Será que ainda temos o que falar sobre o 8 de março? Esta pergunta chega atrapalhando nossos pensamentos quando nos pedem para escrever algo que lembre este dia, o Dia Internacional da Mulher.
Geralmente, é um dia em que os homens nos dão flores e nos chama de “rainha do lar”. Será que ainda sonhamos em ser “rainha do lar” ou queremos mais, ou não queremos mais?
Aos poucos vão surgindo assuntos que, borbulhando, inundam nossa cabeça e temos que dizer um basta para poder concatenar tantas ideias e passa-las para o papel. São tantos os temas, tantas as polêmicas, tantas as necessidades que alcançam as mulheres que é difícil escolher sem medo de deixar de fora algo importante.
Vou utilizar o critério sugerido pela amiga Tereza Vitale de trazer um artigo repaginado sobre o tema da mulher desaforada, que escrevi quando pela primeira vez no Brasil, uma mulher foi eleita Presidenta da República.
Na ocasião mostrei as dificuldades e desafios que ela encontraria no cargo. Hoje, um ano depois, ao reler o artigo tento analisar de forma brevíssima os anseios que àquela época me invadiam.
Vou começar com o acesso da mulher ao alto escalão do Governo Federal. Dos 38 ministérios (incluindo as secretarias com status de Ministério) 12 foram ocupadas por mulheres, dentre as quais nossa companheira feminista Eleonora Menicucci de Oliveira, para a Secretaria de Políticas para as Mulheres, com ampla aprovação e grandes expectativas do movimento de mulheres. Assim, temos cerca de 30% de mulheres neste escalão. Coisa inédita em toda a história do Brasil. Ponto para nossa representante.
O segundo item foi referente a corruptos, fichas sujas, aproveitadores. Aqui surgem milhões de dúvidas com relação ao futuro do Brasil. Procurei pesquisar um pouco e o que encontrei foi meio desanimador. Uma das poucas coisas positivas neste campo foi a aprovação da lei da ficha limpa, que parece ter desencadeado uma série de denúncias em todos os setores da sociedade. Nunca se viu tão abertamente a cara da corrupção, ao vivo e à cores. Foram seis ministros acusados, dezenas de servidores públicos e outro tanto de militares, juízes e desembargadores. Não escapou nenhum dos três poderes. A dúvida é se estas denúncias serão apuradas ou não, se o roubo voltará para os cofres público e se os culpados serão punidos.
Este item ainda fica em aberto, pois apesar das declarações da Presidenta contra a corrupção e o afastamento de seus auxiliares envolvidos, ainda é cedo para avaliar se ela escolheu mal seus assessores, se está fazendo realmente uma faxina ou correndo do perigo de se ver envolvida com os fatos.
O tema seguinte – orçamento público – também não será elogiado. As três secretarias – Direitos Humanos, Igualdade Racial e de Políticas para as Mulheres que diretamente lidam com a igualdade, isonomia e direitos essenciais à cidadania das mulheres e também de homens, tiveram seus orçamentos reduzidos, sendo que a da Igualdade Racial foi a mais sacrificada, seguida pela da Mulher.
As políticas públicas continuam na corda bamba. Muita propaganda e pouca eficiência. Fiquemos com o setor da saúde. Não precisa ser especialista, basta assistir ao noticiário diário que se vê casos de descasos. São filas enormes, pessoas morrendo nos corredores de hospital, falta de remédio e falta de profissionais da saúde.
Quando as mulheres mais velhas já haviam esquecido as histórias da linda e querida cegonha trazendo as criancinhas penduradas naquelas fraldas branquinhas (eu pelo menos acreditei em cegonhas durante toda minha infância e começo de adolescência), eis que ressurge esta ave na forma de “Rede Cegonha”, implantada no Sistema Único de Saúde. Criticada no movimento feminista, a começar pelo próprio nome, que ao fazer da ave a protagonista do parto reduz a atenção à saúde da mulher apenas para fase reprodutora, atrelada a criança, esquecendo a integralidade de sua saúde e de que, além dos direitos reprodutivos é necessário respeitar os direitos sexuais.
Por outro lado, as mulheres continuam morrendo em decorrência, de modo geral, não do parto propriamente dito e sim do mau atendimento, da falta de equipamentos necessários para exames essenciais, escassez de profissionais de saúde e não porque não têm dinheiro para o transporte que as leve aos setores hospitalares. É ótimo que o Estado forneça auxílio transporte para a gestante, mas isto deveria ser um programa que atingisse todas as pessoas necessitadas, independente da doença ou do sexo, uma vez que a saúde de acordo com nossa Constituição é um direito de todos e dever do Estado e as políticas de saúde devem proporcionar o acesso universal e igualitário às ações e serviços.
Ainda impactadas com a chegada da cegonha, o movimento de mulheres passou a enfrentar outro revés e destas feita bem maior: a publicação da MP 557/2011, no apagar das luzes do ano 2011. Esta Medida Provisória cria e normatiza ações já existentes no Ministério da Saúde. Apresenta a figura do nascituro como portador de direitos. A influência de grupos fundamentalistas religiosos se faz presente em todo o texto do documento, que não deixa dúvidas que foi elaborado sem o menor respeito à mulher como cidadã e dona do seu próprio corpo. É unanimidade no movimento de mulheres e entre as feministas, que esta medida deve ser revogada urgentemente. Senhora Presidenta, atenda esta demanda.
Como vitória alcançada não poderia deixar de falar que em fevereiro deste ano o Supremo Tribunal Federal referendou, por unanimidade, a validade da lei 11.340/2006 (Lei de Violência Doméstica), em resposta a uma ação declaratória de constitucionalidade enviada pela Presidência da República em 2007. Agora juízes preconceituosos não poderão arquivar processo por desistência da mulher vítima de violência doméstica. A ação é pública e a violência pode ser denunciada por qualquer pessoa. Esta vitória não está diretamente ligada à Presidenta, mas vou considera-la como apoiadora da mesma.
Se fosse dar uma nota à Presidenta pelo seu desempenho durante o primeiro ano, encontraria dificuldades, pois muitos são os projetos, mas, entre estes e a realidade existe uma distância muito grande. Não devo jogar sobre ela a culpa pelo aumento da violência ou a falta equipamentos públicos que melhoraria a vida das mulheres como lavanderias, cozinhas comunitárias, creches e escolas. Este problema é secular no Brasil e para minorá-lo vai demandar muita vontade política, determinação, dinheiro e cobrança da sociedade.
Quero confessar um sentimento do fundo de minha alma: sinto aquela pontinha de orgulho quando vejo nossa Presidenta – uma mulher, muitas vezes a única dentre dezenas de homens, falar com tanta propriedade e segurança em questões financeiras, investimentos ou relações internacionais. E pensar que ela é mulher, como eu, como você, como nós. Estão vendo? Nós mulheres também podemos.
Poderia ficar falando em coisas que sonhei e que não foram realizadas, entretanto, como meu otimismo está aflorado com o cheiro do mar, a claridade do sol, a brisa serena do vento norte e, principalmente com a realização do meu sonho de construir uma casinha aqui na praia, vale lembrar que este ano também descobri coisas interessantes e que me foram apresentadas pela Universidade Livre: as “Blogueiras Feministas”, mulheres, a maioria jovens que ao se mostrarem suaves, apresentam força e garra que só se encontra na ousadia e atrevimento próprio de pessoas sonhadoras que acreditam em mudanças e em revoluções. Nelas vejo um pouco as expectativas e ansiedades da minha juventude, como vejo também na série de vídeo de “A Vovozinha”, que com humor e inteligência mostra como as mulheres revolucionaram o comportamento da sociedade na década de 50 e 60, amaciando o caminho para as jovens “Blogueiras” e também para todas as outras que não se consideram feministas e acham desnecessária a continuidade da luta, erroneamente acreditando que já chegaram ao topo e de lá não vão sair.
(*) Por Iáris Ramalho Cortês, advogada e artesã, sócia fundadora do Cfemea.
Natal/RN, Praia de Barra do Rio, 8 de março de 2012.
Iáris Ramalho Cortês, 81 anos, Advogada, feminista, co-fundadora do Centro Feminista de Estudos e Assessoria – CFEMEA, faz parte do seu Conselho Deliberativo. Participou dos trabalhos constituintes no Conselho Nacional dos Direitos da Mulher, integra o Consórcio Lei Maria da Penha e já participou do Forum de Mulheres do Distrito Federal, Forum Nacional de Direitos Humanos, Grupo Arco-íris de apoio a portadores do HIV/AIDS do Distrito Federal e dos conselhos: OAB/DF, Direitos da Mulher do GDF e Conselho de Adoção do GDF. Endereços eletrônicos: iariscortes@hotmail.com, iariscortes@gmail.com.
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