Quando Carlos Salinas de Gortari deixou a Presidência do México em dezembro de 1994, o Wall Street Journal fez um balanço da economia mexicana em seu governo – o mais descaradamente neoliberal daquela época – e resumiu suas conclusões dizendo que antes dele o México tinha apenas dois ou três bilionários e com ele passara a ter nada menos que 13.
Essa multiplicação, que nos seis anos de seu governo acrescentara no mínimo dez novos bilionários aos escassos dois ou três encontrados por Salinas ao tomar posse em 1988, não podia ser atribuída ao crescimento do PIB mexicano entre o México de apenas dois ou três e o México de 13 bilionários.
Os novos bilionários só podiam ter conseguido seu upgrade alavancados pela aceleração do processo de concentração de renda típico dos arrastões neoliberais. Ou seja, com os pobres em geral ficando ainda mais pobres e com alguns milionários ficando menos milionários ou até, em casos extremos, perdendo tudo e ficando pobres.
No tempo de Salinas foi um assombro um país como o México passar de dois ou três para 13 bilionários. Hoje parece até natural e inevitável que um bilionário como Elon Musk receba de uma só vez um prêmio de mais de 50 bilhões de dólares extorquidos aos acionistas de uma de suas empresas, a Tesla de carros elétricos.
Esse é também um caso extremo, mas já deve ter chegado a hora de os milionários se unirem, a começar pelos que sejam acionistas minoritários da Tesla, para impor limites à ganância de bilionários como Elon Musk e resistir a essa concentração de renda dentro da concentração de renda. Ou vão acabar ficando menos milionários…
LULA FAZ AVANÇAR A TAXAÇÃO DOS BILIONÁRIOS
Lula está aproveitando muito bem a presidência do G-20, o grupo dos vinte países de maior PIB do mundo, que o Brasil exerce no momento, e faz avançar promissoramente sua proposta de um esquema internacional de taxação da fortuna dos três mil bilionários que se sabe existirem atualmente no mundo. A proposta de Lula acaba de ser considerada factível e capaz de promover a arrecadação de 250 bilhões de dólares por ano e vai ser discutida agora em julho na próxima reunião dos ministros das Finanças do G-20, no Rio.
Segundo um estudo do economista Gabriel Zucman, encomendado pelo Brasil e divulgado nos últimos dias, os avanços já verificados na busca de meios de taxar corporações multinacionais revelam que já é possível cobrar um imposto de alcance global de determinados indivíduos, mesmo se nem todos os países concordem em associar-se ao esquema.
– Existe grande apoio popular a essa ideia – disse Zucman. – Há dez anos ninguém acreditava que 130 países apoiariam um imposto mínimo sobre multinacionais. Isso era uma utopia.
O estudo de Gluckman diz que atualmente os bilionários pagam um imposto médio de 0,3% sobre sua fortuna, menos que o que é pago por trabalhadores. Enquanto isso, a riqueza dos mais ricos cresceu em média 7.1% entre 1987 e 2024, fazendo a participação da riqueza dos bilionários na riqueza global crescer de 3% para 14% do total.
COMO ELES GASTAM SEU DINHEIRO
Cresceu tanto o dinheiro dos 3 mil bilionários no mundo que eles agora fazem mais força para gastá-lo do que para ganhá-lo. Dias atrás, segundo uma notícia no jornal The Guardian, de Londres, arquitetos britânicos reagiram com assombro ao tomar conhecimento de que na cidade de Oxford uma agência privada de recrutamento de professores particulares estava oferecendo um salário sete vezes mais alto que o salário médio pago a um arquiteto especializado em projetar casas e prédios a “um jovem e excelente arquiteto profissional capaz de prover apoio acadêmico e tutoria a uma ambiciosa estudante na iminência de iniciar o curso de arquitetura”.
O candidato contratado para esse trabalho não precisaria sequer deixar suas ocupações e empregos atuais. O novo emprego não exigiria horário fixo nem dedicação full time (no Brasil seria um bico), mas apenas que o tutor ajudasse o aluno na preparação dos trabalhos escolares e dos exames. Além disso, deveria promover contatos e conexões que abrissem caminho para a futura vida profissional do aluno.
O salário para esse bico seria de 288 mil libras anuais, o equivalente a 363 mil dólares ou, em dinheiro brasileiro, 2 milhões, 8 mil reais e quebrados, equivalentes, por sua vez, a uns 150 mil por mês. Ah! E como o trabalho só seria necessário ao longo do ano letivo, o tutor teria cerca de dois meses de férias (pagas) por ano.
Segundo o Royal Institute of British Architects (Real Instituto dos Arquitetos Britânicos), no Reino Unido o salário médio anual de um arquiteto com pelo menos cinco anos de experiência é de 39 mil libras, ou 45 mil dólares, equivalentes no Brasil a cerca de 250 mil reais, ou cerca de 20 mil reais por mês.
No bico dos bilionários, o arquiteto-tutor ganha 150 mil por mês e esse não foi um caso isolado. Adam Caller, o fundador da Tutors International, a empresa com 25 anos de experiência que publicou o anúncio, disse ao Guardian:
– Estou absolutamente sobrecarregado com a procura de tutores. Nunca antes foi assim.
Igualmente sobrecarregados estavam há pouco tempo os estaleiros de Mônaco e adjacências, na Côte d’Azur, onde era de seis meses a fila de espera para encomendar um iate de meio bilhão de dólares.
O DEBATE
Biden reconheceu que o debate foi um desastre, mas nas 24 horas seguintes insistiu em manter a candidatura.
O raciocínio estava em muitas cabeças, embora ainda não em muitas vozes: se não consegue nem impor a Netanyahu o cessar-fogo em Gaza, como é que Biden vai derrotar Trump nos debates a depois nas eleições.
E se Biden agora dobrar Netanyahu, as coisas mudam?
(*) Por José Augusto Ribeiro – jornalista e escritor, é colunista do Jornal Brasil Popular com a coluna semanal “De olho no mundo”. Publicou a trilogia A Era Vargas (2001); De Tiradentes a Tancredo, uma história das Constituições do Brasil (1987); Nossos Direitos na Nova Constituição (1988); e Curitiba, a Revolução Ecológica (1993); A História da Petrobrás (2023). Em 1979, realizou, com Neila Tavares, o curta-metragem Agosto 24, sobre a morte do presidente Vargas.