Em Roraima, garimpeiros criticam ‘excessos’ do Ibama no combate ao garimpo e querem ajuda dos governantes
Após o início das operações para desmontar o garimpo ilegal na Terra Indígena Yanomami e com o processo de fuga de garimpeiros que invadiram a região, representantes do setor em Roraima se reuniram nesta quinta-feira (9) em Boa Vista para realizar uma audiência pública e protestar contra o processo de desintrusão promovido pelo governo Lula (PT) na área indígena Yanomami.
Com bandeiras escritas com o lema “Roraima pede socorro”, garimpeiros, familiares e lideranças se manifestaram contrários às ações do governo federal no momento em que ministros do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) estão em visita ao estado para verificar a crise social, sanitária e de segurança na região. Eles foram acompanhados dos comandantes das Forças Armadas.
O evento reuniu aproximadamente 200 pessoas entre garimpeiros, apoiadores e parentes. O argumento principal dos organizadores é que “Roraima está sendo sufocado” e que é um dos estados brasileiros que não sofreram com os impactos socioeconômicos deixados pela pandemia de Covid-19.
“Hoje o estado de Roraima está sendo perseguido por ONGs internacionais e é hora de juntarmos toda a sociedade. Empresários, comerciantes, madeireiros, agricultores, garimpeiros e garimpeiras, vamos juntos de mãos dadas mostrar a nossa força”, dizia uma gravação em loop na manifestação.
Autointitulado coordenador do movimento “Garimpo é Legal”, o funcionário público Jailson Mesquita afirmou à Folha durante a audiência que os garimpeiros em área indígena estão tendo problemas pelo processo de desintrusão do governo federal.
De acordo com a legislação brasileira, o garimpo é considerado ilegal em terras indígenas.
Ainda nesta quarta-feira (8), o Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) deu início às operações para desmontar garimpos ilegais na área Yanomami para retirar os mais de 20 mil garimpeiros que invadiram o território ao longo dos últimos anos. As ações têm apoio da Funai (Fundação Nacional dos Povos Indígenas) e da Força Nacional de Segurança Pública, vinculada ao Ministério da Justiça e Segurança Pública.
“Estão cometendo aí alguns excessos que a gente vai discutir. Um dos nossos maiores problemas em Roraima é a ditadura que o Ibama montou aqui, eles queimam tudo. Nós também temos garimpeiros lá que não podem pagar para voltar, e tem que trazer todo mundo. Não é o que o governo federal quer? No momento que fechou o espaço aéreo, a demanda [por aviões] ficou maior e aí o preço da passagem subiu porque o cara fica correndo risco”, disse Jailson.
Ele relatou que os preços atuais de frete de voos irregulares de aviões pequenos à região, como o modelo Cessna, chegam a R$ 25 mil. Mesquita estima que ainda há cerca de 10 mil garimpeiros na região.
O representante garimpeiro argumentou ainda que os governos federal e estadual precisam realizar uma abordagem de assistência social e enquadrar os trabalhadores do garimpo em programas de transferência de renda, como o Bolsa Família.
O ministro da Defesa, José Mucio Monteiro, disse na quarta-feira (8) que o tratamento que será dispensado a garimpeiros em fuga é “uma questão da Justiça” e que as Forças Armadas têm a preocupação de “não prejudicar inocentes”.
“Agora, a grande maioria esmagadora dessas pessoas é de Roraima. E eles foram para o garimpo por quê? Porque nos deixaram uma migração aqui de 300 mil pessoas sem nos acolher com nada”, relatou, referindo-se à Operação Acolhida, força-logística humanitária coordenada pelo Exército que recebe imigrantes venezuelanos no Brasil.
Durante a audiência, os participantes da mesa vociferaram ofensas contra a imprensa que, segundo disseram, “demoniza a imagem de Roraima e do garimpo”.
“Não vamos deixar a Globo pautar a nossa imagem. Eles dizem mentiras 24 horas por dia com o intuito de sujar a nossa imagem e nos difamar, mas a gente sabe que garimpeiro não é bandido! Garimpeiro é trabalhador!”, gritou Cleiton Alves, que também se identifica como líder da manifestação de garimpeiros. Ele foi aplaudido pelos participantes.
“Acabou Roraima”, sentenciou uma mulher que não quis se identificar. Segundo ela, que afirmou não ser garimpeira, o estado só não sofreu mais impactos econômicos após a pandemia, como o resto do Brasil, porque o dinheiro orbita ao redor do garimpo.
Ela conta que tem uma hospedagem e faz transporte de garimpeiros com seu marido. E lamenta que, se o dinheiro do garimpo não girar, vai quebrar todo mundo.
Bem visto pelo movimento, o governador de Roraima, Antonio Denarium (PP), sancionou leis consideradas inconstitucionais em defesa do garimpo. Uma delas previa o uso de mercúrio e outra proibia a destruição de maquinário.
Aeronaves usadas pelo garimpo ilegal na terra yanomami, na Amazônia FOTO DA AERONAVE
Durante a visita ministerial na quarta-feira em Boa Vista, ele afirmou que os garimpeiros têm a consciência da necessidade de sair da região.
“É muito importante que todos saiam. O governo federal, com o trabalho do governo do estado, está estimulando essa saída também para não haver conflitos”, declarou, complementando que a reabertura parcial do espaço aéreo sobre a terra foi um pedido do governo estadual.
O ministro da Justiça, Flávio Dino, afirmou no início desta semana que os garimpeiros têm saído da terra Yanomami em Roraima e avaliou que existam ao menos 15 mil garimpeiros ilegais no local, mas o número pode chegar a 40 mil.
“Nós estamos na expectativa de que, quando do início das ações policiais coercitivas, já tenhamos pelo menos 80% deste contingente de 15 mil pessoas que saíram do território Yanomami desde a semana passada e ao longo desta semana”, disse.
Foto da capa: Garimpeiros e familiares se reuniram nesta quinta-feira (9) em Boa Vista em audiência pública para protestar contra o processo de desintrusão promovido pelo governo Lula (PT) na área indígena Yanomami – João Paulo Pires/Folhapress
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