Sobre reeleição, presidente diz não querer discutir assunto, mas cogita possibilidade ‘para evitar que os trogloditas que governaram esse país voltem a governar’
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva criticou nesta terça-feira a forma como o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, tem conduzido as políticas da instituição. Em entrevista à Rádio CBN, ele disse que a aproximação do presidente do banco com a oposição levanta suspeitas, chegando a admitir que, provavelmente, o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, exerça influência maior no BC do que o próprio governo.
“Nós só temos uma coisa desajustada no Brasil neste instante. É o comportamento do Banco Central. Temos um presidente do BC que não demonstra nenhuma capacidade de autonomia e que tem um claro lado político. Na minha opinião, ele trabalha muito mais para prejudicar do que para ajudar o país”, afirmou o presidente.
Lula afirmou que é um dos chefes de Estado com mais experiência em toda a história do país. E citou sua escolha pelo economista Henrique Meirelles, que esteve à frente do BC de 2003 a 2011. “Eu duvido que esse Roberto Campos tenha mais autonomia do que tinha o Meirelles”, afirmou o presidente, ao criticar a aproximação de Campos com o governador de São Paulo.
Lula comparou a situação do atual presidente do Banco Central com a do ex-juiz Sergio Moro, que deixou a magistratura para ser ministro da Justiça de Jair Bolsonaro após ajudar a elegê-lo ao impedir Lula de concorrer às eleições. Moro foi julgado pelo STF como “incompetente” e “parcial” na Lava Jato.
Para o presidente da República, o sucessor de Campos Neto tem de ter compromisso com o desenvolvimento do Brasil e com o controle da inflação e ser uma pessoa “madura e calejada”.
“Sinceramente, acho que o Tarcísio de Freitas tem mais influência com o Roberto Campos do que eu”, disse Lula ao se referir ao suposto pedido do presidente do BC para ser ministro da Fazenda de um possível governo de Tarcísio. Lula disse que “é importante saber a quem o Campos Neto é submetido”.
“Não é que ele se encontrou com Tarcísio numa festa. A festa foi do Tarcísio para ele. Foi uma homenagem que o governo de São Paulo fez para ele. Certamente porque o governador está achando maravilhosa a taxa de juro em 10,5%”, completou.
Segundo ele, não há nenhuma explicação que justifique a taxa de juro atual, e isso é percebido até mesmo por autoridades estrangeiras, inclusive financeiras. “Tenho viajado o mundo e tenho conversado com muitos presidentes. Recebi presidentes do FMI; de bancos asiáticos; do Citibank; do Santander. Todos os bancos demonstram que não há país com mais otimismo do que o Brasil. Prova disso é que fomos o segundo país a receber mais investimento externo”.
“Portanto, temos uma situação que não necessita desta taxa de juros. O Brasil não pode continuar com essa taxa proibitiva de investimento no setor produtivo. Precisamos baixá-la para um nível compatível com a inflação, que está totalmente controlada. Só que agora ficam inventando o discurso de inflação do futuro. Vamos trabalhar em cima do que é real”.
Para o presidente, juros altos não condizem com o contexto de baixa inflação, promovidos por um Banco Central que deveria ser autônomo, mas sofre interferências políticas da oposição.
Lula também apontou o que chamou de contradições que retratam o cenário atual do país. Ele disse que os que hoje criticam gastos do governo são os mesmos que defenderam desonerações de setores com altos lucros. Na entrevista, Lula afirmou que legisladores se mobilizam para taxar pequenas importações, geralmente feitas por pobres, sem cogitar fazer o mesmo com os ricos. Sua fala foi uma referência à proposta de taxação, aprovada recentemente no Congresso, de compras de até US$ 50 feitas pela internet, e a não taxação de compras de até US$ 2 mil de quem viaja para o exterior.
“O que está acontecendo hoje é que as mesmas pessoas que falam que é preciso parar de gastar são as que têm R$ 546 bilhões de isenções e de exoneração de folha de pagamento. Ou seja, são os ricos que se apoderam de uma parte do orçamento do país e se queixam daquilo que você está gastando com o povo pobre”, observou.
O presidente se disse disposto a discutir “de forma séria” o orçamento com parlamentares, empresários, banqueiros e com a imprensa, mas garantiu que a solução será “em cima das pessoas mais humildes deste país”.
“Acabamos de aprovar uma desoneração para 17 setores da indústria brasileira, e qual foi a contrapartida deles para o trabalhador? Qual é a estabilidade no emprego que eles garantiram? Qual foi o aumento do salário que asseguraram? Nenhum. Tudo foi apenas para isentar da carga fiscal.
Não teve nenhum compromisso com o povo trabalhador. O compromisso que se teve foi apenas o de aumentar o lucro”, argumentou o presidente.
Perguntado sobre uma possível candidatura à reeleição, Lula disse que, por enquanto, não quer discutir o assunto, uma vez que cumpriu menos da metade do mandato e que há “muita gente boa” para se candidatar ao cargo.
Ele, no entanto, acenou com a possibilidade, caso seja a única alternativa “para evitar que os trogloditas que governaram esse país voltem governar”, mas que esta não é a primeira hipótese.
“Vamos ter que pensar muito porque tenho responsabilidade para com o Brasil. O fato é que não vou permitir que esse país volte a ser governado por um fascista negacionista”.
Monitor Mercantil com informações da Agência Brasil