Atividade exige cumprimento de normas de segurança financeira; pesquisa da Febraban mostra que maioria dos brasileiros quer regulação forte do setor
A Secretaria de Prêmios e Apostas (SPA) do Ministério da Fazenda divulgou lista de 66 empresas que estão liberadas a partir desta quarta-feira (1º de janeiro) a explorar o mercado nacional de apostas eletrônicas de quota fixa, as chamadas de bets.
A autorização para as empresas operarem bets no Brasil depende do pagamento de outorga de R$ 30 milhões. Cada portaria de liberação permite o uso de até três marcas por empresa. No total, mais de R$ 2 bilhões foram pagos pelas empresas para obterem as outorgas. O número de empresas autorizadas corresponde a 58% dos pedidos iniciais (113).
De acordo com a lista de empresas da SPA, o mercado regulado de bets terá inicialmente 139 marcas. Todas deverão operar exclusivamente no domínio “.bet.br”. As empresas detentoras das marcas terão de cumprir normas de segurança financeira e práticas de jogo responsável, e respeito à legislação contra a lavagem de dinheiro.
As portarias que concedem autorização foram publicadas na edição de 31 de dezembro do Diário Oficial da União; 14 empresas receberam de liberações definitivas e 52 empresas tiveram autorizações provisórias pois ainda estão pendentes na apresentação de informações ou documentos como a certificação do sistema de apostas.
Segundo a SPA, empresas em atividade que não tiverem autorização oficial não poderão fazer transações financeiras e serão bloqueadas na internet. “As instituições financeiras e de pagamento passam a ser vedadas de realizar transações, que tenham por finalidade a realização de apostas de quota fixa com pessoas jurídicas que não tenham recebido a autorização. Aquelas empresas não autorizadas, mas que continuam com domínios ativos que ofertam serviço de aposta de quota fixa são consideradas ilegais e serão bloqueadas”, detalha nota da secretaria.
Divulgação da SPA também afirma que a regulamentação “possibilitará corrigir problemas estruturais do setor e mitigar riscos associados à prática de apostas, como o jogo problemático e o superendividamento.” Conforme a nota, para evitar esses problemas haverá “controle rigoroso dos fluxos financeiros.”
Além disso, estão proibidos a concessão de crédito pelas bets aos usuários para apostas e de bônus de entrada, e deverá haver identificação dos apostadores por CPF, com reconhecimento facial.
Em entrevista concedida à Agência Brasil após as empresas entrarem com pedidos para terem autorização para explorarem as bets, o secretário de Prêmios e Apostas do Ministério da Fazenda, Regis Anderson Dudena, o enquadramento das bets só foi possível porque, depois de cinco anos de vácuo, durante os governos de Michel Temer e Jair Bolsonaro, o Brasil passou a ter uma lei que regulamenta o setor (Lei nº 14.790), sancionada em dezembro de 2023.
Edição especial do Radar da Federação Brasileira de Bancos, desenvolvido pelo Instituto de Pesquisas Sociais, Políticas e Econômicas (Ipespe) com apoio da Confederação Nacional das Instituições Financeiras (CNF) e da própria Febraban, mostra que a maior parte da população brasileira (59%) quer uma regulação e uma atuação firme do governo frente à corrida de sites de apostas que se espalharam rapidamente pelo Brasil. É também ampla a maioria daqueles não confiam nas empresas de apostas on line (85%) e que são contrários a esse tipo de jogo (59%). Ao mesmo tempo, é majoritário o volume de pessoas (60%) que defende limites para as apostas e são contrários ao uso do Bolsa Família nessa modalidade.
Realizado nos dias 15 a 23 de outubro com 2 mil entrevistados em todas as regiões do país, este estudo inédito investigou percepções, hábitos e atitudes da população brasileira sobre apostas esportivas online. Esse amplo e completo levantamento faz ainda um corte regional
“Temos nesse estudo um material aprofundado para que Governo e sociedade reflitam e debatam o tema, de modo a se planejar e implementar estratégias de prevenção e limitação, dentro de uma política de regulamentação que combata o vício”, diz Marcelo Garcia, especialista em Gestão de Políticas Sociais e Consultor da CNF, que completa. “Esta pesquisa abre uma enorme lanterna sobre um problema que pode ser diminuído. É um ponto de partida fundamental para a discussão e o enfrentamento do problema, antes que haja um impacto ainda maior no endividamento e na desagregação das famílias.”
O estudo revela que o contingente de apostadores é muito grande: 40% dos entrevistados declaram que, atualmente, jogam ou têm alguém na casa que joga em apostas esportivas online ou bets. Há ainda 21% que afirmam terem deixado de jogar.
E as consequências do jogo no dia a dia do cidadão ficam mais claras, a partir das respostas dos apostadores. Do total da população que admite apostar, 45% admite que teve sua qualidade de vida ou da sua família afetada. O valor separado para as apostas teve impacto em outros compromissos financeiros para 41% dos entrevistados, na compra de comida para 37% e para o pagamento de contas para 36%. Além disso, 24% dos apostadores dizem fazê-lo todos os dias e 52% jogam entre uma e seis vezes por semana.
Mais da metade dos entrevistados (57%) fazem uma avaliação negativa dos sites de apostas no Brasil, considerando-os “ruins ou péssimos”. Enquanto menos de um quinto (17%) consideram “ótimos e bons”. Nos extremos da avaliação (escala zero a 10), 42% deram nota zero para os sites e 4% deram nota 10. O apostador, em grande maioria, joga com receio e desconfiança.
Para 83% dos ouvidos, as bets são inseguras ou muito inseguras “com riscos que podem fugir do controle e gerar prejuízos” (45%) “com consequências graves na vida das pessoas e suas famílias” (38%); 59% são contra os jogos on-line. Entre os entrevistados 66% não joga e 53% dizem que não tem ninguém em sua casa que joga.
O futebol domina com 60% as apostas. Depois desse item, os outros meios de apostas são diluídos; 40% dizem que familiares ou pessoas próximas fizeram dívidas por conta das apostas e destes 45% tiveram sua qualidade de vida ou da família afetada em função dessas dívidas. Entre os que jogam, 24% dizem que o faz todos os dias, 18% dizem que fazem uma vez por semana, 21% jogam de duas a três vezes por semana e 12% entre quatro e seis vezes por semana.
O gasto mensal entre 52% dos que jogam varia de R$ 30 a R$ 500 e 14% dizem que gastam até R$ 30 por mês. Para os que apostam, 56% admitem que o valor aplicado faz falta no orçamento mensal e 53% temem perder dinheiro e se endividar.
O ganho com as apostas é bastante limitado. A pesquisa aponta que 52% admitem que perdem mais do que ganham (44%) ou perdem todas as vezes (8%). Apenas 30% dizem que ganha mais do que perdem (24%) ou ganham sempre (6%).
O Pix é a forma de pagamento das apostas. 79% jogam via Pix, 24% usam cartão de crédito, 18% recorrem ao cartão de débito, e 17% fazem transferência bancária (questão de múltiplas respostas). Modelar e regular o uso do Pix nas apostas é um desafio que não pode interferir nas liberdades individuais do cidadão. E a grande parte realmente acredita que as apostas possibilitam um ganho financeiro rápido (40%) ou são motivados pela chance de ganhar muito investindo pouco (11%), ideias que contrariam a cultura do esforço.
Para 69% dos ouvidos, os jogos on-line causam dependência ou vício em apostas, 61% causam endividamento e perdas financeiras e 42% causam problemas de saúde mental, como estresse, ansiedade e depressão. A população quer informação, limites e, em certa medida, cuidados gerais com a saúde mental de quem aposta. A esse respeito 66% dos entrevistados se posicionam a favor da proibição da propaganda de bets no Brasil, assim como acontece com a propaganda de cigarro.
O brasileiro não quer a legalização de jogos como cassinos, bingos e jogos do bicho (apenas 33% são a favor). A maioria (50%) avalia que endividamento com os jogos on-line são um problema público e que afeta o país e 47% avaliam que a dependência nas apostas on-line são um problema de saúde pública.
Entre as ações do governo para citadas combater o vício dos jogos, 35% avaliam que deveria coibir fraudes e lavagem de dinheiro, 28% avaliam que deveria limitar ou disciplinar a publicidade das empresas de apostas, 26% deveriam proibir o uso do cartão de crédito pelos apostadores e 26% dizem que deveria proteger a saúde mental e física do apostador.