Vídeos monetizam com conteúdos sobre aversão e controle das mulheres com bilhões de visualizações, segundo relatório do NetLab-UFRJ
Um relatório desenvolvido pelo Observatório da Indústria da Desinformação e Violência de Gênero nas Plataformas Digitais, em parceria com o NetLab, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e o Ministério das Mulheres, investigou discursos misóginos no YouTube. O estudo revelou que há monetização desses conteúdos, através de anúncios, membros de canais e outros recursos.
O que chama atenção no estudo é que foram identificados ataques direcionados a mulheres com atuação pública, como parlamentares, ministras de Estado e outras figuras que participaram da política institucional, especialmente mulheres do campo progressista. A análise apontou que pelo menos 25 vídeos contêm insultos ou ataques voltados a seis mulheres negras que atuam ou já atuaram como parlamentares: Alice Portugal (PCdoB-BA), Ana Paula Lobato (PDT-MA), Benedita da Silva (PT-RJ), Dandara (PT-MG), Detinha (PL-MA) e Helena Lima (MDB-RO).
Em outubro deste ano, durante as eleições municipais, a Fórum havia mostrado que Natália Bonavides e Maria do Rosário estavam entre as candidatas que mais receberam ataques no 2º turno. Com somente 15% das candidatas na reta final, parlamentares mulheres ainda foram o maior alvo, 68,2% das ofensas machistas durante os debates.
A pesquisa do NetLab ainda revela que conteúdos políticos misóginos escalonaram no período de seis anos, de 2018 a 2024, justamente em uma fase conturbada da política brasileira, com a eleição de Jair Bolsonaro até à reeleição do presidente Lula, em 2022, e a permanência de grupos extremistas de direita nos últimos dois anos.
O tema “Conteúdo político” tem engajamento com medianas de 13 mil e 12 mil visualizações, respectivamente. Já o tema principal do corpus, “Desprezo às mulheres e estímulo à insurgência masculina”, embora tenha alguns vídeos com visualizações altas, atinge uma média de 53,3 mil visualizações e uma mediana de 5,4 mil.
Interseccional
A análise de mais de 33 mil títulos de vídeos revelou uma ênfase em tópicos antifeministas como o “Desprezo às mulheres e a promoção da insurgência masculina” frente a uma suposta “dominação feminina”. Os criadores de conteúdo propagam ideias masculinistas utilizando termos pejorativos e desenvolvendo um jargão próprio para criar comunidades e evitar a detecção por ferramentas contra discurso de ódio.
A pesquisa utilizou ferramentas avançadas de inteligência artificial para analisar 76.289 vídeos e identificar as comunidades e padrões da “machosfera” brasileira. Também examina as formas de monetização e sua relação com o conteúdo misógino e discriminatório.
O estudo também analisou qualitativamente os vídeos de 137 canais com conteúdos claramente misóginos. Juntos, esses canais publicaram mais de 105 mil vídeos nos últimos seis anos, possuindo, em média, 152 mil inscritos e acumulando 3,9 bilhões de visualizações, destacando a influência desse ecossistema nocivo na internet.
A pesquisa também revelou alguns números relacionados à monetização:
- Exceto pela presença do Programa de Membros do YouTube (18%), todas as outras formas de monetização investigadas são mais comuns em canais misóginos.
- 52% dos canais misóginos possuem ao menos um vídeo com anúncios.
- Oito canais com conteúdo misógino que utilizaram o Super Chat realizaram 257 transmissões e arrecadaram R$68 mil.
- Links para plataformas de financiamento coletivo ou links de afiliados estão presentes em 28% dos canais misóginos.
- Alguns influenciadores chegam a cobrar até R$1.000 por consultorias individuais de desenvolvimento pessoal masculino, muitas vezes baseadas em técnicas de manipulação, humilhação, desumanização e violência psicológica. Acesse o estudo completo do NetLab.