E nessa brincadeira ela já tá quase quinquagenária…
Nos dias 15 e 16 de fevereiro surgiu o que se transformaria, em tempo recorde, no mais arrojado avanço não oficial em termos de incentivo a cultura e a arte santa-marienses: a BIBLIOTECA CAMPESINA — um centro Cultural e Artístico.
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A ideia dessa biblioteca nasceu numa reunião entre Clodomir Morais e a turma deste jornal. No que Morais falou em fundação de uma biblioteca comunitária autogestionária, descobrimos na hora que aquela era mais uma chance imperdível que a gente tinha nas mãos no sentido de desenvolver o intelecto da juventude santa-mariense, além de incentivar desinteressadamente os artistas da terra.
E a luta foi árdua.
Trabalhamos dias consecutivos de manhã, de tarde e de noite, às vezes varando madrugadas. Sem grana. Na pura e simples força do mutirão.
Mas valeu a pena tanta batalha.
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Naquela sexta-feira chuvosa de fevereiro lá estávamos, modestamente, com algumas dezenas de livros nas estantes e outras dezenas de quadros muito lindos nos cavaletes em exposição, além das carrancas, barcos e outras artes populares.
Quem viu gostou. E quer mais.
E, pra fechar o tempo, agitou-se um recital de poetas que fazem a praça, onde alguém nos jogou na cara versos como estes: “nós somos a geração castrada/ comemos pão com cocada/ nas reuniões marginais/ nós somos a raiz do mal/ o radical doente/ mas apesar em nós/ essa loucura/ somos de repente/ a cura!/ a cura!”
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Sei perfeitamente bem que algumas autoridades civis e militares não veem com bons olhos este novo movimento artístico e cultural organizado por nosso grupo. E isto é perfeitamente compreensível, pois nós lutamos contra a ditadura e os prefeitos, os tenentes [ou sargentos] da vida estão aí exatamente pra impedir que o povo consiga desenvolver suas mentes e se organizar na luta contra a opressão.
Se esses poderosos ameaçam fechar a Biblioteca Campesina é porque eles sabem que nosso objetivo é formar uma nova consciência crítica entre um povo que vive encabrestado e alienado. E se esse povo acorda, a carreira política de muita gente por aí vai ter fim.
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A CAMPESINA acha e quer que o povo acorde!
É isso aí.
Somos nós fazendo a história de Santa Maria —tirando a paz dos indivíduos pré-históricos que temem a formação da nova consciência na massa santa-mariense. Mas essa consciência, virá, cedo ou tarde!
De uma coisa eu tinha plena convicção: se o nosso recém-nascido projeto fosse não exitoso mas sim desastroso, isso se daria não pela força dos poderosos reacionários locais mas sim muito mais pela nossa incompetência, incapacidade e frágil amor à causa da cultura do nosso povo.
*Publicado originalmente no jornal O Posseiro nº 9 fevereiro 1980
(*) Joaquim Lisboa Neto, colunista do Jornal Brasil Popular, coordenador na Biblioteca Campesina, em Santa Maria da Vitória, Bahia; ativista político de esquerda, militante em prol da soberania nacional.
*As opiniões dos autores de artigos não refletem, necessariamente, o pensamento do Jornal Brasil Popular, sendo de total responsabilidade do próprio autor as informações, os juízos de valor e os conceitos descritos no texto.