Estados têm até 15 de julho para aprovarem projeto de lei sobre regionalização do saneamento
Com o discurso de universalização do saneamento básico, o Congresso Nacional aprovou e o presidente Jair Bolsonaro sancionou o projeto de lei 14.026/2020, chamado de Marco Regulatório do Saneamento Básico. Porém, a verdade é que a iniciativa pode aumentar as tarifas e colocar em risco o fornecimento de água, o tratamento e coleta de esgoto e resíduo sólido, principalmente nas cidades do interior.
A lei propõe a privatização de tais serviços e, pela lógica de mercado, as empresas privadas não terão interesse em atuar onde não há lucro. De acordo com a legislação, municípios serão agregados em blocos ou regiões e as empresas públicas serão apenas mais uma disputando com a iniciativa privada a licitação de cada um deles. Ela determina que os estados aprovem essa distribuição até o dia 15 de julho.
Em Minas Gerais, o governador Romeu Zema, defensor das privatizações, abriu uma consulta pública para debater o Projeto de Lei que trata de regionalização dos serviços de saneamento básico, mas não ouviu as administrações municipais, entidades, sociedade civil e nem mesmo a Assembleia de Minas.
Nesta proposta do governo Zema, a Secretaria de Estado de Meio Ambiente (Semad) dividiu os 853 municípios em 22 blocos regionais para abastecimento de água e tratamento de esgoto. A Copasa, estatal que hoje atua em 639 cidades mineiras, será só mais uma empresa na disputa das licitações.
Um dos problemas deste modelo é o fim do chamado subsídio cruzado, em que o lucro em área populosa custeia o prejuízo em municípios menores, fazendo com que todos os consumidores de Minas Gerais paguem a mesma tarifa. Com o fim desse sistema, cidades pequenas, onde não há lucro, sofrerão com o aumento de tarifas.
Outro problema é a falsa sensação de escolha dada aos municípios. Segundo o projeto, as prefeituras podem, por exemplo, optarem por contratar os serviços de abastecimento de água e tratamento de esgoto de forma individual. Porém, as cidades que não aderirem ficam proibidos de acessarem recursos federais para serem utilizados na área.
Independentemente da adesão, os municípios também terão que cumprir as metas de universalização até 2033 e a questão que fica é: como os municípios pequenos e pobres conseguirão fornecer abastecimento de água para 99% da população e tratamento de esgoto para 90% sem recursos federais e estaduais?
De acordo com o Observatório Nacional dos Direito à Água e ao Saneamento (Ondas), na prática essa lei operacionaliza e agiliza a privatização por duas vias: 1) limitando a autonomia municipal; 2) quebrando a concorrência representada pelas empresas estaduais.
Além disso, a proposta está na contramão das experiências mundiais. Conforme aponta um estudo do Instituto Transnacional (TNI), centro de pesquisas com sede na Holanda, de 2000 a 2019, 312 cidades em 36 países reestatizaram seus serviços de tratamento de água e esgoto. Entre elas, Paris (França), Berlim (Alemanha), Buenos Aires (Argentina) e La Paz (Bolívia).
Em seu projeto, Zema deixa claro que está aproveitando do novo Marco do Saneamento para promover a desvalorização da Copasa e agilizar sua privatização. Caso aprovada pela ALMG e implementado, funcionários da Copasa, Copanor e da SAAE poderão ficar desempregados, o povo poderá sofrer com aumentos tarifários, impactando o bolso de todas as categorias de usuários, inclusive podendo impedir o acesso da população em situação de vulnerabilidade aos serviços, portanto na contramão da universalização.
(*) Marquinho Lemos é deputado estadual pelo PT em Minas Gerais e gestor em Políticas Públicas