1. Os militares voltaram dispostos a ficar.
Desde o fim da ditadura [1985] eles se organizam política e ideologicamente e se preparam silenciosamente para retomar o comando do país – sob os olhares desatentos, ingênuos e negligentes dos governos civis e de toda sociedade brasileira.
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Argentina, Uruguai e mesmo o Chile, depois que derrubaram suas ditaduras, definiram com clareza a subordinação das Forças Armadas ao poder civil, o afastamento das Armas do palco político e o papel profissional e exclusivo delas na defesa nacional.
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Diferentemente dos países vizinhos, contudo, devido à chantagem e pressão capitaneadas pelo general Leônidas Pires Gonçalves, ministro do Exército do Sarney, o texto da Constituição de 1988 concebeu, de modo dúbio, o emprego das FFAA na segurança pública [as atuais GLO’s]. Hoje, grupos de extrema-direita e militares conspiradores deturpam a interpretação do Artigo 142 da CF para defender a tese inconstitucional da intervenção militar com Bolsonaro no poder.
2. O golpe militar de 1964, que terminou em 21 anos de ditadura, rompeu a rotina da nascente República, de incursões militares breves na política seguidas da eleição de governos civis.
Agora, com o retorno ao poder pelo que chamam “via democrática”, eles almejam novamente concentrar e controlar o poder por um longo período de tempo. Desta vez, porém, com o argumento da “legitimidade” das urnas. Com isso, aumentaram as ambições deles pelo poder.
3. Bolsonaro foi o projeto secreto da cúpula militar para alcançar o poder; ele foi o veículo político para concretizar o plano acalentado há anos pelos militares ressentidos do porão e do esgoto do velho regime.
Eles conseguiram eleger Bolsonaro numa eleição fraudada com o impedimento do Lula e tutelada pelo general Villas Bôas por twitter. Numa eleição manipulada pela interferência do consórcio Globo-Lava Jato e bombardeada pela indústria de fake news financiada ilegalmente por empresários corruptos com a mais absoluta leniência do TSE.
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Para fechar o cerco e garantir a concretização do objetivo estratégico, durante o período eleitoral Villas Bôas ainda “designou” como assessor especial da presidência do STF para tutelar Dias Toffoli o atual ministro da Defesa, general Fernando Azevedo e Silva. Vale recordar que Fernando Azevedo e Silva atuava no programa e na campanha do Bolsonaro na eleição.
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4. O confronto permanente com o Congresso e com o STF; o caos, a violência contra opositores e a exasperação do clima político e social são ingredientes da receita estratégia dos militares e do governo Bolsonaro.
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No ambiente de instabilidade e confusão, eles evocam as Forças Armadas para restaurar a ordem, como fica explícito na nota ameaçadora [12/6] assinada pelo Bolsonaro na companhia do vice Mourão e do ministro da Defesa no embate mais recente com o STF.
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Julgando-se acima da Constituição civil e do poder civil, o capitão que em 19/4 disse que A Constituição sou eu! agora declara, em parceria com 2 dos seus generais hierarquicamente mais relevantes do poder formal no governo, que “As FFAA do Brasil não cumprem ordens absurdas, como p. ex. a tomada de Poder”.
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A menção deles à “tomada de poder” como exemplo de “ordem absurda” que é descumprida pelas FFAA é um truque cretino. Com este truque diversionista, mandam mensagem cifrada para intimidar o STF com a ameaça de desobediência e, inclusive, com reação armada caso a chapa Bolsonaro/Mourão seja cassada pelo TSE [o que, aliás, deveria ter acontecido em 2018].
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Os militares deixam isso claro ao afirmar que as FFAA “Também não aceitam tentativas de tomada de Poder por outro Poder da República, ao arrepio das Leis, ou por conta de julgamentos políticos”.
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Eles empulham com a tese de que tanto a cassação da chapa pelo TSE, como o impeachment do Bolsonaro pelo Congresso ou a condenação dele pelo STF com fundamento nos incontáveis crimes comuns e de responsabilidade cometidos, fosse “julgamento político” para a “tomada de Poder por outro Poder da República, ao arrepio das Leis …”.
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Eles dizem, com todas as letras, que se consideram acima da Lei e da Constituição civil, e que não hesitarão em comandar ação das Forças Armadas para impor suas vontades mesmo à força.
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5. Em entrevista à Revista Veja, o general da ativa e ministro da Secretaria de Governo Luiz Eduardo Ramos engrossou a orquestra de ameaças. Citando que como instrutor da AMAN por vários anos conhece os ex-cadetes que “têm tropas nas mãos” e que “atualmente estão comandando unidades no Exército”, ele ameaçou: “o outro lado tem de entender também o seguinte: não estica a corda”.
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O general, no fundo, quis criticar a ação do TSE. Na visão dele, “não é plausível achar que um julgamento casuístico [sic] pode tirar um presidente que foi eleito com 57 milhões de votos”.
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Questionado a respeito da participação em atos inconstitucionais ao lado do Bolsonaro e sendo militar da ativa, o general Ramos não fez como o chefe do Estado Maior das FFAA dos EUA Mark Milley, que pediu desculpas públicas pela intromissão indevida na política interna ao acompanhar o presidente Trump num ato de repressão contra o povo estadunidense.
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Ramos, sentindo-se à vontade para conspirar contra a Constituição sem o peso da farda, disse, apenas, que deve ir para a reserva. E fez profissão de fé na longevidade do governo e da “carreira” com cargos de poder: “Estou tomando essa decisão porque acredito que o governo deu certo e vai dar certo. O meu coração e o sentimento querem que eu esteja aqui com o presidente”.
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O general Ramos aposta e confia, enfim, no longo prazo do projeto de poder dos militares. E ele evidencia, também, que eles não chegaram até aqui só de passagem. Eles têm pretensões duradouras; voltaram dispostos a ficar.
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Ao responder sobre o fisiologismo e a corrupção do governo que se escancaram com o domínio de fatias bilionárias do orçamento da União pelo Centrão, o general Ramos diz, então, que “quem cuida dos recursos públicos é gente nossa”, ou seja, a gente do “partido militar”, incrustrada em todo aparelho do Estado brasileiro ocupando mais de 3,5 mil cargos de direção no país!
6. A questão, hoje, não é se perguntar se esse é um governo militar. Porque este é, de fato – e também será, em seguida, de direito –, um governo militar. Tampouco restam dúvidas quanto à sinergia entre Bolsonaro, o comando da ativa e os setores influentes da reserva das FFAA.
Bolsonaro até poderá ser descartado em determinadas circunstâncias, se esta for a medida mais producente para a continuidade do projeto militar – o que não é uma realidade no cenário presente. A compra do Centrão, executada pela mão de generais palacianos que praticam fisiologismo e corrupção para salvar o projeto, é prova disso.
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A questão que se coloca, portanto, é: qual o projeto dos militares hoje, uma vez que eles [i] não têm um ideal de nação, [ii] abdicaram da defesa da soberania nacional, [iii] endossam políticas ultraliberais e liquidacionistas do Paulo Guedes, [iv] rechaçam um projeto nacional-desenvolvimentista, [v] aniquilam os direitos dos trabalhadores e, como deixa evidente a opção criminosa e genocida diretamente planejada, concebida, dirigida e executada por eles, militares, na pandemia, eles [vi] não têm nenhum compromisso em defender e proteger a vida do seu próprio povo.
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Ao contrário, são indiferentes ao extermínio em curso – o extermínio de pobres, negros, desempregados, descartáveis, idosos, indígenas, quilombolas ….
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Uma hipótese é que estes militares – entreguistas, anti-nação, anti-povo, anti-democracia, anti-soberania etc – enxergam que este é o lugar do Brasil na geopolítica mundial.
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O Brasil, na visão deles, que não superaram a doença da colonialidade dependente, além de escória e pária internacional, se realiza como país-cônsul de uma potência estrangeira. No caso, como país-cônsul dos EUA.
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As Forças Armadas brasileiras se enxergam como guarda pretoriana, no próprio território brasileiro, do exército invasor que ocupa, domina, explora, saqueia e pilha nosso território e extermina nosso povo.