O presidente Lula (PT) participa de cerimônia de Natal com catadores no estádio Mané Garrincha, em Brasília, com a primeira-dama JAnja, em 22 de dezembro de 2023. Foto: Gabriela Biló /Folhapress
Diante de tudo o que estamos agora sabendo, e que até aqui apenas especulávamos, o 8 de janeiro era o prelúdio de um golpe de Estado que teria sido, segundo os documentos apreendidos pela Policia Federal, devidamente desenhado pelo governo Bolsonaro e por integrantes das forças militares.
A chave do golpe era a GLO, a Garantia da Lei e da Ordem.
Como se daria: Lula, amedrontado com a quebradeira em Brasília e com as estradas travadas, assinaria a GLO autorizando o exército a agir. Com a GLO, o golpe seria concretizado. Tudo devidamente estruturado, registrado, planejado.
Lula quase assinou a GLO e só não o fez porque Janja pulou à frente e disse não.
“Foi a Janja que me alertou: ‘Não aceita GLO porque GLO é tudo que eles querem, é tomar conta do governo’. Se eu dou autoridade pra eles, eu dou o governo pra eles”. A frase é de Lula e foi falada em entrevista exibida no Fantástico, da Globo.
Diante da força com que Janja se manifestou, Lula então teria perguntado a Flavio Dino se a multidão poderia ser contida apenas com as forças civis, e Dino assentiu.
Se vamos acreditar no depoimento de Lula, então foi Janja que apontou para a armadilha no caminho e nos livrou de mais uma ditadura.
O resto é história. Uma história que ainda está sendo escrita.
Janja é alvo de todo tipo de machismo vindo da direita e da esquerda também. Teve que escutar, impávida, de frente para uma audiência imensa, o ridículo e infantilizado discurso de Lula contra as pautas identitárias que são tão importantes para ela. Pois, de acordo com o que disse Lula, coloquem na conta da primeira-dama o papel central na orientação para que Lula não assinasse a GLO que era a chave do golpe.
A percepção tão fundamental sobre a GLO não veio dos conselheiros do presidente que representam um mesmo perfil identitário – homens, brancos e heterossexuais com mais de 60 anos. Veio da solitária mulher na sala, a única ali compreendida como integrante de grupo identitário, já que homens brancos e heterossexuais são incapazes de se perceber como grupo identitário.
Pelo visto, se Lula tivesse escutado esse grupo identitário que serve como seu núcleo de conselheiros não estaríamos aqui agora falando de como o país escapou de mais um golpe de estado. Seria prudente que Lula alargasse seu campo de aconselhamento a fim de se cercar de pessoas capazes de, não apenas entender o caráter universalista das pautas que os conservadores chamam de identitárias, como também enxergar armadilhas onde elas existem.