No apagar das luzes da Câmara dos Deputados, às vésperas do início do recesso parlamentar, o governo Bolsonaro e o deputado Arthur Lira (PP-AL) tentaram aprovar, nesta quinta-feira (15), a Medida Provisória 1.045, com alterações que, na prática, fazem uma nova reforma trabalhista com várias reduções de direitos.
A MP 1.045, que prorrogou o programa de suspensão de contratos e de redução de salários na pandemia, foi publicada pelo governo no dia 28 de abril e precisa ser votada pelo Congresso para virar lei.
Nesta quinta-feira, o deputado Christino Áureo (PP-RJ), relator da MP, apresentou seu parecer, incluindo vários “jabutis” (temas estranhos ao objetivo principal de uma proposta).
O texto só não foi aprovado ontem, pois não houve acordo entre os líderes partidários diante da manobra tentada por Lira, sem costurar sequer com a base governista. Mas, a MP voltará à pauta de votação da Câmara em agosto, na volta do recesso.
Ataques da Carteira Verde e Amarela e muito mais
As alterações propostas no parecer do deputado Christino Áureo começam por ampliar a possibilidade da suspensão de contratos e redução de salários. Segundo o parecer, a medida poderá ser feita toda vez que o país ou uma região atravessar uma situação de calamidade.
Além disso, o relatório incluiu a criação de dois programas: o Priore (Programa Primeira Oportunidade e Reinserção no Emprego) e o Requiq (Regime Especial de Trabalho Incentivado, Qualificação e Inclusão Produtiva). Confira ao final deste texto, as condições de cada programa.
As propostas, na prática, resgatam medidas da extinta MP 905, a chamada Carteira Verde e Amarela do governo Bolsonaro, que cria uma categoria de trabalhadores de “segunda linha”, com menos direitos. Vai, inclusive, além, aprofundando os ataques.
Sob o já conhecido – e falso – discurso de gerar empregos, a MP, na prática, reduz direitos históricos dos trabalhadores, como o FGTS, mas também precariza outros aspectos, como salários, contrato de trabalho, fiscalização, acesso à Justiça trabalhista, entre outros.
Além disso, as propostas são estímulos à precarização das condições de trabalho e ao desemprego. O Priore, por exemplo, abre brecha para a substituição de trabalhadores, registrados pelas regras gerais da CLT e com maiores salários, por outros funcionários com as novas regras, desde que a recontratação ocorra após 180 dias.
O Requip (Regime Especial de Trabalho Incentivado, Qualificação e Inclusão Produtiva), sob a desculpa de se tratar de um programa de qualificação, na prática, cria um novo tipo de contrato de trabalho sem direitos trabalhistas, remunerado apenas com uma bolsa de, no máximo, 1/2 do salário mínimo, metade paga pelo empregador e outra metade pela União, para uma jornada de 22 horas semanais.
Descaracterização do trabalho escravo e outros ataques
O relatório da MP 1.045 traz ainda outros graves ataques. Um deles define que benefícios como habitação, roupa e outros itens “in natura” como pagamento de salário.
Isso é gravíssimo, pois mesmo que limitado a 25% do salário, a medida abre brecha para descaracterizar um dos elementos que configura trabalho escravo nas fiscalizações do Ministério do Trabalho. Afinal, uma das práticas de empresas e fazendas, que têm essa prática odiosa, é alegar que pagam esses tipos de benefícios como se fossem salário. Mas, a realidade, é que as pessoas trabalham em condições precárias em troca de comida, para se vestir e dormir.
Outra medida incluída na MP é o trecho que regulamenta critérios de “dupla visita” e limita ainda mais a atuação da fiscalização trabalhista. Segundo o relatório, a empresa só será autuada na segunda vez que um auditor visitar a empresa. Se o fiscal descumprir a regra e multar na primeira vez, o auto de infração será anulado.
O acesso dos trabalhadores à Justiça Trabalhista também é dificultado. A MP cria várias exigências para caracterizar a hipossuficiência (carência financeira) do trabalhador, dificultando o acesso à Justiça gratuita.
Nova reforma trabalhista, não!
A MP 1.045 é a reedição da MP 936 editada no ano passado diante da pandemia, que permite que as empresas reduzam em 25%, 50% ou 70% os salários dos trabalhadores ou suspendam contratos de trabalho. Intitulada como Programa Emergencial de Manutenção de Emprego e Renda, a MP está longe de garantir o que se propõe que é a defesa dos empregos. Isso porque não há proibição de demissões. Entenda: Governo reedita MP para redução salarial e suspensão de contratos
Agora, com as alterações propostas pelo parecer do deputado do PP, partido do Centrão que dá apoio à Bolsonaro, a MP se torna ainda mais prejudicial, resgatando e agravando os ataques da MP 905.
É preciso impedir que na volta do recesso parlamentar, o Congresso aprove esta medida. O próximo dia 24 de julho, quarto dia nacional de protestos pelo Fora Bolsonaro, deve ser ainda mais forte e avançar para a construção de uma Greve Geral Sanitária no país. Só assim, vamos dar um basta ao genocídio, ao desemprego, à fome, aos ataques aos direitos e à corrupção que este governo vem impondo ao povo brasileiro.
Entenda os programas Priore e Requip que resgatam pontos da extinta MP 905
Priore
O Priore é voltado a jovens de 18 a 29 anos que procuram o primeiro emprego com carteira assinada e trabalhadores com mais de 55 anos que estejam sem vínculo formal há mais de um ano.
O contrato seria de até 24 meses, a critério do empregador. Poderiam ser contratados até 25% do total de empregados da empresa nesta nova modalidade, com salário mensal de até dois salários mínimos. O recolhimento do FGTS seria reduzido. Ao invés dos 8% atuais, microempresas recolheriam apenas 2%; empresas de pequeno porte, 4%; e as demais, 6%.
Os trabalhadores contratados por meio do Priore teriam direito a receber o BIP (Bônus de Inclusão Produtiva), com valor equivalente ao salário mínimo/hora, limitado a 11 horas semanais.
Requip
O Requip (Regime Especial de Trabalho Incentivado, Qualificação e Inclusão Produtiva) também é voltado para jovens com idade entre 18 e 29 anos, sem registro em carteira e Previdência há mais de dois anos ou trabalhadores de baixa renda cadastrados em programas de transferência de renda do governo.
Por esse programa, a jornada seria de até 22 horas semanais, com salário de metade do Salário Mínimo (R$ 550), bancado parte pela empresa e parte pelo governo, através do BIP e da Bolsa Incentivo à Qualificação (BIQ). As empresas terão de fazer um convênio para cursos de qualificação junto ao Sistema S (Senai, Sesc e Sesi) ou outros instituições públicas ou privadas, que poderá inclusive ser por meio de cursos à distância.
Da CSP-Conlutas