A tentativa de assassinato do Primeiro-Ministro da Eslováquia, Robert Fico, foi o mais grave episódio de violência política na onda que varre a Europa às vésperas da eleição de junho para o Parlamento Europeu.
Nesse caso, o noticiário imediato deixava a impressão de que o criminoso era um homem de centro-esquerda, inconformado com a submissão do Primeiro-Ministro à Rússia de Putin e suas ligações de amizade com Orbán, o Primeiro-Ministro húngaro também amigão do Bolsonaro. Em todos os outros casos registrados, os agressores eram de extrema-direita.
Na Alemanha, onde chegou a parecer quase rotina políticos e candidatos de esquerda serem vítimas de agressões físicas, o deputado do Parlamento Europeu Matthias Ecke, do Partido Socialista, foi brutalmente atacado, numa rua de Dresden, por quatro adolescentes, quando instalava posters de campanha. Ecke, espancado, sofreu fraturas na maçã do rosto e na cavidade ocular. Também em Dresden, quando uma equipe de TV tentava instalar outdoors de campanha, a candidata do Partido Verde Yvonne Mosler foi empurrada por um homem que rasgou os cartazes e, em seguida, levou uma cusparada da jovem que acompanhava o homem.
Outro caso de grande repercussão foi o da ex-prefeita de Berlim, Franziska Giffey, também do Partido Socialista, atacada pelas costas em visita a uma biblioteca, por um homem que a atingiu na cabeça com uma bolsa muito pesada.
Segundo testemunhas desses ataques na Alemanha, um denominador comum em todos eles foi que os atacantes gritavam “Heil Hitler!” ou outras palavras de ordem nazistas.
Mas não é só na Europa e nem sempre a violência política destes dias se expressa em agressões físicas como essas. Na Argentina, na primeira semana deste mês, foi pior – e o governo de extrema-direita de Javier Milei é acusado de ter radicalizado a homofobia já existente no país.
Um homem de uns 60 anos, Fernando Barrientos, atacou quatro mulheres gays no quarto da hospedaria em que moravam, em Buenos Aires, atirando trapos de pano em chamas contra elas e impedindo que fugissem, agarrando-se corporalmente a elas. Três morreram – Pamela Fabiana Cobas, de 52 anos, quase imediatamente; sua parceira Roxana Figueroa, também de 52 anos, teve queimaduras em mais de 90% do corpo e morreu dois dias depois; e Andrea Amarante, com queimaduras em mais de 75% do corpo, resistiu mais tempo, mas morreu em menos de uma semana. A quarta vítima do ataque, Sofia Castro Riglos, de 49 anos, continuava no hospital na sexta-feira, assim como sete outros moradores da hospedaria, também com queimaduras.
Depois do ataque, Fernando fugiu do quarto em chamas para a cobertura do edifício, onde tentou se matar, mas foi preso pela polícia. Segundo testemunhas ouvidas pelos jornais, Fernando costumava insultar as quatro mulheres e já tinha ameaçado matar Pamela e Roxana.
Mais de duzentos integrantes da associação de moradores do bairro organizaram uma manifestação de protesto pelo ataque às quatro mulheres e acusaram o governo de Milei de promover o discurso do ódio e disseminar uma cultura de intolerância.
Segundo Maria Rachid, diretora do instituto contra a discriminação do escritório do ombudsman de direitos LGBTQ+ da Argentina, “o ataque foi um dos mais cruéis crimes de ódio dos últimos anos e aconteceu num contexto em que o discurso de ódio está em expansão no país”. Um caso expressivo citado pela mídia tem sido o da ministra do Exterior do governo Milei, Diana Mondino, que em novembro do ano passado, em entrevista na TV, discutindo o casamento de pessoas do mesmo sexo, declarou:
– Se você prefere não tomar banho e viver cheia de piolhos, essa é uma escolha sua. Mas depois não reclame se alguém não gostar que você tenha piolhos.
Ainda na América Latina: o governo do Peru aprovou e pôs em vigor um decreto que inclui pessoas transgênero como integrantes dos grupos diagnosticados como portadores de doenças mentais. O decreto não levou em conta que, já em 2018, a Organização Mundial da Saúde deixou de considerar a transexualidade e o travestismo como doenças mentais. O que mais surpreende é que o governo do Peru é chefiado por uma mulher, Dina Boluarte.
(*) Por José Augusto Ribeiro – jornalista e escritor, é colunista do Jornal Brasil Popular com a coluna semanal “De olho no mundo”. Publicou a trilogia A Era Vargas (2001); De Tiradentes a Tancredo, uma história das Constituições do Brasil (1987); Nossos Direitos na Nova Constituição (1988); e Curitiba, a Revolução Ecológica (1993); A História da Petrobrás (2023). Em 1979, realizou, com Neila Tavares, o curta-metragem Agosto 24, sobre a morte do presidente Vargas.