Bilhões de reais ‘milagrosamente’ gerados cada vez que machucam (o brasileiro)
O título do presente artigo recorda um filme, na verdade uma comédia na forma de metáfora, onde um casal atravessando sérias dificuldades financeiras tem a “sorte” de descobrir um bule mágico e misterioso, que milagrosamente gera dinheiro farto (dólares) cada vez que eles se machucam. Qualquer semelhança com nosso Banco Central, que gera R$ 800 bilhões anuais de juros da Dívida Pública para a turma do Bolsa Rentista, às custas do brasileiro comum endividado, nos chama a atenção. Lembrando que o valor transferido na forma de rendimentos oriundos dos encargos do endividamento interno supera em cinco vezes os orçamentos da Saúde e Educação federais juntos.
O debate liderado pela mídia conservadora é muito claro: há uma inversão das prioridades na alocação do Fundo Público, financiado por toda a sociedade. Ou seja, a prioridade é a estabilidade macroeconômica antes de tudo, principalmente antes dos direitos sociais e dos direitos dos trabalhadores.
Esta institucionalidade, que os economistas ligados ao mercado financeiro tentam naturalizar, ganha força e legitimidade mediante uma racionalidade imposta no comportamento das pessoas e dos indivíduos considerados como empresários de si mesmos, na forma de crenças e valores incutidos em pílulas diárias, negando a necessidade de resolução coletiva dos problemas concretos de uma sociedade desigual e injusta. É incrível como tudo gira em torno do dinheiro!
Nosso país sofre, claramente, nos dias atuais, um ataque especulativo contra sua moeda, através do modelo de abertura de sua conta de capitais. O saldo comercial continua alto, entretanto, os juros altos praticados pela autoridade monetária americana forçam uma “fuga para a qualidade”, tornando o real uma das moedas mais desvalorizadas neste início de ano.
Somos um país com soberania monetária relativa, pois outras moedas (dólar, iene, euro e libra esterlina) exercem a função de reserva de valor internacional – equivalente geral. As nações capitalistas mais poderosas acabam tendo suas moedas escolhidas ou impostas como dinheiro mundial. Nesse contexto, países como o Brasil não determinam o fluxo de capitais, ou seja, somos condicionados pelas relações dominantes na produção e circulação de mercadorias em escala planetária. Assim, uma crise cambial geraria uma aceleração inflacionária, pela alta proporção de bens importados no custo das famílias.
Mais grave ainda, nosso país, ao modificar recentemente sua legislação e permitir a autonomia operacional (e futuramente financeira) ao Banco Central, tornou nossa política monetária ainda mais regressiva e subordinada aos ditames internacionais, aumentando a contradição entre um chefe do Executivo legitimamente eleito pelo povo, pressionado para gerar oportunidades produtivas e crescimento econômico, e um conjunto de tecnocratas (do Comitê de Política Monetária – Copom) olhando apenas os interesses dos grandes grupos financeiros nacionais e internacionais e seus fabulosos lucros intermitentes e extraordinários.
Enquanto isso, o manejo da política macroeconômica fica, a cada dia, mais instável e subordinado à canalização dos recursos do orçamento público para políticas públicas concentradoras de renda e riqueza. Com isso, o padrão de vida das novas gerações perde qualidade em comparação com o observado por seus pais. Só a luta política muda isso!
(*) Por Ranulfo Vidigal é economista.