Anistia é um ato pelo qual o governo resolve perdoar generosamente as injustiças e crimes que ele mesmo cometeu [Barão de Itararé]
Naquela primeira metade do ano de 1979 o movimento pela anistia aos perseguidos políticos fervilhava Brasil afora.
Na Bahia o CBA foi comandado pelas mulheres.
Invoquei de botar meu grãozinho de areia nessa empreitada.
No geral, porque queria dar meu modesto apoio pela volta de tant@s brasileir@s que partiram num rabo de foguete [como o irmão do Henfil, Betinho].
E muito especialmente porque desejava profundamente que o meu conterrâneo [cassado já no Ato Institucional nº 1, honroso 12º lugar] Clodomir Morais pudesse voltar a sua aldeia sem risco de ser preso.
Numa ida a Salvador fiquei sabendo, através do deputado estadual Domingos Leonelli [MDB], de reunião no Clube dos Engenheiros na rua Carlos Gomes promovida por mulheres encabeçando essa causa nobre.
Lá chegando, me deparo num salão com umas dezenas de mulheres reunidas em círculo.
Tremi nas bases.
E agora meu irmão?
A timidez, dei meia-volta pra cair fora, quando uma delas se levantou e me abordou, “quer algo?”.
Sim, colaborar com a campanha pela anistia na minha cidadezinha incrustada lá no Vale do Rio Corrente.
Ela, se a memória não falha, Marília Guimarães, me passou umas 50 folhas de papel contendo o cabeçalho do movimento, cada uma com espaço pra 30 assinaturas.
Aqui caí em campo.
Conversando com Norma Possídio, então esposa do juiz de direito Carlos Libório e professora do colégio Gonçalves Ledo, pedi apoio e ela prontamente se dispôs a coletar assinaturas na escola, passei pra ela um jornal especial intitulado exatamente Anistia, subsídios.
Corri pras cidades vizinhas de Bom Jesus da Lapa e Correntina, consegui adesões.
Pra facilitar e acelerar a coleta de firmas descolamos um fusquinha destrambelhado que um reacionário de extrema-direita emprestou. Analfabeto político, não sabia o que significava anistia, disse pra ele que era um movimento pra tornar as pessoas mais carolas, tementes a deus. “Ah sim, pode usar o carro e ainda faço questão de abastecer”.
O calhambeque ganhou apelido de Anistia, dado pelo motorista Bastião.
Resultou que num curto espaço de tempo todas as folhas foram preenchidas e enviadas para as guerreiras pela anistia na velha São Salvador.
Assim Santa Maria se inseriu nesse vitorioso, ainda que não da forma que desejássemos, movimento que nos permitiu receber na noite de 31 de dezembro de 1979 o nosso Clodomir Morais na principal praça, do Jacaré.
Multidão pra ver o filho que 20 e tantos anos depois voltava ao pueblito que o viu nascer.
Por obra e graça de Morais, dois meses depois nascia a Campesina, de onde neste exato momento redijo estas modestas linhas.
Biblioteca Campensina
Santa Maria da Vitória – Bahia
7 dezembro 2023
(*) Por Joaquim Lisboa Neto, colunista do Jornal Brasil Popular, coordenador na Biblioteca Campesina, em Santa Maria da Vitória, Bahia; ativista político de esquerda, militante em prol da soberania nacional.
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