Dias depois de o presidente da Argentina, Alberto Fernández, ter pleiteado a inclusão do país no Brics (bloco formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), o Itamaraty afirmou que não vê espaço para discussão no grupo sobre sua eventual ampliação.
“O Brics é um grupo informal de coordenação e cooperação entre cinco países emergentes significativos, que representam 53% da população, 24% do território e 24% do PIB mundiais. Não há um ‘acordo constitutivo’ do agrupamento, dada sua natureza informal, portanto não há processo estabelecido oficialmente para a entrada de novos membros”, afirmou a pasta em resposta a questionamentos enviados pela Folha. “Não há no grupo, no momento, discussão sobre sua eventual ampliação.”
Em recente viagem a Moscou e Pequim, Fernández pediu ao presidente da Rússia, Vladimir Putin, e ao líder chinês, Xi Jinping, apoio para o ingresso da Argentina no Brics.
A solicitação gerou surpresa em interlocutores no governo Jair Bolsonaro (PL), que disseram, em condição de anonimato, que nos últimos anos diplomatas do país vizinho não trataram do pleito com seus contrapartes brasileiros.
A diplomacia brasileira sob o atual presidente reduziu a ênfase dada ao Brics e mantém pouca proximidade com a Argentina.
O termo Bric foi lançado em 2001 pelo banco Goldman Sachs, para apontar economias emergentes que, segundo previsões, teriam destaque no século 21: Brasil, Rússia, Índia e China. O diálogo formal entre os quatro fundadores começou em 2006, e os encontros anuais dos chefes de Estado foram iniciados em 2009. Dois anos depois, a África do Sul foi convidada a se incorporar à aliança, por seu papel de liderança no continente africano.
As decisões no grupo se dão por consenso, e o ingresso de um novo membro dependeria da aceitação dos cinco atuais integrantes. A aliança permite coordenação dos países em diferentes temas e garante ainda um fórum de consultas permanente.
Foi também no âmbito do Brics que os integrantes fundaram o NDB (sigla em inglês para Novo Banco do Desenvolvimento). Trata-se de uma instituição financeira com capital autorizado de US$ 100 bilhões e capital subscrito de US$ 50 bilhões, com os membros fundadores possuindo 20% das cotas cada um, de acordo com o Itamaraty.
Reservadamente, interlocutores no governo Bolsonaro apontaram obstáculos, do ponto de vista brasileiro, para a entrada da Argentina na aliança. O primeiro deles é que o eventual ingresso representaria uma diluição do poder do Brasil, que, como único representante da América Latina, atua como líder regional pela interlocução facilitada que a participação no Brics permite com essas potências.
Ainda nesse aspecto, considera-se que o Brics foi fundado como um bloco limitado e que abrir as portas para um novo latino-americano poderia desencadear discussões sobre o ingresso de mais países de outros continentes, gerando atritos com os outros membros atuais.
O grupo também já enfrenta atualmente dificuldades de consenso em determinados temas políticos, o que é apontado como mais um obstáculo para sua eventual extensão.
Levantamento da Folha de S. Paulo indica que o Itamaraty disse que o “Brics valoriza o diálogo com outros países em desenvolvimento, realizado em sessões de ‘outreach’ [diálogo externo]”.
“Nesses encontros, o Brics tem promovido interações com países da África, da Ásia e da América Latina, bem como com organizações internacionais, desde 2013, a fim de buscar soluções comuns aos problemas enfrentados pelas nações em desenvolvimento”, diz a nota. “O Brasil poderia apoiar a retomada do ‘Brics outreach’, suspenso em razão da pandemia da Covid-19, desde que as condições sanitárias o venham a permitir.”
Apesar dessa alegação, o governo Bolsonaro não quis convidar países da região para a cúpula do bloco realizada em Brasília em 2019 nesses moldes, o que gerou frustração em outros integrantes do Brics na ocasião.
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