Dino barrou manobra de Lira para driblar acordo para por fim ao chamado “orçamento secreto”, que gerou uma onda de investigações sobre corrupção no governo Bolsonaro e mandou PF investigar negociata na Câmara
Prestes a deixar a presidência da Câmara, onde deixará um legado de autoritarismo, chantagem e retrocesso, Arthur Lira (PP-AL) entrou em desespero e convocou uma reunião de líderes na tarde desta quinta-feira (26), em meio à ressaca do Natal, para buscar uma reação a Flávio Dino, ministro do Supremo Tribunal Federal (STF).
Lira teria avisado aos líderes partidários que pretende pedir uma reunião com Lula para tentar pressionar o presidente a barrar o ministro do Supremo, que se tornou o principal obstáculo contra as chamadas emendas de relator.
Na última segunda-feira (23), Dino barrou a manobra de Lira, que tentou driblar o acordo com o Judiciário e o Executivo para colocar fim ao chamado “Orçamento Secreto”, esquema criado em conluio com o governo Jair Bolsonaro (PL) que pulverizou contratos suspeitos de corrupção nas bases eleitorais.
Para ocultar os nomes dos deputados, Lira enviou um ofício ao governo federal pedindo a liberação de R$ 4,2 bilhões em emendas apenas com as assinaturas dos líderes dos partidos – voltando a ocultar o nome dos parlamentares responsáveis pelas solicitações.
Em decisão judicial, Dino determinou a suspensão do pagamento e pediu à Polícia Federal a abertura de um inquérito para investigar a manobra de Lira.
Na decisão, o ministro citou uma série de investigações sobre esquemas de corrupção no direcionamento das emendas parlamentares envolvendo deputados (e/ou assessores), prefeituras e empresas suspeitas de pagamento de propina.
Um dos inquéritos, que foi suspenso por Gilmar Mendes e não é citado por Dino, envolve diretamente Arthur Lira no suposto esquema de corrupção com os chamados “kits robóticas”. O principal assessor do deputado alagoano chegou a ser alvo de busca e apreensão da PF, que encontrou rascunhos de contas de “Arthur” supostamente com dinheiro oriundo de propinas.
“Degradação institucional”
Na decisão, que atende a um pedido ajuizado pelo PSOL, Dino convoca o deputado Glauber Braga (PSOL-RJ), principal desafeto de Lira, para ouvir as denúncias e exige que a Câmara dos Deputados publique as atas das reuniões em que as emendas de comissão foram aprovadas dentro de 5 dias, encaminhando os documentos à Secretaria de Relações Institucionais da Presidência.
“Tamanha degradação institucional constitui um inaceitável quadro de inconstitucionalidades em série, demandando a perseverante atuação do Supremo Tribunal Federal”, escreveu Dino.
O ministro também determinou que a execução das emendas parlamentares relativas ao Orçamento de 2025 pelo governo Lula só será permitida após o registro completo das informações sobre os repasses no Portal da Transparência e na plataforma Transferegov.br, tanto do Legislativo quanto do Executivo.
“Os recentes ‘cortes de gastos’ deliberados pelos Poderes Executivo e Legislativo tornam ainda mais paradoxal que se verifique a persistente inobservância de deveres constitucionais e legais – aprovados pelo Congresso Nacional – quanto à transparência, rastreabilidade e eficiência na aplicação de bilhões de reais”, disse o ministro.
Dino, então, cita diversas denúncias de desvios e irregularidades na aplicação de verbas das emendas, ressaltando que “não é compatível com a ordem constitucional, notadamente com os princípios da Administração Pública e das Finanças Públicas”, a continuidade de um ciclo de denúncias “nas tribunas das Casas do Congresso Nacional e nos meios de comunicação, acerca de obras malfeitas”, “desvios de verbas identificados em auditorias dos Tribunais de Contas e das Controladorias”, e “malas de dinheiro sendo apreendidas em aviões, cofres, armários ou jogadas por janelas, em face de seguidas operações policiais e do Ministério Público”.
As malas de dinheiro se referem ao vereador Francisco Nascimento (União-BA). Primo de Elmar Nascimento (União-BA), que chegou a ser cotado por Lira para sucedê-lo na Presidência da Câmara, o vereador foi preso no último dia 10 e jogou uma mochila com R$ 200 mil pela janela com a chegada dos policiais.