisa que ela obviamente não faz, sobretudo quando pregou o crime constitucional de motim da PM da Bahia contra o governador do Estado.
O fato é que sob o calor das pressões da luta pela vida e contra o fascismo, o governo Bolsonaro começa a derreter.
Por Val Carvalho – escritor e militante de esquerda