Em documento enviado às autoridades brasilerias, associação Yanomami denuncia o crime e pede investigação. O crime teria ocorrido após indígenas tentarem expulsar garimpeiros
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Dois indígenas da comunidade isolada Moxihatëtëma, na Terra Yanomami em Mucajaí, região Sul de Roraima, foram assassinados por garimpeiros durante um conflito. A denúncia foi divulgada pela , nessa terça-feira (2/11), contudo, o crime ocorreu há cerca de 2 meses e meio.
Segundo a associação, na segunda-feira 1º/11, uma liderança indígena, que, por segurança, preferiu manter o anonimato, contatou representantes da HAY para informar das mortes dos indígenas, que vivem em isolamento voluntário, em um ataque próximo ao garimpo conhecido como “Faixa Preta”, no município de Mucajaí.
No ofício à Frente de Proteção Etnoambiental Yanomami da Fundação Nacional do Índio (Funai), à Superintendência da Polícia Federal em Roraima (PF/RR), à Primeira Brigada de Infantaria da Selva do Exército (1ª BIS) e ao Ministério Público Federal em Roraima (MPF/RR) a associação pede investigação sobre o crime.
No documento, a HAY informa que os dois indígenas foram mortos ao tentar expulsar invasores de um garimpo ilegal chamado “Faixa Preta” e relata que, no conflito, os indígenas chegaram a acertar três garimpeiros com flechas. Dois indígenas acabaram mortos por armas de fogo.
Segundo o ofício, “a intenção dos Moxihatëtëma teria sido expulsar os invasores do seu território, mas, durante o acercamento, os grupos entraram em confronto. Os isolados acertaram três garimpeiros com flechas, e os garimpeiros mataram dois Moxihatëtëma com armas de fogo”.
O texto indica, ainda, que o garimpo “Faixa Preta” está localizado no rio Apíau, a cerca de quatro dias de barco, desde o posto de saúde Rio Apíau e já destruiu uma área de mais de 100 hectares de floresta. Controlado por grandes empresas nacionais e, sobretudo, internacionais, o garimpo em TI de povos originários isolados já destruiu 100 hectares das terras yanomamis.
Uma apuração do Instituto Socioambiental (ISA) indica que imagens de satélite mostram a devastação de mais de 100 hectares de floresta pela atividade ilegal. “A HAY vem, insistentemente, informando os órgãos competentes sobre a elevada pressão em que se encontram os Moxihatëtëma com o avanço do garimpo nas regiões da Serra da Estrutura, Couto Magalhães, Apiaú e Alto Catrimani, com elevado risco de confrontos violentos que podem resultar no extermínio do grupo. No entanto, não temos ciência de ações recentes de repressão ao garimpo na região”, descreve o documento.
O ofício também aponta a impunidade que mantém livres os assassinos de dois caçadores moxihatëtëma. O crime ocorreu em 2019, no primeiro ano do governo Jair Bolsonaro (ex-PSL, atual União Brasil). Denunciado por dois professores yanomami do Alto Catrimani, a morte dos dois caçadores indígenas da mesma comunidade isolada a tiros de espingarda ocorreu após eles defenderem seus roçados de uma tentativa de roubo por parte dos garimperios.
Na ocasião, a HAY informou aos órgãos competentes, mas não obteve respostas sobre uma eventual investigação. Com as duas novas mortes, a organização ressaltou que os Moxihatëtëma podem ter sofrido uma perda de 5% da população em conflitos com garimpeiros. “As últimas fotografias aéreas disponíveis da comunidade indicam a existência de 17 seções familiares, sugerindo uma população total de aproximadamente 80 pessoas”, informa o ISA.
O instituto apurou que a associação já soliciou, várias vezes, aos órgãos públicos criados para proteger e defender as Terras Indígenas (TI), não só a apuração das mortes e a punição dos criminosos, mas também a realização de ações de combate ao garimpo. No entanto, o governo Bolsonaro não moveu nenhuma equipe para retomar as atividades da BAPE Serra da Estrutura e as rotinhas de incursões para identificação e desmantelamento de núcleos de garimpo instalados na região.
“A Terra Indígena Yanomami segue invadida por mais de 20 mil garimpeiros. Segundo os últimos estudos da Hutukara, até setembro de 2021, a área acumulada de floresta destruída pelo garimpo ilegal no território superou a marca de três mil hectares, um aumento de 44% em relação a dezembro de 2020. As regiões de Waikás, Aracaçá, e Kayanau são as mais impactadas pela destruição, que tem avançado para novas regiões, como em Xitei, onde a atividade teve um aumento de 1000% entre dezembro e setembro de 2021″, informa o ISA.
Em , o ISA denuncia o genocídio de povos indígenas isolados na Amazônia brasileira.
Em vídeo, o Dário Kopenawa Yanomani mostra como explodiu o crime de grilagem e garimpo ilegal dentro da TI Yanomami.
Essas são feridas abertas pelo garimpo na nossa Terra Yanomami. Em 2020, o garimpo explodiu e está chegando cada vez mais perto das nossas famílias. Com ele leva a xawara #Covid19 e violência. Governo, é hora de acabar com isso! #ForaGarimpo!
Saiba mais: https://t.co/rLshcUxQAI pic.twitter.com/EJrIG9uOVh
— Dário Kopenawa Yanomami (@Dario_Kopenawa) March 25, 2021
No dia 14 de setembro, publiquei reportagem na @agenciapublica com documentos e imagens inéditas que confirmavam que os Moxihatëtëma da terra Yanomami estavam em risco por contato forçado do garimpo ilegal https://t.co/194kKpjw56
— Thiago Domenici (@thiago_domenici) November 2, 2021
Com informações do Ofício Hutukara Associação Yanomami (HAY), Correio Braziliense, ISA e Twitter
Isolados
A Terra Indígena Yanomami possui oito registros de grupos indígenas em isolamento voluntário, dos quais um foi confirmado, um está em estudo e os outros seis estão em fase de informação. O grupo confirmado, conhecido como Moxihatëtëma, vive na Serra da Estrutura, região muito próxima a focos de garimpo, localizados a poucos quilômetros de sua aldeia.
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Deslocamentos recentes desse grupo, aproximando-se de inimigos tradicionais, provavelmente estão relacionados com a intensificação da atividade garimpeira e a consequente invasão de seu território tradicional. O contato forçado com garimpeiros pode resultar no genocídio do grupo isolado, como resultado de conflitos armados e disseminação de doenças infecciosas até então desconhecidas.
Para os Yanomami, a terra-floresta, que na língua materna significa “urihi”, não é um mero espaço de exploração econômica e sim uma entidade viva, inserida numa complexa dinâmica cosmológica de intercâmbios entre humanos e não-humanos — hoje ameaçada pela predação dos não-índios.
O presidente da Hutukara, Davi Kopenawa Yanomami, afirmou em “A queda do céu: palavras de um xamã yanomami” (Companhia das Letras, 2015) que “a terra-floresta só pode morrer se for destruída pelos brancos. Então, os riachos sumirão, a terra ficará friável, as árvores secarão e as pedras das montanhas racharão com o calor. Os espíritos xapiripë, que moram nas serras e ficam brincando na floresta, acabarão fugindo. Seus pais, os xamãs, não poderão mais chamá-los para nos proteger. A terra-floresta se tornará seca e vazia. Os xamãs não poderão mais deter as fumaças-epidemias e os seres maléficos que nos adoecem. Assim, todos morrerão”. Saiba mais
Texto deste box do ISA