Sistema nacional de dados deve fazer frente à desregulamentação que permite às ‘big techs’ capturar informações. “Corporações sabem mais do Brasil do que os brasileiros”, diz o presidente do IBGE, Marcio Pochmann, em entrevista a Juca Kfouri na ‘TVT’
O IBGE elabora um projeto de lei para coordenar no país um sistema nacional de dados geocientíficos, estatísticos e pessoais. De acordo com o economista e presidente do instituto, Marcio Pochmann, uma proposta legislativa é discutida internamente com os servidores. Enquanto isso, em paralelo, o IBGE abre diálogo com o governo e o Congresso para pautar a medida. As informações foram confirmadas durante a participação de Pochmann no programa Juca Kfouri Entrevista, transmitido nesta quinta-feira (9) pela TVT.
A avaliação é que após 200 anos da soberania política do Brasil, que foi seguida 100 anos depois pela busca da soberania econômica, a tarefa contemporânea é garantir a soberania de dados. “Essa questão é absolutamente fundamental porque um país sem soberania de dados é um país que não decide mais por vontade própria. Ele sofre interferências, como vimos nas eleições nos Estados Unidos e no Brasil com a presença que tiveram as redes sociais, o que é grave. Porque vai esvaziando, retirando o conteúdo nacional e a capacidade dos brasileiros de decidirem por vontade própria”, destacou Pochmann.
O presidente diz que, sem uma legislação para tratar do tema, o país ficará a mercê das políticas de privacidade das chamadas big techs. Atualmente elas obrigam a liberação de informações pessoais, incluindo dados sensíveis, para fazer uso de suas plataformas. Essas informações, acrescenta ele, são utilizadas como uma espécie de “ouro bruto”.
Soberania de dados com o IBGE
“Mas que é dilapidado e se transforma em um modelo de negócio absolutamente rentável e que praticamente não cria empregos no Brasil, não contribui para a tributação e são dados que ficam fora do país”, critica. A ausência de um agente regulador, portanto, “permite que essas corporações estrangeiras saibam mais informações do Brasil do que os próprios brasileiros, do que o presidente da República e o IBGE”, garante.
“Temos uma espécie de censo demográfico, de informações, que é feito a cada dia (por essas companhias). É estranho que o Brasil tenha deixado que uma empresa estrangeira percorresse todas as nossa cidades, ruas, tirado fotografias das casas e fábricas. Ou seja, o mapeamento do Brasil hoje é feito por satélites estrangeiros. Essa questão precisa ser melhor avaliada. Não é possível que um país que tem soberania política, que busca soberania econômica, não tenha soberania de suas informações”, defende.
Ao longo deste mês, os servidores do IBGE irão discutir a proposta com o desafio de criar estratégias para que a medida não seja deturpada pela máquina de mentiras da extrema-direita. Pochmann observa, porém, que há sensibilidade sobre a questão da soberania de dados em todos os níveis de governo.
Enfrentando as fake news
“Entendemos que o IBGE pode ser o grande coordenador desse sistema de dados, certificando, enfrentando as fake news, as mentiras que se produzem, pesquisas que saem sem saber quem e como fez. É uma nova época. E esse tema não pode ficar secundarizado. Nossa expectativa é que o IBGE possa oferecer o projeto de lei para que o Congresso, a partir da definição do presidente Lula, possa refletir esse tema fundamental para o Brasil de hoje e dos próximos anos”, concluiu o presidente do instituto.
No Juca Kfouri Entrevista desta semana, Marcio Pochmann também detalhou o papel do IBGE e o que ele está fazendo sobre a tragédia no Rio Grande do Sul.