A quarta-feira, 26 de março de 2025, ficará marcada para sempre como o dia em que as instituições democráticas brasileiras se revestiram de coragem e empoderamento e viraram a página da impunidade no Brasil. Pela primeira vez na história, o Poder Judiciário inicia e encaminha para a finalização um julgamento contra uma tentativa de golpe de Estado orquestrada por políticos, empresários e, sobretudo, por parte de militares das Forças Armadas. Estes últimos, historicamente envolvidos nesse tipo de crime.
Em um dia de temperatura literalmente quente na maior parte do Brasil por causa da crise climática, mas, metaforicamente quente, por uma decisão a ser tomada, a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) tornou réus generais das Forças Armadas e um ex-presidente da República, por tentativa de golpe de Estado e outros crimes.
A decisão ocorreu em sessão plenária, tendo como base a denúncia formulada pelo procurador-geral da República (PGR), Paulo Gonet, que, em sua denúncia, acusou 34 pessoas, divididas pelo Ministério Público em cinco núcleos. O PGR acusa o ex-presidente Jair Bolsonaro de liderar a organização criminosa e de fazer parte do chamado “Núcleo 1 ou Núcleo Crucial” do golpe.
Em seu voto, que era aguardado com expectativa no Brasil e no mundo, o relator, ministro Alexandre de Moraes, defendeu o recebimento da denúncia contra os oito investigados e, agora réus. Dentre outras argumentações, Moraes justifica o acatamento da denúncia porque há descrição satisfatória da organização criminosa, com divisão de tarefas e hierarquia; que o ex-presidente Bolsonaro liderou uma estrutura que usou mentiras sobre o sistema eleitoral para instigar o golpe; que o grupo agiu de forma coordenada até janeiro de 2023, buscando abalar o Estado Democrático de Direito; que “não houve um domingo no parque” no caso do 8 de janeiro, ou seja, que ninguém foi passear na Praça dos Três Poderes com Bíblia na mão, como divulgam setores da mídia e parlamentares bolsonaristas.
Moraes explicou que acatou a denúncia do PGR porque mesmo após a derrota nas urnas, o ex-presidente Bolsonaro mandou que os militares publicassem notas técnicas para manter seus apoiadores nos quartéis; que o então presidente “manuseava e discutiu a minuta do golpe”; e que “até a máfia poupa familiares. A organização criminosa em questão não teve esse pudor.” Assim, por 5 a 0, Bolsonaro e demais militares, chegam ao banco dos réus. Os ministros Flávio Dino, Luiz Fux, Cármen Lúcia, Cristiano Zanin, seguindo o voto do relator, formaram maioria para tornar os acusados em réus pelos crimes apontados pelo PGR, a saber: abolição violenta do Estado democrático de direito, golpe de Estado, organização criminosa armada, dano qualificado ao patrimônio da União e deterioração de patrimônio tombado.
A partir desta votação unânime da Primeira Turma do STF, são réus o ex-presidente da República, Jair Bolsonaro – que comandou a Presidência da República entre 2019 e 2022; o ex-ministro da Casa Civil, general Walter Braga Netto; o ex-comandante da Marinha, Almir Garnier; o ex-ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira; o ex-ministro da Justiça, Anderson Torres; o ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência, general Augusto Heleno; o ex-ajudante de ordens da Presidência, Mauro Cid; e o ex-diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), delegado Alexandre Ramagem, atualmente, deputado federal pelo PL.
É a primeira vez na história que o Supremo põe generais golpistas no banco dos réus e essa decisão consolida a força da Constituição, nossa Lei Maior, elaborada por uma Assembleia Constituinte, democraticamente eleita para instituir no País o Estado Democrático de Direito, destruído pela ditadura militar (1964-1985). De acordo com o art. 1º da Constituição, “A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito”, tendo em seus princípios fundamentais a soberania, a cidadania, a dignidade da pessoa humana, e o pluralismo político, entre outros.
Não é à toa, que a nossa Carta Magna foi classificada de Constituição Cidadã por um dos ícones da política brasileira, Ulysses Guimarães, e erguida no auge do rompimento do Brasil com a sanguinária ditadura civil, militar e empresarial, que, por 21 anos, perseguiu, prendeu, torturou e assassinou milhares de pessoas que se manifestassem contra sua política entreguista para transformar o Brasil e suas riquezas em negócio próprio, em colônia de empresas e países estrangeiros e seu povo em gente humilhada.
Além da Constituição, a acusação usou a Lei nº 14.197, de 2021, que no capítulo II, trata dos crimes contra as instituições democráticas; no caso, o crime de Abolição Violenta do Estado Democrático de Direito, entre outros. Neste contexto, faz-se oportuno registrar que essa lei foi sancionada pelo ex-presidente, agora réu, pelos crimes que cometeu tentando abolir o Estado Democrático de Direito, romper com o processo eleitoral e até mesmo assassinar seu opositor, democraticamente eleito.
Com o Brasil vivendo sob um regime democrático, durante a sessão histórica da Primeira Turma do STF, exercendo plenamente o direito à ampla defesa de seus clientes, os advogados do ex-presidente e dos demais acusados, apresentaram cinco questões preliminares, usando dados falsos e argumentos falaciosos. Sem sustentação, as apelações deles caíram por terra; foram todas rejeitadas.
No dia seguinte, mesmo depois de Bolsonaro virar réu junto com seus aliados de tentativa de golpe, bolsonaristas fazedores de fack News, produziram e disseminaram uma enxurrada de mentiras pelas redes sociais. Uma das mentiras anunciava que a oficial de justiça Kelly Smith teria chegado ao Brasil para cumprir mandados expedidos pelo juiz federal norte-americano Silves McClean, determinando, portanto, as anulações das condenações do ex-presidente Jair Bolsonaro no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e o arquivamento da denúncia contra ele no STF.
Nestas fake news, os fazedores e disseminadores de mentiras buscaram convencer brasileiras e brasileiros de suas bolhas que os Estados Unidos da América (EUA) podem atentar contra a soberania do Brasil. O pior e mais grave é saber que o réu Jair Bolsonaro deixou de ir ao STF para assistir o segundo dia de julgamento por causa de outra fake News feita pelos seus próprios apoiadores: a de que ele poderia sair do STF com uma tornozeleira eletrônica. Essa foi mais uma mentira para difamar o devido processo legal, ritual jurídico limpo da Justiça brasileira. Aliás, é bem possível eu esta mentira tenha sido inventada, exatamente, com a finalidade de criar uma justificar plausível para a ausência dele no Plenário da Corte Suprema no dia da decisão histórica.
Esse é, sem dúvidas, um dia histórico para o Brasil e o mundo. No país em que militares das Forças Armadas associados com grandes empresários nacionais e estrangeiros e a países colonialistas, como os EUA, não se tem notícia de qualquer possibilidade de julgamento de militares por tentativa de golpe de Estado.
Desde a Proclamação da República, em 1889, nenhum presidente ou ao menos um militar foi indiciado ou condenado pelos crimes de tentativa de golpe de Estado, censura e crimes praticados durante os regimes autoritários. Algumas tentativas de julgamento e punição terminaram em “anistia” e perdão”. O fato mais recente foi o da Comissão Nacional da Verdade (CNV), que tratou dos crimes da ditadura militar de 1964 a 1985, reconheceu a responsabilidade de diversos militares em crimes hediondos de violação dos direitos humanos, mas, que, contudo, não teve poder para julgar e punir os criminosos.
Com a decisão tomada pela da Primeira Turma do STF, será aberta uma ação penal, devendo a PGR e as defesas dos réus apresentarem provas e depoimentos. Desta forma, o Brasil vive um momento histórico, com um STF empoderado, protagonizando um simbólico e pedagógico capítulo de ação pelo fortalecimento da nossa democracia.
A expectativa, agora, é a de que o julgamento se encerre até o fim deste ano, consequentemente, com justiça sendo feita na forma legal de prisão do ex-presidente autoritário e fascista e dos militares que compartilham com ele o insistente projeto de destruir o Estado democrático de direito brasileiro.
O Jornal Brasil Popular aguarda, de olho nos movimentos fascistas que estão dentro e fora do Congresso Nacional, a sentença final que irá fazer justiça ao País, à soberania nacional. Por fim, acreditamos que há uma luz no fim do túnel brilhando sobre a democracia brasileira!